
Entre o impacto emocional de disputar um troféu a abrir a temporada contra um rival e o impacto financeiro de disputar quatro partidas que valem muitos milhões de euros, a ida à Reboleira poderia parecer a menos mediática das partidas do arranque do Benfica 2025/26. O jogo de menor pesos, o compromisso que não estava assinalado no calendário.
Se alguém pensava que tratar-se-ia de uma formalidade entre encontros cheios de responsabilidade, bem enganado estava. A estreia das águias na I Liga foi dura, foi um confronto físico, daqueles que moí, daqueles que chateiam.
O Estrela da Amadora foi, mais do que um adversário futebolístico, um desafio de disponibilidade mental, de estar pronto para ir ao confronto, de sujar os calções e ter gosto nisso. O penálti de Pavlidis deu os três pontos e permite a Lage pensar no José que é Mourinho.
O José que é Faria levou o jogo para as trincheiras. Com um relvado de escassa qualidade, o Estrela aplicou uma proposta original: em teoria, havia três pontas-de-lança de raiz no onze (Abraham, Godoy e Gastão) e ainda Jovane Cabral, toda a vida um atacante. Na prática, havia três centrais e o cérebro de Paulo Moreira atrás de um coletivo cheio de agressividade e força nos duelos, com Jovane e Abraham reinventados como interiores e o ambidestro Lopes Cabral e o ziguezaguente Fábio Ronaldo pelas alas.
Plena de automatismos e intenções firmes, a equipa local, de desenho mutável, procurou ser um daqueles mosquitos das noites de verão. Sempre a zumbir nas orelhas do Benfica, impedindo que as águias dormissem, à espreita de as picar. Em duas situações no primeiro tempo estiveram os amadorenses perto de abrir o marcador, mas Chernev não teve boa pontaria e Trubin parou uma bela finalização de Gastão.
Do outro lado, os encarnados, com a curta ida à Reboleira encaixada entre a necessidade de superar eliminatórias de Liga dos Campeões, também cheirou o 1-0 num primeiro tempo de diversas situações perto das balizas. Dahl, ofensivamente muito ativo, atirou a raspar o poste direito de Renan, Pavlidis ficou perto de calcanhar, Schjelderup viu Luan fazer um corte salvador.
Após o descanso, a tendência geral da noite não se alterou. Lopes Cabral, muito ativo a executar de direito ou de esquerdo, atirou para defesa incompleta de Trubin, não aproveitando Godoy a recarga, ainda que parecesse em posição adiantada.
Bruno Lage manifestava faces de desconforto, como alguém com muita presa para chegar ao destino, mas que se viu preso no trânsito da hora de ponta. Ainda assim, à passagem da hora de jogo o Benfica encontrou, no meio do engarrafamento, o golo. Dahl cruzou, Ivanovic caiu na área e, na transformação do penálti, Pavlidis debutou a nível concretizador na campanha.
Depois de andar às voltas com criativos que poderiam vir ou criativos que não faziam falta, o Benfica virou a equipa da parelha de pontas-de-lança. Pavlidis e Ivanovic, juntos, apontaram 54 golos na época passada, mas ainda procuram a melhor sintonia.
O grego vai tentando desenvolver o seu futebol de ligações, como o nó de uma rede de auto-estradas, mas o croata revelou alguma dessintonia na primeira vez que pisou a I Liga. No único remate que efetuou, pouco antes de ser substituído, Renan Ribeiro respondeu com classe. O Estrela parece ter melhorado nalgumas posições face ao passado recente e a baliza é uma delas.
O Estrela, que não derrota o Benfica há 23 jogos, desde que Jorge Jesus ainda treinava na Amadora — um 3-0 em 1999/00—, manteve a aposta até final. O José que é Faria tinha mais três pontas-de-lança para lançar no banco e colocou-os a todos.
Um dos que entrou, o romeno Stoica, aproveitou, aos 90', um erro de António Silva para aproveitar outro dos suplentes utilizados, Kikas, que, isolado, atirou por cima. Logo a seguir, Rodrigo Pinho, o terceiro dianteiro que entrou — ainda que para a tal posição de espécie de médio-interior que o José que é Faria criou —, mandou uma bomba na direção da baliza de Trubin, mas passou ao lado.
Schjelderup, já no banco, reagiu à derradeira chance do Estrela com cara de alívio. Após o apito final, Bruno Lage foi efusivo rumo aos balneários, feliz por sobreviver às trincheiras. Agora já pode pensar no José que é Mourinho.