Será que voltaremos a ter milhafres-reais a criar no Alentejo?

Hoje trago-vos uma história inspiradora, que nos mostra como a cooperação internacional pode fazer a diferença na conservação da natureza. Falamos do milhafre-real, uma das aves de rapina mais elegantes da Europa, que está a regressar aos céus do sul ibérico, graças a um projeto que une esforços entre Portugal e Espanha.

Esta espécie, com o nome científico de Milvus milvus, outrora comum, está hoje criticamente ameaçada em território português. Para inverter esta tendência, está em curso desde 2022 o projeto europeu LIFE Eurokite, com o objetivo de reforçar a população de milhafres-reais no sul da Europa.

Em Espanha, sobretudo na Extremadura e na Andaluzia, já foram libertadas quase cento e trinta aves em zonas próximas da fronteira com o Alentejo. O objetivo é claro: criar condições para que estas aves se instalem e, com o tempo, regressem também a Portugal.

Libertar as aves perto da fronteira tem uma razão muito prática. O milhafre-real é uma ave com grande capacidade de dispersão. Quando os juvenis ganham autonomia, procuram novos territórios. O Alentejo, com os seus montados, áreas abertas e baixa perturbação humana, oferece condições ideais para a espécie.

Mas a verdade é que o milhafre-real está mesmo muito ameaçado no nosso país. Estima-se que existam apenas entre cinquenta a cem casais reprodutores, a maioria no norte. No sul, praticamente desapareceu nas últimas décadas, por causa da caça ilegal, do uso de venenos e da perda de habitat.

Apesar disso, há sinais de esperança. Desde o início do projeto, pelo menos cinco milhafres libertados em Espanha já foram registados no Alentejo. E em 2025 tivemos um marco importante: um casal, formado por aves libertadas, tentou nidificar em território português. Ainda não houve reprodução com sucesso, mas o simples facto de estarem a tentar instalar-se cá é muito promissor.

Estas aves são acompanhadas com grande rigor. Cada milhafre-real libertado é equipado com um emissor GPS, o que permite saber por onde anda em tempo real. Além disso, têm marcas visíveis nas asas, com códigos e cores, o que facilita a identificação por observadores de aves, fotógrafos e qualquer cidadão atento que os aviste.

E há exemplos de sucesso fora da Península Ibérica. No Reino Unido, por exemplo, aves criadas em cativeiro e libertadas voltaram, anos depois, a formar casais longe do ponto de origem. Também em Itália foram obtidos bons resultados. São sinais de que, com tempo, ciência e vontade política, é possível restaurar populações selvagens de forma duradoura.

Será que voltaremos a ter milhafres-reais a criar no Alentejo? Acreditamos que sim. Mas será preciso persistência, vigilância e, acima de tudo, a redução das ameaças. É um trabalho contínuo que exige o envolvimento das autoridades, das organizações e da sociedade em geral.

Conselho ambiental: O milhafre-real é um símbolo de equilíbrio ecológico e de esperança. O seu voo elegante pode voltar a fazer parte das paisagens do Alentejo. E todos podemos ajudar. Se avistar uma ave com marcas nas asas, comunique a observação. E, acima de tudo, observe as aves sem as perturbar. A natureza agradece.

Até à próxima. E lembre-se de ajudar a preservar o ambiente!