
A Lei da Inteligência Artificial da União Europeia, em vigor há um ano, marca um ponto de viragem na forma como as organizações desenvolvem e utilizam esta tecnologia no espaço europeu. Pela primeira vez, estão definidas regras obrigatórias que abrangem desde a avaliação de risco até à qualidade dos dados usados no treino de algoritmos. Para os responsáveis de tecnologia, em particular os CIO, a nova legislação traduz-se em obrigações concretas e num reforço da supervisão regulatória.
As sanções previstas podem chegar a 7% do volume de negócios anual global em casos graves, o que torna a conformidade não apenas uma questão técnica, mas também estratégica para a gestão das empresas.
Cinco áreas críticas para a conformidade
Um dos pilares da nova legislação é a obrigação de autoavaliação das aplicações de IA, com base numa classificação de risco definida por Bruxelas. As categorias vão desde “risco mínimo” até “inaceitável”. Aplicações como chatbots simples exigem apenas alertas de transparência, enquanto sistemas usados em recrutamento ou concessão de crédito estão sujeitos a requisitos rigorosos de documentação e verificação.
Outro ponto central é a exigência de transparência sobre o funcionamento dos sistemas. As empresas terão de explicar de que forma os seus algoritmos tomam decisões, quais os dados que utilizam e como esses dados influenciam os resultados. A obrigação de divulgação levanta desafios técnicos e jurídicos, já que deve equilibrar a clareza regulatória com a proteção de segredos comerciais.
A qualidade dos dados de treino é outro foco da lei. O legislador europeu estabeleceu requisitos claros para garantir que os dados sejam robustos, livres de preconceitos e em conformidade com a proteção de dados. A governança de dados, tradicionalmente relegada para segundo plano, ganha assim destaque como fator crítico para o cumprimento da lei.
A conformidade deixou de ser apenas uma responsabilidade da área de TI. Os conselhos de administração e departamentos jurídicos passam a ter um papel ativo, sendo exigida a criação de estruturas de governação de IA com responsabilidades claras, auditorias regulares e avaliação permanente dos riscos regulatórios. Em caso de incumprimento, a responsabilização recai sobre os decisores.
Apesar das exigências, a Comissão Europeia sublinha que o enquadramento legal também pode criar oportunidades. A lei oferece um ambiente regulatório estável que pode reforçar a confiança do mercado e posicionar a conformidade como vantagem competitiva. Em setores onde a proteção de dados e a ética são valorizados, a adoção antecipada de práticas alinhadas com a lei pode traduzir-se em diferenciação perante concorrentes.
Por fim, a legislação pretende contribuir para a soberania digital da Europa, reduzindo dependências externas e garantindo que as decisões tecnológicas são tomadas de forma autónoma e segura.