
As redes criminosas digitais movem-se com agilidade e criatividade, explorando cada nova vulnerabilidade que o mundo conectado oferece. Mas, desta vez, a resposta não está a ficar para trás. O Centro Europeu de Combate ao Cibercrime da Europol (EC3) e a ESET acabam de reforçar a sua cooperação através da fase piloto do Cyber Intelligence Extension Program (CIEP), uma nova iniciativa que pretende elevar o padrão de colaboração público-privada no combate às ameaças digitais.
O programa aposta na partilha de informação em tempo real entre investigadores, técnicos e autoridades, permitindo que dados sobre incidentes, campanhas de ransomware ou redes de fraude online sejam rapidamente transformados em ações operacionais. Para isso, dois especialistas da ESET – o Chief Research Officer, Roman Kováč, e o Senior Malware Researcher, Jakub Souček – passaram recentemente várias semanas na sede da Europol, em Haia. O objetivo: trabalhar lado a lado com as equipas do EC3, identificar padrões de ataque e reforçar investigações transfronteiriças.
“Acreditamos que o CIEP estabelece um novo padrão para o compartilhamento de inteligência que permite transformar dados e informações em ações concretas e estratégias eficazes, prontidão operacional conjunta e impacto coletivo”, sublinhou Kováč, destacando que a proximidade física entre as equipas potencia a eficácia das respostas.
A arquitetura deste programa tem assinatura portuguesa. Gonçalo Ribeiro, Head of Cyber Intelligence da Europol, lidera o desenho e implementação desta nova plataforma de cooperação, num esforço que ultrapassa as fronteiras da União Europeia para atingir uma rede global de parceiros.
Nuno Mendes, CEO da ESET Portugal, vê neste passo uma consolidação natural da longa relação com as forças policiais: “Com décadas de colaboração com autoridades globais e nacionais, a ESET será sem dúvida um valioso recurso de expertise em cibersegurança e inteligência de ameaças no âmbito deste novo projeto do EC3. Esta colaboração reforça também o importante papel que temos tido na consciencialização para a cibersegurança e resiliência das organizações e utilizadores do ciberespaço”.
O histórico da ESET com a Europol não é recente. A empresa faz parte do Advisory Group do EC3, representada pelo investigador sénior Righard Zwienenberg, e já contribuiu para operações de impacto, incluindo a neutralização de ameaças globais como Gamarue, RedLine, Grandoreiro, Lumma Stealer e, mais recentemente, Danabot.
Num ecossistema digital onde a sofisticação dos ataques cresce a cada mês, programas como o CIEP pretendem inverter a lógica do jogo: usar a mesma velocidade e coordenação que alimentam o cibercrime para, desta vez, o travar à nascença.
Implicações geopolíticas e de mercado de uma aliança estratégica
O reforço da cooperação entre a Europol e a ESET através do CIEP não é apenas um exercício técnico. É também um movimento com implicações geopolíticas e económicas relevantes. Num contexto em que o cibercrime é cada vez mais transnacional e sofisticado, a União Europeia procura afirmar a sua autonomia estratégica no domínio da cibersegurança, reduzindo a dependência de tecnologias e serviços de inteligência fora do espaço europeu.
O envolvimento da ESET — uma empresa sediada na Eslováquia, mas com presença global — representa um passo simbólico e prático nessa direção, ao colocar a investigação e resposta a ameaças críticas nas mãos de um parceiro com raízes no continente. Ao mesmo tempo, a presença de Gonçalo Ribeiro na liderança técnica do CIEP reforça o papel da Europa do Sul, e em particular de Portugal, como fonte de talento e inovação nesta área.
Para o mercado, esta cooperação mostra que as linhas que tradicionalmente separavam o setor público e o privado na cibersegurança estão a diluir-se. Empresas de segurança tecnológica passam a integrar-se mais diretamente em operações policiais, criando oportunidades para novas soluções de inteligência, threat hunting e resposta a incidentes. Tal aproximação poderá acelerar a adoção de tecnologias de análise comportamental e inteligência artificial para deteção de ameaças, áreas que já movimentam investimentos significativos no setor.
A nível internacional, a capacidade de mobilizar informação em tempo real entre diferentes jurisdições reforça a posição da Europa como ator credível nas negociações multilaterais sobre normas de ciberespaço. Num cenário em que potências como Estados Unidos, China e Rússia disputam não apenas a supremacia tecnológica, mas também a definição das regras do jogo digital, iniciativas como o CIEP oferecem à UE uma ferramenta de influência e de afirmação da sua visão regulatória.