
Vivemos numa era em que se fala de inteligência artificial, mudanças climáticas e avanços tecnológicos sem precedentes. Mas há uma competência básica, transversal a todos os contextos e gerações, que continua ausente do currículo escolar: a literacia financeira.
Ainda hoje, milhares de jovens saem da escola sem saber o que é uma taxa de juro, como funciona um crédito, o que significa investir ou como planear um orçamento. E essa ausência de conhecimento tem um custo — silencioso, mas profundo. Porque quem não sabe gerir dinheiro, arrisca-se a viver sempre em reação: à conta bancária, às dívidas, às pressões externas, ao fim do mês.
O futuro da educação financeira não pode passar apenas por campanhas pontuais ou semanas temáticas. Tem de ser estrutural. Tem de estar presente na formação de base, desde cedo, como uma linguagem de autonomia e cidadania.
Neste artigo, exploramos por que razão o sistema continua a falhar, como a literacia financeira pode transformar vidas e o que cada um de nós pode fazer para mudar a sua relação com o dinheiro — mesmo sem esperar pelo sistema.
A falha do sistema: por que ainda não se ensina dinheiro nas escolas
Apesar da crescente consciência sobre a importância da literacia financeira, a verdade é que ela continua ausente dos planos curriculares. Em muitos países, incluindo Portugal, os temas relacionados com finanças pessoais surgem apenas de forma pontual, se surgirem.
Há várias razões para esta omissão: a rigidez dos programas escolares, a falta de formação específica dos professores, a dificuldade de integrar conteúdos práticos num sistema ainda muito académico, e até uma certa resistência cultural em falar abertamente de dinheiro.
Mas a consequência é clara: gerações inteiras a entrarem no mercado de trabalho sem as ferramentas básicas para lidar com o dinheiro. E o resultado vê-se nas estatísticas: elevados níveis de endividamento, baixa taxa de poupança e uma grande vulnerabilidade financeira perante imprevistos.
Se a escola prepara para a vida, como pode ignorar um tema que impacta todas as decisões importantes da vida adulta?
O impacto da literacia financeira na mobilidade social
A falta de conhecimento financeiro não é apenas um problema individual — é um fator de perpetuação da desigualdade.
Quem nasce num contexto onde se fala de dinheiro com naturalidade, onde há modelos de poupança e investimento, parte com vantagem. Quem cresce num ambiente onde o dinheiro é tabu, escasso ou fonte constante de stress, tem muito mais dificuldade em criar estabilidade — mesmo quando começa a ganhar melhor.
A literacia financeira é, por isso, uma ferramenta de mobilidade social. Dá às pessoas a capacidade de planear, escolher e proteger o seu futuro — independentemente do ponto de partida. E mais do que multiplicar dinheiro, ela permite multiplicar oportunidades.
Educar financeiramente não é ensinar a ficar rico. É ensinar a viver com autonomia, a prevenir erros graves e a construir, passo a passo, uma vida mais segura e mais livre.
O que cada um pode fazer para mudar a sua relação com o dinheiro
Mesmo sem esperar por reformas no sistema, cada pessoa pode — e deve — assumir responsabilidade pela sua própria educação financeira. E isso começa com uma decisão: a de querer entender melhor o dinheiro, não como fim, mas como ferramenta.
Há hoje mais recursos disponíveis do que nunca. Livros, podcasts, cursos online, criadores de conteúdo, sessões de mentoria. Mas mais importante do que consumir informação é aplicá-la. E aplicar começa por olhar com honestidade para as próprias finanças:
– Onde estou?
– Onde quero chegar?
– O que me impede?
– Que decisões posso tomar hoje para mudar o rumo?
Mudar a relação com o dinheiro implica sair do modo automático, enfrentar medos antigos, desfazer mitos familiares e assumir o controlo — mesmo que se comece devagar.
A transformação começa sempre com um passo. E esse passo não precisa de ser perfeito. Precisa de ser consciente.
Conclusão
A literacia financeira é uma competência de base — tão essencial como saber ler ou escrever.
Esperar que a escola a ensine pode ser um erro. Mas aceitar a sua ausência como inevitável, é um erro ainda maior.
O futuro da educação financeira começa com uma exigência coletiva por mudança — mas também com um compromisso individual com o próprio crescimento. Porque quanto mais pessoas souberem gerir o seu dinheiro, mais forte será a sociedade que construímos juntos.
Educar-se financeiramente é, no fundo, um ato de liberdade. E todos têm o direito — e a responsabilidade — de o fazer.