A presidente do Conselho de Opinião (CO) da RTP considera, em entrevista à Lusa, que a reorganização da empresa é importante, mas sem investimento não é possível, salientando que a diáspora está disponível para investir no país.

Questionada se a rádio pública precisa de mais investimento, Deolinda Machado recorda que o Conselho de Opinião "há muito" que defende que "é preciso investir muito mais".

Até porque "a rádio que tem uma rede de emissores pelo país, que é pública e precisa, de facto, de grande investimento tecnológico", mas "sabemos que os investimentos, infelizmente, têm vindo a ser reduzidos", acrescenta a presidente do órgão, cujo mandato terminou.

Neste momento, o Conselho de Opinião tem uma reunião pedida ao ministro da tutela, António Leitão Amaro, e aos partidos com assento parlamentar.

"Onde iremos colocar, precisamente, as questões que decorrem das audições que temos vindo a promover, porque consideramos que são importantes a reorganização que se quer levar a cabo, mas sem investimento ela não é possível", aponta.

"Há muito que se fala no digital, mas é preciso que se defina bem o que é que se quer do digital e o que é, de facto, o digital", prossegue a responsável, salientando que "a tecnologia tem evoluído imenso, é um fruto da ciência muito importante, mas é preciso também que ela esteja na linha da frente deste meio público, que a todos tem que servir, desde o Porto à Ilha do Corvo", defende.

E até "podem ser pouquinhos, mas são portugueses, poderia ser um? Podia e têm direito como os outros. E, portanto, por exemplo, a TDT [televisão digital terrestre] é outro aspeto que nós também temos identificado", pois ainda há "um número significativo, são perto de 300 mil pessoas", diz.

"A democracia não se faz sem liberdade de expressão, não se faz sem liberdade de informação, sem a credibilidade que ela encerra e os meios [que] têm que estar ao serviço da democracia", aponta.

Se a democracia custa dinheiro? "Pois, claro, custa, mas é o bem maior que temos e é nesse que temos de investir", insiste.

Por exemplo, a contribuição para o audiovisual (CAV) que financia a RTP - cujo valor vem nas faturas de eletricidade - não é atualizada "desde 2017", são "quase 100 milhões de euros que a RTP tem por direito, mas que não se cumpriu" o que a lei exige, aponta.

Por outro lado, "as obrigações de serviço público constantes do contrato de concessão (...) e decorrentes também da Constituição da República efetivamente exigem que a cultura e a língua sejam difundidas e o mais amplamente possível", recorda.

A RTP África, por exemplo, e a RTP Internacional, a RDP África, a RDP Internacional, "na verdade, estão desprovidas de investimento e precisam efetivamente que ele ocorra", mas há "falta de vontade política para que isso aconteça efetivamente" desde há vários governos, lamenta.

"E a diáspora portuguesa está disponível para investir neste país, está disponível para cooperar", mas tal não tem sido aproveitado, "não chega só no dia 10 de junho dar os parabéns e distribuir bandeirinhas", ilustra Deolinda Machado.

Considerando ser "muito importante que se assinale esse dia", o Dia de Camões, tal não chega: "Camões é muito mais que isso. E, portanto, é uma língua, é uma cultura que, de facto, como dizia o poeta, vem de longe e vai para longe, se todos quisermos, e estamos empenhados nisso".

Questionada sobre o novo contrato do Serviço Público de Media (SPM) da RTP, a presidente do CO diz que na perspetiva do órgão "ficou aquém".

"Há aspetos que poderiam ter sido melhorados, mas as questões principais, de facto, são estas, as do financiamento e da responsabilidade do Estado português que deverá ter na difusão da cultura e da língua", sintetiza.

Quanto à reorganização da RTP, que levou à mudança de chefias, a responsável salienta que era necessária e que o CO sabia que estava a ocorrer.

"No entanto, é preciso que ela, de facto, tenha humanização, que ela envolva toda a gente, e houve quadros que não foram envolvidos, e isso é pena, porque isso fragiliza", considera, apontando que há pessoas "que estão na empresa há 30, 40 anos" ou mais e é "importante que elas próprias, tendo elas dado para a prossecução destes objetivos, nomeadamente da difusão da cultura e da língua" sejam mais envolvidas.

"Algumas foram um bocadinho, outras foram menos, outras não foram, atempadamente", diz, sublinhando que "a construção conjunta, geralmente, resulta mais".

Aquilo que "nos foi referido foi: o 'timing' em que ocorreu é que foi menos positivo. O 'timing' e o processo, a forma (...) podia ter sido diferente", sublinha.

De qualquer modo, "o que falta é, efetivamente, o investimento", reforça a responsável.

"E preciso exigir do Estado português aquilo que são as obrigações para que esta empresa prossiga, saudável, não uma RTPzinha, porque sem investimento e com mais obrigações, estamos mesmo a ver qual é o caminho" e "eu já vi [isso] duas vezes" e "não queria voltar a vê-lo".

Recorda que há "14,29 milhões de euros dívida do Estado à empresa, que não foram ressarcidos até agora", apontando que "vieram 2 milhões de euros no tempo do governo socialista".

Depois da entrada deste governo, no ano passado, "em outubro, numa reunião com o ministro Pedro Duarte, foi-nos dito que esta dívida (...) ia ser saldada até dezembro, ia ser de forma integral", mas "até hoje, nada".

Esta é também uma questão que será abordada com o ministro da tutela.

Quanto à publicidade, o CO mantém a continuação dos 6 minutos, porque se pretende um serviço público "com público".

A publicidade "também traz" público, refere.

"Queremos um serviço público com audiência, evidentemente, para chegar a todos, a todas as camadas. Nas plataformas, nós sabemos que a retirada da publicidade", 77% "vai para as grandes plataformas internacionais. É isso que queremos? Penso que não", remata.

Salienta ainda que com as novas plataformas, a RTP tem dedicado imenso aos jovens e os jovens procuram os seus conteúdos.

"As audiências são de extrema importância e daí também a publicidade, que é outro aspeto que nós também referimos, é importante porque na medida em que nos procuram e nós também podemos responder (...) cada vez melhor a cada público", mediante a sua especificidade, são aspetos que devem ser aprofundados.

"Infelizmente no nosso país (...) colocam-se novas medidas, sem avaliar as anteriores e, sem haver uma avaliação séria e honesta, não é possível avançar e cavalgar na onda seguinte. Pode estar na moda, mas é capaz de não ser boa ideia", conclui Deolinda Machado.

Relativamente ao arquivo, destacou que "é dos melhores arquivos a nível europeu".