O setor marítimo em Portugal atravessa uma contradição. Apesar da relevância estratégica do transporte marítimo, continua a ser difícil captar jovens para carreiras na engenharia de máquinas marítimas. João Parente, professor da Escola Náutica Infante Dom Henrique, defende que a falta de conhecimento sobre estas profissões é um dos principais entraves à sua valorização.

O docente recorda que cerca de 90% das mercadorias, em volume, circulam por via marítima, ainda que o valor económico seja inferior ao transporte aéreo devido ao tipo de carga. No entanto, em Portugal, esta realidade raramente é tema de debate público, ficando o mar mais associado ao lazer, ao turismo e à gastronomia costeira.

Segundo João Parente, esta ausência de consciência coletiva sobre o papel do mar tem consequências diretas na atratividade das profissões marítimas. Mesmo sendo carreiras que oferecem salários acima da média portuguesa, não conseguem competir com o desinteresse das novas gerações. Para o professor, este desfasamento prende-se também com a imagem limitada que a sociedade tem do setor.

No caso da engenharia de máquinas marítimas, as funções vão muito além da propulsão do navio. Um engenheiro é responsável por assegurar a manutenção de sistemas essenciais, como a produção de energia elétrica, o funcionamento de geradores, a produção de água doce a bordo ou a monitorização de equipamentos críticos em manobras portuárias. Falhas nestes sistemas podem comprometer a segurança de toda a operação marítima.

Outro fator destacado pelo professor João Parente é a especificidade prática da profissão. Ao contrário de muitas funções em terra, que se limitam a tarefas administrativas, a engenharia no mar exige contacto direto com a operação. “É uma profissão em que se põe a mão na massa”, sintetiza, sublinhando a componente de decisão imediata e a aplicação direta dos fundamentos da engenharia.

No processo formativo, a Escola Náutica dispõe de equipamentos que procuram aproximar os estudantes da realidade operacional. Entre eles, destaca-se o simulador de máquinas marítimas da Vartsella, adquirido através do programa EEA Grants, num investimento que ascendeu a quase 2 milhões de euros. O sistema recria a casa de máquinas de um navio, permitindo tanto treino individual como trabalho em equipa em ambiente de simulação “full mission”, onde é possível interagir com quadros elétricos, sistemas de propulsão e equipamentos auxiliares.

Para João Parente, esta ferramenta é fundamental para preparar futuros engenheiros, mas não resolve a questão de fundo: Portugal precisa de reforçar a ligação das novas gerações ao mar, sob pena de perder oportunidades num setor onde existe procura global.