Afonso Cruz nasceu em 1971, na Figueira da Foz. Tem mais de 40 livros publicados, entre romances, novelas, teatro, poesia, álbuns ilustrados, foto-texto, ensaio e não-ficção. Recebeu vários prémios pelos seus livros, cujos direitos estão vendidos para mais de 20 línguas.
Há mistérios que não se deixam abrir com chave de fendas: um gato é um desses mistérios. Como a flor descrita pela botânica não descreve a flor que alguém recebeu por paixão.
Não existem trabalhos modernos com cânticos. A tristeza no trabalho acontece de forma generalizada, não tendo nada que ver com o retorno financeiro, mas com a própria estrutura de produção.
Tiranetes terão muita dificuldade em compreender o gesto tão prosaico de fazer compotas, de fortalecer laços em vez de destruir a sociedade, o futuro e a esperança. Curiosamente, ao contrário da minha avó, é mais fácil ficarem para a História.
Não é demagogia afirmar que os ditames ontológicos relativamente ao Outro são claros e atravessam vários textos. São uma conduta que não precisa de mais interpretação do que uma leitura literal ou perto disso.
Se crianças conseguem fazer «pulverizar os olhos», em que momento nos perdemos perdendo essa capacidade espontânea, ao ponto de termos de lutar por ela?
Numa carta de Dostoiévski a uma mulher chamada N. D. Fonvizina, em 1854, durante o seu exílio na Sibéria, lê-se: «Mesmo que me provassem que Cristo está fora da verdade, eu preferiria ficar com Cristo a ficar com a verdade.»
Uma pessoa não pode ter um universo como este e o Godzilla. A realidade, embora mais limitada, não tem pruridos em fazer existir o ridículo ou o grotesco, sem precisar de tornar a trama plausível.