O candidato presidencial António Filipe apelou, esta terça-feira, a um sobressalto perante a situação "muito grave" na saúde, pedindo que todos os órgãos de soberania assumam responsabilidades, e considerou estar a haver "falhas graves" no combate aos incêndios florestais.

Em declarações aos jornalistas após um encontro com jovens no Largo da Severa, em Lisboa, António Filipe considerou que a situação que se está a viver no Serviço Nacional de Saúde (SNS) "é muito grave", após ter sido questionado sobre o caso de uma jovem grávida que teve o parto numa rua do Carregado, concelho de Alenquer.

O candidato presidencial, apoiado pelo PCP, considerou que há um "número excessivo de grávidas a dar à luz em ambulâncias" e afirmou que o caso da jovem grávida no Carregado deve ser investigado. "Aquilo a que estamos a assistir é impróprio. No século XXI isto não pode acontecer. E creio que há que ter um sobressalto sobre isto", defendeu, considerando que "todos os órgãos de soberania têm de assumir responsabilidades".

"Há responsabilidades diretas, naturalmente, da parte do Governo relativamente a esta situação, e acho que o Presidente da República não pode deixar de exigir responsabilidades relativamente a isto", disse.

António Filipe frisou, contudo, que o problema não é uma questão de pessoas, numa alusão à ministra da Saúde, mas defendeu que "o Governo tem de assumir responsabilidades pelo que se está a passar no SNS".

Questionado se considera que a ministra da Saúde, Ana Paula Martins, deveria apresentar a demissão, António Filipe respondeu: "Se esta ministra for substituída por outro ministro ou outra ministra que siga a mesma política, nós não resolvemos o problema." "Creio que o que é preciso é que haja, da parte do Governo, medidas concretas no sentido da valorização do SNS e com a contratação e a retenção dos profissionais necessários para que estas situações não aconteçam. Isto não pode pura e simplesmente acontecer com a frequência e a gravidade com que está a acontecer", disse.

Nestas declarações aos jornalistas, António Filipe foi questionado se responsabiliza o Governo sobre a atual gestão dos incêndios florestais, e respondeu que "quem é responsável tem de ser responsabilizado".

Numa alusão aos três aviões 'Canadair' que estão inoperacionais, António Filipe disse que se está a assistir a uma falta de meios para combater os incêndios florestais, apesar de o Governo ter deixado a "garantia de que tinha todos os meios disponíveis".

"Afinal, há meios que não funcionam, aviões que estão avariados e há a necessidade de pedir, como vimos, auxílio a Marrocos", disse, considerando que está a haver "falhas graves no combate aos incêndios florestais".

"Há meios que estão a faltar e a responsabilidade disso é uma responsabilidade governativa", disse, defendendo que é necessário um "apuramento de responsabilidades, logo que seja possível, para que estas coisas não ocorram sistematicamente".


Acusações ao Governo e à direita

Num discurso num encontro com jovens no Largo da Severa, em Lisboa, António Filipe abordou o chumbo, pelo Tribunal Constitucional (TC), da lei dos estrangeiros, para salientar que se tem assistido a “um coro de contestação da direita à própria legitimidade do TC para tomar as suas decisões”. “Isto é gravíssimo, do ponto de vista democrático”, advertiu, acusando o Governo e a maioria de direita de querer “confrontar valores constitucionais”.

“Nenhum Governo, nenhuma maioria parlamentar, pode estar acima da Constituição e as decisões do TC. Gostemos ou não - podemos discordar delas -, mas elas têm de ser respeitadas”, defendeu.

António Filipe abordou em particular a convocação, pelo Chega, de uma manifestação para o dia de 24 de agosto contra o veto, pelo Presidente da República, da lei dos estrangeiros, considerando que, “quando se anunciam manifestações para contestar a decisão do TC, estão a querer contestar os fundamentos do Estado de Direito, da democracia”. Ventura, numa carta aos militantes do Chega, apela à participação nessa manifestação e invoca o veto de Marcelo como uma das razões para tornar ainda mais necessário que o seu partido tenha uma candidato presidencial próprio.

O candidato presidencial, apoiado pelo PCP, disse considerar que o TC, ao longo da sua existência, desde 1982, tem tido “um registo de jurisprudência conservador em muitos aspetos”, mas ressalvou que não é por discordar de algumas das suas decisões que põe “em causa a sua legitimidade constitucional para tomar decisões”. “E por isso é que eu considero que é grave essa ideia de um Governo, de uma maioria parlamentar, que se quer sobrepor às decisões do Tribunal Constitucional e que queiram pôr em causa a sua legitimidade”, disse.

Pouco depois, em declarações aos jornalistas, António Filipe disse que as críticas da direita ao TC não são novas, frisando que, quando os juízes do Palácio Ratton declararam inconstitucionais os cortes dos subsídios de férias e da Natal que tinham sido decididos pelo Governo de Pedro Passos Coelho, também “houve um clamor vindo da parte do Governo”.

Até houve deputados a exigir que houvesse sanções contra os juízes do TC. Nós estamos a assistir ao mesmo, ou seja, há uma contrariedade e, da parte da maioria de direita que aprovou esta legislação – PSD, CDS, Chega – vem um clamor de contestação à legitimidade do TC”, referiu.

António Filipe defendeu, contudo, que ao TC tem uma “legitimidade constitucional que é inatacável e, portanto, pôr em causa a legitimidade de o TC exercer as suas competências é pôr em causa um fundamento do Estado de Direito”.

O candidato presidencial destacou que a separação de poderes é “uma questão fundamental na democracia”, porque, “sem separação de poderes, não há regime democrático”, e a Constituição da República prevê “um equilíbrio de órgãos de soberania que não permitisse que um órgão de soberania se sobreponha a todos os outros”.

“E aquilo que estamos a assistir é a maioria parlamentar e o Governo a querer sobrepor-se aos outros órgãos de soberania, e isso não pode acontecer”, reforçou.

No seu discurso perante os jovens, que foram fazendo várias intervenções para lamentar a falta de investimento no desporto, a precariedade laboral, a falta de medidas climáticas ou os direitos das mulheres, António Filipe defendeu que “o que os jovens precisam é de um Presidente da República que esteja ao seu lado contra aqueles que querem afrontar a Constituição”.

“E, nesse confronto, eu serei um candidato à Presidência da República de confronto com essas conceções, de resistência contra aqueles que querem subverter o regime democrático constitucional, numa agenda reacionária que está em curso”, assegurou, perante os aplausos dos jovens.