Não foi há muito tempo. Foi, aliás, há muito pouco tempo. O problema da baixa natalidade em Portugal estava na frente de todas as agendas. O país envelhecido, a falta de crianças, as famílias dos filhos únicos, as escolas a fechar, a sustentabilidade da segurança social em risco por causa do envelhecimento galopante da população residente. A urgência impunha-se: Portugal precisava de mais bebés.

Todos os programas eleitorais, sem exceção, com menor ou maior veemência, com maior ou menor peso, com políticas mais à esquerda ou mais à direita, apontavam medidas para resolver esta fatalidade de Portugal ser dos países mais envelhecidos do mundo.

Vieram os imigrantes e com eles mais crianças. Surgiram alguns sinais positivos. Mais mil nados-vivos, mais dois mil. Mas em 2024, a natalidade voltou a cair: nasceram 84.642 bebés em Portugal, menos 1,2% do que em 2023. Isto fez com que o índice sintético de fecundidade, o número médio de filhos por mulher em idade fértil, caísse também para 1,4.

E, apesar de a população ter aumentado, o envelhecimento demográfico “continuou a acentuar-se”. Segundo os mais recentes dados do INE, em 2024 por cada 100 jovens que viviam em Portugal havia 192 velhos. Metade da população tem mais de 47 anos. Já são quase um quarto as pessoas com 65 anos ou mais residentes em Portugal.

O problema não só persiste, como se agrava.

É por isso que só pode causar perplexidade esta decisão do Governo de retirar direitos a mães, pais, famílias e bebés e assim desincentivar a natalidade. As propostas acerca da perda de direitos nas licenças de amamentação e na possibilidade de pais de crianças até aos 12 anos poderem recusar trabalho aos fins de semana ou em horário noturno servem quem? E valem quanto? Quanto estão a perder as empresas com as mulheres que têm horário reduzido para amamentar os filhos? Quanto perdem os patrões com os três dias de luto pela perda gestacional? E quanto perdem com os trabalhadores que precisam de horário flexibilizado por causa das crianças que não podem ficar sozinhas à noite ou ao fim de semana?

É importante apresentar esta fatura. Para podermos compará-la com outra. Quanto perde um país onde nascem cada vez menos bebés? Quanto perde uma cidade sem crianças? Quantas escolas ficam por abrir? Quantos professores por contratar? Quanto material escolar deixa de ser vendido? Quanta roupa? Quantos gelados? Quanta comida? Quantas bicicletas? Quantos brinquedos? Quantos parques vão ficar silenciosos e vazios?

Sem estas crianças, adultos ficarão sem filhos que os cuidem e muitos não saberão o que é ter netos. Sem estas crianças, que se tornarão adultos, não haverá suficientes contribuições para suportar um sistema que tem de acudir aos seus velhos.

Não são, por isso, só os dados sobre quantas mulheres alegadamente abusam do direito à redução de horário para amamentar que faltam nesta discussão. O que falta nesta discussão são as contas do Governo acerca do impacto que tem na natalidade a retirada de direitos e regalias dos recém-pais, das recém-mães e já agora dos filhos. A não ser que se considere que é bom para um bebé passar oito ou mais horas por dia numa creche, ficar lá durante a noite e quem sabe aos fins de semana. A beber leite em pó num biberão, obviamente.