O novo museu instalado no Palácio Condes da Ribeira Grande, na Rua da Junqueira, abrirá com cerca de um terço da coleção - com 600 obras - incluindo a exposição permanente e duas temporárias na ala do novo edifício contemporâneo.

"Este projeto é um museu que tem um hotel de cinco estrelas e não é um hotel que tem um museu. O hotel é para manter a sustentabilidade do projeto museológico", fez questão de esclarecer o colecionador durante uma visita para jornalistas ao novo espaço cultural que inclui 64 quartos com obras de arte no interior.

A inauguração do museu será marcada por três dias de eventos e atividades comemorativas de música, poesia e obras de arte comentadas, com entrada gratuita para o público entre as 10h00 e as 19h00 de sábado, domingo e segunda-feira, segundo a organização.

Nesta primeira fase, o hotel funciona apenas para convidados e abrirá ao público em geral na Páscoa, segundo o proprietário, que manifestou orgulho por liderar um "projeto exclusivamente privado".

"Decidi não ficar dependente de apoios públicos, o que é inédito em Portugal. Como museu privado, resulta apenas de capitais próprios", sublinhou Armando Martins, que começou aos 18 anos, com amigos, a colecionar serigrafias, e no aniversário dos 25 anos - a 22 de março de 1974 -, adquiriu a primeira pintura, de um artista português, Rogério Ribeiro.

As aquisições passaram a ser mais intensas na década de 1980, particularmente de arte portuguesa contemporânea do século XX, estendendo-se em seguida a artistas estrangeiros.

"Em 1988, organizei a primeira exposição com cerca de 90 obras de Manuel Cargaleiro, entre serigrafias e pinturas originais, em Penamacor, a minha terra natal, e apareceram mais de 500 pessoas para a visitar. Tivemos de pedir a intervenção da GNR para gerir o trânsito", recordou o colecionador, sobre o momento da tomada de consciência do interesse do público pelas artes plásticas.

Na coleção Armando Martins estão obras de artistas portugueses de renome como Paula Rego, Maria Helena Vieira da Silva, José Malhoa, Amadeo de Souza-Cardoso, Almada Negreiros, Eduardo Viana, Pedro Cabrita Reis, Julião Sarmento, Rui Chafes, José Pedro Croft, Lourdes Castro, entre outros.

A obra mais antiga da coleção, exposta na primeira sala da galeria com a mostra permanente é assinada por José Malhoa (1855-1953), e intitula-se 'A sesta dos ceifeiros'.

"Este conjunto foi reunido ao longo de mais de 50 anos, e havia o desejo de partilhar as obras de arte com o público. Também de as usufruir, porque há muito tempo que o próprio colecionado não as via", comentou Adelaide Ginga.

O MACAM é composto por quatro galerias, duas delas situadas no edifício histórico, e outras duas no novo edifício, cuja fachada é revestida por azulejos tridimencionais da autoria da artista e ceramista portuguesa Maria Ana Vasco Costa, inspirada na tradição da azulejaria portuguesa.

A exposição permanente intitula-se 'Uma coleção a dois tempos', com curadoria de Adelaide Ginga, diretora do museu, e de Carolina Quintela, reunindo obras de artistas portugueses e estrangeiros como Júlio Pomar, Helena Almeida, Ernesto Neto, Marina Abramovic, Olafur Eliasson, Isa Genzken, Liam Gillick, Dan Graham e Thomas Struth.

Na capela, dessacralizada e totalmente restaurada, estão três obras criadas pelo artista espanhol Carlos Aires especificamente para o espaço, inspiradas na santa padroeira local, Nossa Senhora do Carmo, e em Santo António, padroeiro de Lisboa.

"Foi feito um restauro extraordinário, uma recuperação completa deste espaço que será dedicado às artes performativas em complemento à vertente de artes visuais", indicou Adelaide Ginga, acrescentando que o espaço servirá em permanência como bar, a par de uma programação com poesia, teatro e concertos.

De acordo com Adelaide Ginga, o palácio do século XVIII, que foi ocupado por uma família portuguesa aristocrata, passou a ser, em parte, destinado a ensino privado e em seguida ocupado por liceus públicos até ser encerrado e abandonado, vindo depois a ser adquirido por Armando Martins.

Na nova ala estão duas exposições temporárias, uma intitulada 'Antropoceno: em busca do novo humano?', que explora o impacto da atividade humana no planeta, e a segunda designada 'Guerra: realidade, mito e ficção', sobre a fragilidade e complexidade do mundo atual face a diversos conflitos geopolíticos à escala global.

O programa museológico inclui ainda o projeto MurMur, que convidará artistas emergentes a criar obras especificas para as grandes paredes da entrada do edifício novo, cuja primeira artista convidada é Marion Mounic, com a instalação 'Harem'.

No interior é possível ver obras de Rui Toscano, Matt Mulligan, Eugénio Merino, Edgar Martins, entre outros artistas.

O museu e o hotel ocupam 13.000 metros quadrados, destes, 2.000 são dedicados a exposição, incluindo uma área de reservas onde se encontram as restantes obras da coleção, e uma área destinada a receber obras de outros colecionadores privados, sob o título 'The House of Private Collections' ('A Casa das Coleções Privadas').

Questionado pelos jornalistas sobre o crescimento futuro da coleção, Armando Martins disse que irá continuar a investir anualmente nas aquisições de arte e manterá o seu gosto, acompanhado nas decisões pelas curadoras de Adelaide Ginga e Carolina Quintela.

Um desejo manifestado pelo empresário, presidente do Grupo Fibeira, da área imobiliária, hotelaria e serviços, é alargar a coleção a artistas de regiões do mundo menos representadas, nomeadamente de Àfrica, Oriente e América Latina.

O MACAM dispõe ainda de uma equipa de especialistas em conservação e restauro que trabalharam algumas das obras que se encontravam guardadas há décadas, contando também com uma equipa de mediadores que irá organizar a comunicação com o público escolar e a comunidade local.

Quanto a outros artistas estrangeiros, estão representados na coleção, entre outros nomes, Gilberto Zorio, John Baldessari, Albert Oehlen, Antoni Tàpies, Antonio Ballester Moreno, Juan Muñoz, Santiago Sierra, Pedro Reyes, Carlos Garaicoa, Marepe, Rosângela Rennó, Vik Muniz e Isa Genzken.

Relativamente à segurança das obras que irão ficar nos quartos do hotel - cujas dormidas irão variar entre os 300 e os 400 euros por noite - questionada pela Lusa, a diretora referiu que vão funcionar sistemas de alarme, ao mesmo tempo que os clientes "serão sensibilizados para a importância de proteger e cuidar" das peças.

O acervo será exposto com o foco no museu em Lisboa, embora disponível para decências de obras, e as exposições temporárias renovadas a cada seis meses, com rotação pontual das mostras permanentes, indicou a organização.

Quanto ao MACAM Hotel, de cinco estrelas, será dirigido por Vera Cordeiro, e inclui um restaurante e uma cafetaria.

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