
Noventa minutos volvidos, o Benfica continuou sem sofrer golos, e o Tondela sem conseguir marcá-los. As concretizações de Ivanovic e Aursnes, para os encarnados, fizeram a diferença, e os três pontos em disputa ficaram, sem ponta de surpresa, no estádio da Luz.
Mas há que não tapar o sol com a peneira e dizer as coisas como elas são: o Benfica não jogou ‘apenas’ para ganhar ao Tondela; a equipa de Bruno Lage esteve sempre com um olho no adversário beirão, e com outro no Fenerbahçe, que estará em Lisboa na quarta-feira para discutir uma presença na fase milionária da Champions. Ou seja, sempre desconfiados do Tondela e de Ivo Vieira (que já lhes provocou amargos de boca), os encarnados geriram recursos, geriram ritmos, e geriram desgastes, a pensar na forma de chegar em melhores condições ao duelo com os pupilos de José Mourinho. Sem nunca menosprezar a capacidade do Tondela, o Benfica não colocou a carne toda no assador, fez o quanto baste para sair justo vencedor do encontro, e criou melhores condições para lutar por uma presença entre a elite do futebol europeu.
E fê-lo como? Em primeiro lugar, dando descanso (a uns mais, a outros menos) a António Silva, Dedic, Dahl, Akturkoglu, Berrenechea e Ivanovic; depois, optando por jogar a velocidades diferentes, carregando ou levantando o pé do acelerador, para manter as operações sob controlo. Pode dizer-se que a estratégia de Bruno Lage, que não teve como efeito uma exibição, como dizia Eriksson «à la champagne» resultou, os três pontos nunca estiveram em causa, e os recursos para enfrentar os turcos foram preservados. Mas sendo este o panorama geral do Benfica- Tondela, haverá mais que se diga, do ponto de vista individual e coletivo.
TONDELA ATREVIDO
O treinador do Tondela abordou a viagem à Luz com uma atitude positiva: decidiu defender em 4x4x2, deixando Miro e Hodge na frente para atrapalharem as saídas de bola dos donos da casa, e rapidamente se mostrou capaz, o que dá nota de uma equipa bem trabalhada, de atacar em 4x3x3 e, se muito pressionado, fechar-se em 4x5x1, tudo feito de forma harmoniosa. A estas dificuldades colocadas pelo adversário, o Benfica respondeu essencialmente virado à direita: o flanco onde sobressaíam Dedic e Aursnes (os melhores em campo), deu água pela barba aos beirões e muito cedo o brasileiro Bernardo Fontes, 23 anos promissores, foi chamado a trabalho aturado, a remates de Ivanovic e Pavlidis, este por duas vezes. Já do outro lado, o Benfica mostrava-se ferido de asa, com Obrador (tem qualidade, precisa de confiança) e Schjeldrup (melhor da ala para o meio, do que da ala para a linha de fundo) a ficarem apenas com 25 por cento das iniciativas.
Talvez valha a pena sublinhar a subida de produção de Dedic, que embora beneficiando do conforto tático de Aursnes na direita, esteve mais focado nas finalizações dos lances (leia-se passes ou cruzamentos), criando uma dinâmica que em nada ficou a dever aos melhores momentos de Grimaldo ou Carreras. E foi de uma combinação entre os ‘austríacos’ - um bósnio e o outro croata – Dedic e Ivanovic, que o Benfica chegou à vantagem aos 31 minutos.
Até ao 2-0, que demorou mais 11 minutos, e saiu da parceria norueguesa entre Schjelderup e Aursnes, o funcionamento do lado direito do Benfica foi de grande nível, não só pelo volume de ataque, mas ainda pela forma como foram criados equilíbrios defensivos. O Benfica chegou ao intervalo com o jogo controlado, e a poder gerir o jogo com o Fenerbahçe. Mas...
AVISO E CONTROLO
Após o intervalo, Ivo Vieira deu mais ambição ao meio-campo (Tavares por Hugarte) e refrescou o ataque (Hodge por Sitholde), e muito rapidamente criou uma situação (o árbitro, ‘tenrinho’ - ai a lei da vantagem...-, assinalou grande penalidade, revertida pelo VAR) que colocou o Benfica em sentido. Os encarnados reagiram, Otamendi esteve perto de marcar aos 55 minutos, mas foi novamente o técnico do Tondela a não atirar a toalha ao chão, procurando ainda, com Rodriguez e Outtara, adensar as preocupações defensivas dos encarnados.
Mas Lage tinha argumentos no banco, e usou-os: Dahl e Akturkoglu foram revolucionar o flanco esquerdo (68) e Prestianni deu mais velocidade à direita, passando Aursnes para lateral. Com esta resposta, e independentemente do que os beirões ainda fizeram, com a entrada de Ceitil e uma boa atitude competitiva permanente, o Benfica fez xeque-mate. E para que não subsistissem dúvidas, nem relativamente à vontade de manter os três pontos, nem quanto a uma estratégia (jamais assumida, por certo), que tinha o Fenerbahçe em mente, Bruno Lage ainda descansou Ivanovic e Berrenechea, fazendo entrar uma dupla mais defensiva, Barreiro, mais à frente e Florentino mais atrás.
Com este desenho, e depois do Pavlidis ter visto o excelente Tiago Manso negar-lhe o 3-0 (90+3), foi preciso esperar mais três minutos até que Prestianni, após uma jogada de insistência em que interveio Aursnes, voltasse a colorir o ‘placard’ para o Benfica. A última imagem que fica deste Benfica-Tondela é a de Otamendi, 37 anos, celebrar, pegando pelos pés e virando-o, como dizem os brasileiros, «de ponta-cabeça», o compatriota Prestianni, 18 anos mais novo, numa conjunção de gerações e vontades comuns, que quem sabe como funciona um balneário só pode valorizar. Aconteça o que acontecer na quarta-feira, na ‘final’ europeia com o Fenerbahçe..