Qual é a principal conclusão que retira da posição de Portugal no reatório da BestBrokers sobre a concentração da riqueza nas mãos do 1% mais ricos?

O nosso país apresenta um perfil intermédio no contexto europeu ao nível da concentração de riqueza no 1% do topo. A percentagem para Portugal (25,05%) situa-se um pouco acima do registado em outros países mediterrânicos de maior dimensão (como Espanha, Grécia e Itália) e é bastante superior ao apurado na maior parte dos países nórdicos - excetuando a Suécia - e em economias do euro como a Bélgica (15%) e os Países Baixos (cerca de 14%). Ainda assim a concentração da riqueza é inferior à registada em vários países da Europa Central - como a Alemanha, Áustria, França e Suíça - e em alguns Bálticos e do Leste Europeu.

Segundo o relatório da BestBrokers, os 1% mais ricos de Portugal aumentaram um pouco mais de um ponto percentual o peso na riqueza entre 2000 e 2023. É significativo?

Note-se que, nesse período, encontramos fases distintas: uma relativa estabilização da concentração da riqueza nos 1% do topo até à Grande Recessão mundial, uma queda ligeira nos primeiros anos dessa crise e um aumento a partir de 2011 até [um pico em] 2017. Daí até 2023, a proporção da riqueza detida pelos 1% decresceu precisamente um ponto percentual.

Porque razão se registaram essas flutuações?

A estrutura patrimonial dos 1% mais ricos assenta muito mais em ativos financeiros e na propriedade de empresas do que em propriedade imobiliária/habitacional – que é a principal componente do património da generalidade da população portuguesa. A proporção da riqueza do 1% aumentou substancialmente durante e após um período marcado pela perda de peso das remunerações no PIB, num contexto de desemprego elevado e no seguimento da introdução de um conjunto de medidas que implicaram uma transferência de rendimentos do fator trabalho para o fator capital.

E nos anos mais recentes?

Os anos mais recentes foram marcados, em geral, por um aumento do peso dos salários no PIB e por um crescimento dos salários acima da produtividade, tendências que têm impacto – pelo menos, a prazo – na distribuição da riqueza em desfavor dos mais ricos. .

Tem sido referido o papel do património imobiliário como um fator importante, em que sentido?

Há, de facto, uma outra questão que, talvez, possa ter efeito, também, na redução da concentração da riqueza no 1% de topo, e que se prende com a apreciação muito pronunciada do preço das casas. Num contexto de aumento acentuado do valor de mercado dos ativos imobiliários, o facto de constituírem a principal componente da riqueza das classes médias poderá ajudar a explicar a redução do valor da desigualdade em causa. Aquele aumento poderá, também, ajudar a explicar o aumento do rácio entre a riqueza nacional e o rendimento nacional: 622% em 2016 e 723% em 2023. Isto significa que a riqueza nacional representa cerca de sete anos de rendimento nacional.