A determinado momento da segunda parte, os adeptos do FC Porto manietaram engenhos pirotécnicos e aquela forma de manifestar inquietação estacionou uma nuvem de fumo em cima do relvado. O parqueamento indevido dos vestígios causou transtorno durante alguns minutos, com a invisibilidade provocada. Estava Choupana em Barcelos, dois sítios que são bastiões da irregularidade portista no campeonato que se concretiza em dois desaires consecutivos.
O efeito das tochas parou o encontro entre o Gil Vicente e o FC Porto com a cor com que José Saramago pintou a cegueira no ensaio que fez sobre a mesma. Uma apropriada alegoria para o desempenho desconchavado dos dragões, uma equipa que ia levando um ponto quando a derrota por números mais pesados – que perdida a de Tidjany Touré – do que o 3-1 lhe assentava melhor.
Indo diretamente ao minuto 89, Gonçalo Borges fez o suposto 2-2 com um remate fora de área. Mal menor para o FC Porto que nos 10 minutos de compensação poderia tentar uma reviravolta. Porém, no polo oposto, Otávio tinha derrubado Santi García. Bem que a queda do médio gilista tinha dado nas vistas, mas só mais tarde o VAR alertou para a infração do defesa azul e branco. Assim sendo, Félix Correia fez o 3-1 em Barcelos.
Nico González tinha já sido expulso por vermelho direto. A inferioridade numérica do FC Porto foi só mais um fator a desconcertar uma equipa descolada, incapaz de funcionar em bloco na transição defensiva e de, no ataque, colocar várias cabeças a pensarem o mesmo. Resumindo, um caos.
Há uma certa tendência para que seja mais fácil descobrir algo quando o espaço em que se procura está arrumado. Nem tudo tem que estar encaixotado. Se assim fosse, Félix Correia e Fujimoto não teriam desenvoltura para andarem à solta a exprimirem utilidade. Tem é sempre que existir uma ordem e uma justificação para tudo estar onde está. O Gil Vicente tinha argumentos para defender a geografia de ambos em zonas distintas do terreno. O primeiro a jogar sem portagens pelo flanco e o outro ao centro ao serviço da neurologia do galo.
A combinação entre duas correntes artísticas foi harmoniosa. Um cubista, fã das linhas retas, outro adepto da liberdade do abstracionismo. Por lapso, numa jogada em que Fujimoto reuniu as atenções do FC Porto na capacidade do seu pé esquerdo e Félix Correia desencantou uma ligação ao anterior da área, foi Pablo Felipe que assinou (méritos maiores teve ao longo da vida o seu homónimo de apelido Picasso) o golo.
O Gil Vicente estava aí para dividir o jogo como é apanágio das equipas de Bruno Pinheiro, que foi expulso ainda na primeira parte com o benefício de ir para a bancada usufruir de uma vista panorâmica e sofrer com a surdez dos jogadores face à impossibilidade de ouvirem as suas indicações.
Ao intervalo, Vítor Bruno lançou Gonçalo Borges para o lugar de Galeno. Foi uma bala de borracha aquela a que o treinador do FC Porto recorreu. Apesar do golo que o extremo concretizou ao fim de dois minutos em campo, o disparo só atordoou um pouco o Gil Vicente que se reergueu de imediato. Numa das muitas situações em que tiveram para explanar contra-ataques, os minhotos ganharam um canto que Rúben Fernandes desviou ao primeiro poste e Josué colocou na baliza ao segundo.
Se alargarmos a contagem a todas as competições, esta é a terceira derrota seguida do FC Porto. Na jornada 18, os dragões caíram para o terceiro lugar, sendo ultrapassados pelo Benfica e estão agora a quatro pontos do líder Sporting.