As doenças cardiovasculares (DCV) continuam a ser a principal causa de morte em Portugal e na Europa. Apesar dos avanços terapêuticos e tecnológicos, a carga destas doenças continua a ser avassaladora. Um dos aspetos mais relevantes é que, em grande parte dos casos, poderia ser evitada com medidas simples, mas eficazes como educação, prevenção e reabilitação. A doença cardiovascular é assim uma doença com grande componente comportamental.

Entre os fatores de risco mais prevalentes, encontramos o sedentarismo, a hipertensão arterial, a dislipidemia, o tabagismo, a diabetes e a obesidade abdominal. Estes fatores, embora bem conhecidos, continuam amplamente presentes na população – muitas vezes por falta de acompanhamento, literacia em saúde ou políticas públicas eficazes. A conjugação de maus hábitos alimentares com inatividade física, tabagismo e stress crónico cria a oportunidade para o desenvolvimento das doenças cardiovasculares.

Neste sentido, o exercício físico ganha um papel central, não apenas na prevenção, mas também na reabilitação cardíaca. Está cientificamente comprovado que o exercício regular melhora o perfil lipídico, reduz a tensão arterial, promove a perda de massa gorda e melhora a sensibilidade à insulina, reduz a ansiedade, a depressão e aumenta a qualidade de vida em geral.

Infelizmente, a adesão à reabilitação cardíaca em Portugal ainda é reduzida. Muitos doentes não têm acesso ou desconhecem os programas existentes, não são referenciados ou simplesmente não entendem a verdadeira relevância desta mudança de comportamento e da importância da adesão a estas medidas. A reabilitação cardíaca reduz a mortalidade, o risco de re-internamento e melhora a funcionalidade global do doente.

Num país onde o envelhecimento da população é uma realidade, temos de mudar o paradigma: tratar depois da doença não chega – é preciso agir antes, com estratégias de educação, prevenção e acompanhamento contínuo. O sistema de saúde deve investir mais na reabilitação cardíaca como uma extensão natural do tratamento hospitalar, e não como um recurso supérfluo ou uma opção secundária.

Além disso, é essencial desmistificar o exercício físico como algo exclusivo de pessoas jovens ou atletas. O movimento é vida – e para quem já teve um evento cardíaco, pode ser a diferença entre recuperar ou regressar ao hospital. Os programas de reabilitação devem ser adaptados à capacidade funcional de cada doente, progressivos e seguros, e sempre acompanhados por profissionais especializados.

O papel do enfermeiro especialista em reabilitação, dos fisiologistas do exercício e dos fisioterapeutas é crucial neste processo. São estes profissionais que acompanham o doente no processo de autogestão do seu corpo, dos seus limites e, acima de tudo, da sua confiança. Promover autonomia, adesão e literacia em saúde é tão importante quanto controlar os valores de colesterol ou pressão arterial.

Como sociedade, temos também de combater o estigma e a desinformação. A ideia de que “quem tem coração fraco tem de ficar quieto” é ultrapassada e perigosa. O que o coração mais precisa, na maioria dos casos, é precisamente de movimento – movimento controlado, progressivo, estruturado.

Em resumo, a doença cardiovascular continua a ser uma das maiores ameaças à saúde pública, mas é também uma das áreas onde mais podemos intervir com resultados concretos. O exercício físico e a reabilitação cardíaca não são apenas opções terapêuticas: são direitos que todos os doentes deveriam ter garantidos. Cabe-nos, enquanto profissionais e cidadãos, exigir que esses direitos sejam respeitados – e sobretudo, que sejam postos em prática.

Docente na Escola de Enfermagem (Porto) e na Faculdade de Ciências da Saúde e Enfermagem