No mercado há 16 anos, a Autogás é a única empresa que fornece gás veicular em Moçambique. Diante de vários desafios, o seu director executivo, João das Neves, aponta a escassez de fundos como um dos fatores que condicionam a massificação do uso deste tipo de combustível no país.

No entender do gestor, deveriam existir no país fundos de desenvolvimento em condições favoráveis para a expansão da rede de distribuição do Gás Natural Veicular (GNV). Outro desafio são as elevadas taxas de juro.

“Os juros do mercado e as modalidades de pagamento da banca local estão desajustadas das reais necessidades para o desenvolvimento em Moçambique e assim o projecto irá continuar a crescer e a consolidar-se aos poucos e de forma gradual”, diz o responsável.

Entretanto, João das Neves considera que a legislação actual não apresenta qualquer embaraço ao desenvolvimento do sector, embora entenda que esta poderia obrigar os operadores de transportes públicos a utilizarem o combustível em zonas onde exista em abundância, “à semelhança do que outros países fazem”.

Desde que começou  a operar no país, a Autogás conseguiu instalar sete postos de abastecimento  de Gás Natural Veicular em Maputo, na Matola e em Marracuene, o que no entender de Das Neves não é pouco, tendo em conta o investimento realizado em cada um deles. É que, cada posto de abastecimento de gás veicular terá custado à empresa aproximadamente 1 milhão de dólares.

“Consequentemente, não é possível andar a espalhar milhões de dólares sem que sejam sustentáveis. Sete postos é um nível razoável que permite aos moçambicanos começarem a usar”, defende.

Gradualmente, a Autogás pretende crescer para dezenas de postos ao longo dos próximos anos, tal como estimou o gestor, sem avançar datas específicas. A sua experiência faz-lhe afirmar que em todos os países onde o Gás Natural Veicular é um sucesso, numa fase inicial, o processo de implementação foi lento e depois o Estado subsidiou a expansão por se tratar de uma actividade de interesse de comunidades e empresas.

O continente já usa GNV

Em várias regiões do continente africano, João das Neves elucida que o Gás Natural Veicular já está a ser usado, como por exemplo, as vizinhas África do Sul e Tanzânia, bem como no Quénia, Nigéria, Egipto e outros. Tendo em conta o estágio desses países, frisa que ainda há muitos desafios para Moçambique.

“Em Moçambique, o processo de expansão está condicionado, por enquanto, ao desenvolvimento puramente comercial, ou seja, quando a procura aumentar, haverá um acompanhamento da rede de distribuição para garantir a sustentabilidade do negócio”, referiu.

Porque as parcerias ajudam a elevar os negócios, Das Neves diz que há vários Países Africanos de Língua Oficial  Portuguesa (PALOP) que têm tido intercâmbios directos com Moçambique, mas não necessariamente enquadrados na agenda das actividades promovidas por organizações formais do bloco.

“Os juros do mercado e as modalidades de pagamento da banca local estão desajustados das reais necessidades para o desenvolvimento em Moçambique.”

Embora a Autogás tenha reduzido, recentemente, quase pela metade, o preço de conversão de viaturas para passarem a utilizar o Gás Natural Veicular,  em Moçambique ainda há muita gente que queixa-se dos altos custos. O director da Autogás explica as razões: diz que a conversão depende, essencialmente, de vários componentes, entre os quais o custo dos kits usados na montagem do sistema, os acessórios, os impostos e as taxas aduaneiras, assim como a mão-de-obra de instalação do sistema.

“Não tendo sido possível, até aqui, isentar os impostos da importação e venda dos kits, os restantes custos têm vindo a ser optimizados ao máximo pela negociação em escala com os fornecedores e parcialmente subsidiados a partir do fundo de marketing da Autogás”, esclarece.

Mesmo diante da situação, o gestor formado em Mecânica Geral, pela Faculdade de Engenharia da Universidade Eduardo Mondlane, adianta que há possibilidades infinitas de melhorias nos custos. Segundo refere, a Autogás está permanentemente à procura de melhores saídas para que mais moçambicanos tenham incentivos suficientes e aliciantes para aderirem ao GNV e desta forma beneficiarem-se, directamente, da riqueza dos recursos naturais que possuem.

João das Neves defende sustentabilidade dos investimentos.

Concorrência é necessária

Neste momento, a cadeia de valor do Gás Natural em Moçambique ainda oferece uma grande resistência, por não haver muita concorrência entre as empresas produtoras e na rede de gasodutos, o que faz com que a negociação de contratos e a implementação de projectos seja extremamente difícil. Por isso, Das Neves acredita que à medida que a infra-estrutura de transporte e distribuição do gás natural for a crescer em Moçambique, poderá ser mais fácil e rentável investir e operar no subsector.

Dos cerca de 5 mil clientes da Autogás, grande parte possui autocarros e minibuses que fazem o transporte colectivo ou semi-colectivo de passageiros e táxis. Há também empresas de distribuição e em larga escala veículos de alta cilindrada. Na lista consta ainda um número razoável de indivíduos que residem nos arredores da Cidade de Maputo, Matola e Marracuene que procuram poupar combustível porque percorrem grandes distâncias.

Num contexto em que grandes investimentos foram anunciados para o sector do gás em Moçambique, com destaque para a Bacia do Rovuma, em Cabo Delgado, onde um dos projectos já está a exportar, o Coral Sul, operado por um consórcio liderado pela empresa italiana Eni, o fornecedor de gás veicular no país mostra-se bastante expectante.

Para a Autogás, quanto mais cedo houver disponibilidade de gás natural em solo firme (onshore) mais rapidamente irá iniciar o processo de expansão do negócio para a zona norte e gradualmente para o centro do país.

Enquanto isso, há dois projectos bilionários, nomeadamente, da Total Energies e da ExxonMobil, que não avançam devido à questão da insegurança em Cabo Delgado, província assolada pelo terrorismo desde 2017.

“Quanto mais rápido o projecto avançar melhor será para todos. Isso permitirá acelerar o desenvolvimento da indústria local e oferecer aos moçambicanos acesso a uma ferramenta altamente competitiva em relação aos outros empresários da região”, antevê o gestor.

Segurança do gás e o preço

Em termos comparativos, João das Neves considera o gás natural mais seguro que os combustíveis líquidos. “O medo que alguns indivíduos têm faz parte da resistência à mudança. Contudo, os grandes consumidores já ultrapassaram esse mito e estão aptos a usar o gás natural porque sabem das grandes vantagens que oferece”, diz o empresário, para quem, gradualmente, outros potenciais consumidores terão mais consciência.

“O projecto da Autogás não teve nenhum incidente durante os últimos 15 anos como resultado da formação e atenção à segurança, a qual não deve ser entendida como uma coisa complexa, difícil ou cara. Na realidade, os cuidados a ter com o gás são menores do que os que temos que ter com a energia eléctrica ou mesmo os combustíveis líquidos. Basta não haver negligência e cumprir as normas simples e elementares do seu uso para que o mesmo seja seguro”, garante Das Neves.

Em Moçambique, o preço do Gás Natural Veicular é fixado pela Autoridade Reguladora de Energia (AREN) e há um regulamento que garante que o preço será sempre menos de aproximadamente a metade da média entre o preço do diesel e da gasolina, conforme explica a empresa.  “Na realidade, a ARENE actualiza os preços de todos os combustíveis com base nas condições do mercado, incluindo taxa de câmbio, preço do barril de petróleo no mercado internacional entre outros, mas no final de contas o preço do gás depende da decisão do nosso Governo e sem ter que depender de factores externos”, nota.

Para o futuro, a Autogás diz esperar que o número de consumidores do Gás Natural Veicular continue a crescer. “Se houver estímulos favoráveis, o sector crescerá mais rápido”.

Nos próximos tempos, a firma espera implantar mais dois postos de abastecimento de Gás Natural Veicular. “Este é o compromisso da Autogás em mostrar ao mercado que está interessado e a investir no futuro (…). Temos que ir crescendo com muita ponderação e sustentabilidade. Claro que depois de abrirmos mais postos, gradualmente vai reforçando-se a confiança do mercado e consequentemente novos clientes surgirão, mas é um processo gradual”, realça.

Mais de 30 anos a empreender

João das Neves Cajada, nasceu em Chimoio, cidade da província de Manica, em Moçambique, no dia 12 de Agosto de 1969. Empresário com mais de 30 anos de experiência em vários sectores, com boas conexões e amizades pelo mundo, considera-se um homem íntegro, disciplinado e trabalhador. É director executivo da Autogás, SA, desde 2008, e accionista fundador da Zero Investimentos, SA, onde é também PCA desde 2010. Fundou a Mozambique Advisor, onde é administrador desde 1999, e a Marracuene Lodge, que também administra desde 1995. Foi ainda director comercial da Técnica Industrial, entre 1990 a 2002.