Os líderes dos sete povos indígenas do Panamá rejeitaram esta quarta-feira a "pretensão irresponsável" do Presidente Donald Trump, de recuperar o canal do Panamá e defenderam a soberania panamiana sobre a via fluvial.

"O Canal do Panamá, hoje e sempre, continuará a pertencer ao povo panamiano", disse o Conselho Nacional para o Desenvolvimento Integral dos Povos Indígenas (COONAPIP), composto pelos líderes dos sete povos originários e das 12 estruturas de congressos e conselhos indígenas do Panamá, numa declaração pública.

O Conselho salientou que as declarações de Trump "violam flagrantemente os Tratados Torrijos-Carter", assinados em 1977, que cristalizaram a reversão do canal e das suas áreas adjacentes para o Panamá após "uma luta geracional e apoio internacional", fazendo assim "justiça à reivindicação histórica" do país centro-americano.

O Canal do Panamá, uma passagem de 82 quilómetros através da qual passa cerca de 3% do comércio mundial, foi construído pelos Estados Unidos, que o inauguraram em 1914 e o administraram até à sua transferência para o estado panamiano em 31 de dezembro de 1999.

Este acordo foi possível graças aos Tratados Torrijos-Carter, assinados em 7 de setembro de 1977, em Washington, pelo dirigente panamiano Omar Torrijos (1929-1981) e pelo então presidente americano Jimmy Carter (1977-1981).

"Aproveitamos esta reivindicação irresponsável do Presidente dos Estados Unidos para fazer uma reivindicação responsável e justa por parte dos povos indígenas, para que os benefícios do Canal cheguem às comunidades que tanto precisam dele e para que não fique em poucas mãos", sublinharam os líderes indígenas na sua declaração pública.

O Governo e a Administração do Canal do Panamá (ACP) "devem fazer um verdadeiro esforço para que os benefícios do Canal não engrossem apenas o tesouro nacional, mas que o seu impacto económico chegue a todos os panamianos, especialmente às regiões indígenas e camponesas mais vulneráveis do interior do país", acrescentou o Conselho.

O canal é um pilar da economia do Panamá

No Panamá existem sete etnias indígenas: Emberá, Wounaan, Guna, Ngäbe, Buglé, Naso e Bri-Bri, agrupadas territorialmente em seis comarcas, Emberá-Wounaan, Guna Yala, Ngäbe-Buglé, Madugandí, Wargandí e a recente Naso.

A maioria dos indígenas, que representam 17,2 % dos 4,2 milhões de habitantes do Panamá, vive na pobreza, sobretudo os que permanecem nas comarcas.

O canal é um pilar da economia do Panamá e em dezembro passado, deu ao tesouro uma contribuição anual de 2.470,7 milhões de dólares, que serão investidos em projetos de desenvolvimento nacional, segundo o presidente panamiano José Raúl Mulino.

"Compatriotas, como presidente, quero expressar precisamente que cada metro quadrado do Canal do Panamá e suas áreas adjacentes pertencem ao Panamá e continuarão a pertencer ao Panamá. A soberania e a independência do nosso país não são negociáveis", disse Mulino a 22 de dezembro, um dia depois de Trump ter falado em recuperar o canal, uma mensagem que o presidente reiterou por insistência do presidente dos EUA.

"China opera o Canal do Panamá, e nós não o demos à China, demos ao Panamá"

No seu discurso na cerimónia de tomada de posse como 47.º Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump sublinhou que o objetivo do acordo e o espírito do tratado em relação ao Canal do Panamá "foram totalmente violados" e o seu país maltratado, prometendo assumir controlo desta infraestrutura marítima vital para o comércio global.

"Os navios americanos são severamente sobrecarregados e não são tratados de forma justa de qualquer forma, incluindo a Marinha dos Estados Unidos. E o mais importante: a China opera o Canal do Panamá, e nós não o demos à China, demos ao Panamá. E vamos tomá-lo de volta", justificou no seu discurso realizado no Capitólio, em Washington.

O político republicano tem sido um crítico declarado do acordo de 1977 do então Presidente norte-americano, Jimmy Carter, que resultou na transferência do controlo do canal para o Panamá em 1999.