As declarações pela paz e contra a guerra, sobretudo os conflitos na Ucrânia e em Gaza, têm sido uma constante para o Papa Leão XIV, cujos primeiros 100 dias de pontificado se assinalam na sexta-feira.

As questões do ambiente, cara ao seu antecessor, o Papa Francisco, da justiça social e dos abusos sexuais também mereceram a atenção do 267.º bispo de Roma.

“Que a paz esteja convosco” foram as suas primeiras palavras no dia em que foi eleito como novo chefe da Igreja católica (08 de maio), dirigindo-se aos fiéis na Praça de São Pedro.

Três dias depois, na primeira saudação dominical aos peregrinos reunidos no mesmo local, Leão XIV gritou “nunca mais a guerra”, falando “aos grandes do mundo” e referindo o “cenário dramático atual de uma III Guerra Mundial em pedaços”.

Evocando os “sofrimentos do amado povo” da Ucrânia, o Papa pediu que se faça “tudo o que for possível para alcançar o mais rapidamente possível uma paz autêntica, justa e duradoura” no país em guerra, invadido pela Rússia em fevereiro de 2022.

“Entristece-me profundamente o que está a acontecer na Faixa de Gaza”, disse no mesmo discurso, pedindo um “cessar-fogo imediato” e “ajuda humanitária” para “a população civil exausta”, bem como “que todos os reféns sejam libertados”.

A ofensiva israelita contra o enclave – que começou depois dos ataques do movimento radical palestiniano Hamas em outubro de 2023 no sul de Israel, que mataram cerca de 1.200 pessoas e fizeram perto de 250 reféns – já causou mais de 61 mil mortos, destruiu quase todas as infraestruturas de Gaza e obrigou à deslocação de centenas de milhares de pessoas, levando vários países e organizações a acusarem o Estado hebreu de genocídio.

Numa audiência aos representantes das 23 Igrejas Católicas do Oriente alguns dias mais tarde, o Papa exortou os líderes mundiais a sentarem-se e a negociarem para “silenciar as armas”, tendo oferecido a mediação do Vaticano a todas as partes beligerantes.

E durante a missa de início do seu pontificado, Leão XIV alertou para a fome sofrida em Gaza por “crianças, famílias e idosos” e pediu ajuda humanitária, referindo igualmente que a “Ucrânia martirizada” espera “negociações para uma paz justa e duradoura”.

Sobre este conflito, o Papa já falou com os presidentes ucraniano e russo, Volodymyr Zelensky e Vladimir Putin, respetivamente, assim como com o presidente do Conselho Europeu, António Costa, e o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres.

Já este mês, a propósito dos 80 anos dos bombardeamentos atómicos de Hiroshima e Nagasaki, disse esperar que a sua memória “sirva de advertência universal contra a devastação causada pela guerra, e em particular pelas armas nucleares”.

Outros dos apelos feitos diversas vezes pelo Papa aos líderes mundiais foi para não ignorarem as necessidades dos mais vulneráveis, tendo proposto logo na missa de início do Pontificado uma Igreja católica unida contra “um paradigma económico que explora os recursos da Terra e marginaliza os mais pobres”.

Criticou “desequilíbrios e injustiças que conduzem (…) a condições de trabalho indignas e a sociedades cada vez mais fragmentadas e conflituosas”.

Pediu “esforços para remediar as desigualdades globais, que deixam profundos fossos entre a opulência e a pobreza, entre continentes, países e até mesmo dentro das sociedades”, considerando que “uma boa ação política, que favoreça uma distribuição equitativa dos recursos, pode oferecer um serviço eficaz à harmonia e à paz, tanto a nível social como internacional”.

Defendeu ainda a preservação da dignidade dos migrantes e encorajou mais de um milhão de peregrinos reunidos em Roma para o Jubileu dos Jovens a “aspirar a grandes coisas” e a não cair no conformismo e no materialismo.

Sobre os abusos, o Papa afirmou que não deve haver tolerância na Igreja Católica para qualquer tipo de abuso, seja sexual, espiritual ou de autoridade, e defendeu uma cultura de prevenção baseada numa “vigilância ativa, (…) processos transparentes e (…) uma escuta sincera dos que foram feridos”.

Também pediu “um diálogo renovado” sobre como está a ser construído o futuro do planeta, numa mensagem para assinalar o 10.º aniversário da encíclica “Laudato Si” de Francisco para proteção da “casa comum que Deus nos confiou”.

Segundo o vice-presidente do Brasil, Geraldo Alckmin, Leão XIV recebeu “com muita simpatia” o convite do seu governo para participar na Cimeira do Clima (COP30), em novembro, na cidade amazónica de Belém.

Também agradeceu o convite para visitar o Santuário de Fátima, segundo o cardeal português António Marto, depois de ter estado duas vezes em Portugal quando respondia apenas pelo nome de Robert Prevost.

Até agora, o Papa só anunciou a intenção de visitar a Turquia para participar no 1.700.º aniversário do Consílio de Niceia, a primeira assembleia ecuménica da história do cristianismo, que estabeleceu as bases doutrinais ainda hoje reconhecidas por muitas denominações cristãs.

Frases que marcaram os primeiros 100 dias de pontificado de Leão XIV

Seleção de frases que marcaram os primeiros 100 dias de pontificado do Papa Leão XIV que se assinalam na sexta-feira:

“A Igreja oferece a todos a riqueza da sua doutrina social para responder a outra revolução industrial e aos desenvolvimentos da inteligência artificial, que trazem novos desafios para a defesa da dignidade humana, da justiça e do trabalho.”

Papa Leão XIV, justificando a escolha do nome, inspirado em Leão XIII, num discurso perante o Colégio Cardinalício

10-05-2025

“Queridos cardeais, vós sois os colaboradores mais próximos do Papa, e isto é de um grande conforto para mim, que aceitei um fardo claramente muito superior às minhas forças, assim como o seria para qualquer outra pessoa.”

Idem, ibidem

“No cenário dramático atual de uma III Guerra Mundial em pedaços, como afirmou várias vezes o Papa Francisco, dirijo-me também eu aos grandes do mundo, repetindo o apelo sempre atual: nunca mais a guerra.”

No discurso integrado na oração “Regina Caeli” (Rainha do Céu), na Praça de São Pedro

11-05-2025

“O povo quer a paz e eu, com o coração na mão, digo aos dirigentes do povo: encontremo-nos, falemos, negociemos! A guerra nunca é inevitável, as armas podem e devem ser silenciadas, porque não resolvem os problemas, mas aumentam-nos.”

Ao discursar na audiência no Vaticano aos representantes das 23 Igrejas Católicas do Oriente

14-05-2025

“Ajudemo-nos uns aos outros, como pedi na noite da minha eleição, para construir pontes, com o diálogo, com o encontro, unindo-nos todos para sermos um só povo sempre em paz.”

Numa audiência com membros da Fundação “Centesimus Annus Pro Pontífice”

17-05-2025

“No nosso tempo, ainda vemos demasiada discórdia, demasiadas feridas causadas pelo ódio, a violência, os preconceitos, o medo do diferente, por um paradigma económico que explora os recursos da Terra e marginaliza os mais pobres.”

Na homilia da missa de início do Pontificado para que foi eleito há semana e meia pelos cardeais, sucedendo a Francisco

18-05-2025

“Não podemos esquecer os nossos irmãos e irmãs que sofrem por causa das guerras. Em Gaza, as crianças, as famílias, os idosos e os sobreviventes.”

Durante a recitação do Regina Coeli após a missa de início do seu pontificado na Praça de São Pedro

18-05-2025

“A nossa oração abraça todos os povos que sofrem por causa da guerra, invocamos coragem e perseverança para todos os que se empenham no diálogo e na busca sincera da paz.”

25-05-2025

“Que o espírito de Cristo Ressuscitado abra caminhos de reconciliação onde houver guerra, que ilumine os governantes e lhes dê a coragem de dialogar.”

Durante a recitação dominical do “Regina Coeli”, na Praça de São Pedro

08-06-2025

“Numa sociedade cada vez mais digital, na qual as tecnologias, embora aproximem pessoas distantes, muitas vezes distanciam as que estão próximas, o desporto valoriza o sentido do corpo, do espaço, do esforço, do tempo real.”

15-06-2025

“É urgente enraizar em toda a Igreja uma cultura de prevenção que não tolere qualquer forma de abuso – nem de poder ou de autoridade, nem de consciência, nem espiritual, nem sexual.”

21-06-2025

“O meu coração sangra quando penso na Ucrânia, na situação trágica e desumana em Gaza e no Médio Oriente, devastado pela expansão da guerra.”

Na assembleia plenária da Reunião das Agências de Ajuda às Igrejas Orientais, na Cidade do Vaticano

26-06-2025

“Desejo exprimir a minha proximidade à Ucrânia atormentada, às crianças, aos jovens, aos idosos e, de uma forma especial, às famílias que choram os seus entes queridos.”

Ao receber no Vaticano um grupo de fiéis da Igreja Greco-Católica Ucraniana

28-06-2025

“Estamos a assistir com desespero ao uso iníquo da fome como arma de guerra. Matar pessoas à fome é uma forma muito barata de fazer guerra.”

Numa mensagem à 44.ª conferência da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura, em Roma

30-06-2025

“De todos os lados, a injustiça, as violações do direito internacional e dos direitos dos povos, as graves desigualdades e a ganância que as alimenta estão a gerar desflorestação, poluição e perda de biodiversidade.”

02-07-2025

“Ver sem passar adiante, parar as nossas corridas agitadas, deixar que a vida do outro, seja ele quem for, com as suas necessidades e sofrimentos, nos parta o coração; isso torna-nos próximos uns dos outros, gera uma autêntica fraternidade, derruba muros e barreiras.”

13-07-2025

“Mais uma vez, peço o fim imediato da barbárie desta guerra e uma resolução pacífica para o conflito.”

No final da oração do Angelus – em Castel Gandolfo, onde passa as férias de verão -, dias depois da morte de três pessoas num ataque israelita à única igreja católica da Faixa de Gaza

20-07-2025

“Entre os muitos desafios que o nosso mundo enfrenta atualmente, incluindo os conflitos armados generalizados, as divisões entre os povos e os desafios da migração forçada, os esforços para promover a não-violência são mais necessários do que nunca.”

26-07-2025

“Vivemos hoje numa nova cultura, profundamente moldada e construída com e pela tecnologia. Cabe-nos a nós, a vós, garantir que essa cultura se mantém humana.”

Durante a primeira missa para influenciadores digitais católicos organizada no Vaticano

29-07-2025

“Reflitam sobre a vossa maneira de viver e busquem a justiça para construir um mundo mais humano, sirvam os pobres e, assim, deem testemunho do bem que sempre gostaríamos de receber dos nossos semelhantes.”

No Jubileu da Juventude, em Roma

02-08-2025

“Aspirem a grandes coisas, à santidade, onde quer que estejam. Não se conformem com menos. Assim verão crescer a cada dia a luz do Evangelho, em vocês mesmos e ao seu redor.”

Na missa de encerramento do Jubileu dos Jovens, em Roma

03-08-2025

“Estamos com os jovens de Gaza, Estamos com os jovens da Ucrânia. Sois o sinal de que é possível um mundo diferente, onde os conflitos não se resolvem com armas, mas com diálogo.”

Idem, ibidem

com Lusa