
A Expo 2025 Osaka, em curso desde 13 de abril e com encerramento previsto para 13 de outubro, já ultrapassou a marca dos 15 milhões de visitantes, um recorde alcançado em meados de agosto, apenas 116 dias depois da abertura oficial. Durante o evento, houve picos diários com mais de 160 000 entradas, aquecendo as expectativas de atingir os 28 milhões de visitantes até ao final. Constituida por mais de 160 países e organizações internacionais, é considerada um dos maiores eventos à escala global. O tema central, "Designing Future Society for Our Lives" (Conceber a Sociedade do Futuro para as Nossas Vidas, em tradução livre) distribui-se por três grandes zonas: "Saving Lives" (Salvar Vidas), "Empowering Lives" (Capacitar Vidas) e "Connecting Lives" (Ligar Vidas).
É precisamente na zona "Empowering Lives" que Portugal ergue o seu Pavilhão Nacional, com 1 800 m² de área, projetado pelo arquiteto japonês Kengo Kuma. A estrutura, inspirada na relação histórica e cultural entre Portugal e o Japão, é construída com cordas recicladas e materiais sustentáveis, simbolizando o oceano como elemento unificador. O investimento total ronda os 21 milhões de euros, significativamente inferior quando comparado com outros países, mas com ambições de impacto à mesma escala.
Sob o mote “Oceano, Diálogo Azul”, o pavilhão combina exposições imersivas, experiências interativas, gastronomia, artesanato e uma intensa programação cultural e científica. Até agosto de 2025, já tinha recebido 1,2 milhões de visitantes, cerca de 8% do total de entradas da Expo — superando em dois meses a meta inicial de 1 milhão para todo o evento.
Nesta entrevista, a comissária portuguesa, Joana Gomes Cardoso, partilha o percurso, as decisões e as histórias que fazem deste pavilhão muito mais do que uma montra de Portugal: uma plataforma para criar parcerias económicas, culturais e científicas que perdurem muito para além do encerramento da Expo.
"Não são apenas os números que contam, mas eles são um excelente indicador e, neste caso, mostram que superámos muito as nossas expectativas."
A Joana já passou por muitos cargos e, ao longo do seu percurso profissional, esteve sempre muito ligada ao serviço público e à cultura. Agora enfrenta um novo desafio, de grande escala e com muita visibilidade. O que é que este projeto acrescenta à sua carreira?
Faço este trabalho de forma voluntária, pro bono. Não recebo salário, mas é um privilégio estar à frente da participação de Portugal, ainda por cima num país especial para mim, uma vez que vivi cá dos 14 aos 16 anos. Voltar, agora com outra idade e outra experiência, tem sido intenso, forte e muito gratificante. Sinto mesmo que estamos a fazer a diferença.
Portugal costuma promover-se no Japão sobretudo através do seu passado riquíssimo, de quase cinco séculos. Mas percebi que faltava mostrar uma visão mais atual e contemporânea. Quando cheguei, vi que os nossos indicadores não eram muito expressivos — poucos turistas, poucos estudantes japoneses — e isso tornou este desafio ainda mais motivador.
Se tivesse de dizer qual é a minha marca neste projeto, diria que é a sensibilidade para compreender tanto o nosso país como o Japão, e a vontade de atualizar o nosso posicionamento aqui. Muitas vezes pensa-se no Japão apenas pela tecnologia, mas artes e ofícios manuais são muito apreciados e foi uma aposta que resultou muito bem, a par da dimensão cultural.
O meu maior desejo é que isto não se esgote nos seis meses da Expo. Com a AICEP, estamos a trabalhar para deixar algo que dure. Como ouvi dizer o embaixador de Portugal no Japão, de forma muito acertada, “o verdadeiro trabalho começa no dia 14 de outubro, no dia seguinte ao encerramento da Expo”. O que fazemos agora deve, idealmente, ter continuidade muito para além dessa data.
O objetivo inicial para os seis meses da Expo era atingir 1 milhão de visitantes. No entanto, até agosto, o Pavilhão de Portugal já recebeu 1,2 milhões, representando cerca de 8% do total da exposição, que soma aproximadamente 15 milhões de entradas. A que atribui este resultado tão acima das expectativas? E que fatores considera determinantes para atrair tantos visitantes?
Antes de mais, diria que não são apenas os números que contam, mas eles são um excelente indicador e, neste caso, mostram que superámos muito as nossas expectativas. Acho que este resultado se deve a vários fatores: acertámos no tema — Portugal ligado ao oceano de uma forma contemporânea — que tem um eco muito grande aqui no Japão, um arquipélago com uma ligação fortíssima ao mar. Além disso, há um efeito muito forte de “boca a boca” e redes sociais. Há pavilhões que estão a perder público, mas o nosso tem crescido, e isso é um sinal claro do interesse gerado.
Quando atingimos o visitante “1 milhão”, fizemos um pequeno ritual com ele, um jovem japonês que, curiosamente, não conhecia o Cristiano Ronaldo, porque era mais fã de ténis. Depois de lhe contarmos quem era, acredito que ganhámos mais um apoiante para Portugal.
Claro que o público não é exclusivamente japonês, mas a maioria é, e por isso falo muito desse segmento. Esta experiência tem sido gratificante e, ao mesmo tempo, cansativa, no bom sentido. Trabalhamos praticamente todos os dias e há sempre visitas. Recentemente, recebemos António Costa, atual presidente do Conselho Europeu e ex-primeiro-ministro de Portugal.
Nem todos os dias temos visitas desta relevância, mas todos os dias recebemos pessoas que nos motivam, incluindo muitos portugueses anónimos que passam por aqui. É uma Expo com muita gente, e, do ponto de vista emocional, também muito intensa. No melhor sentido possível.

"Com o tema do oceano conseguimos passar várias mensagens, mas sobretudo uma que é universal: não haverá sociedades do futuro sem um oceano saudável."
O tema do pavilhão português é “Oceano, Diálogo Azul”, um título poético, mas também político e ambiental. Porquê esta escolha? Que mar é este que queremos que o mundo veja?
Este era um tema já definido pela AICEP quando cheguei como comissária, mas que acolhi muito bem, porque, se há um país que tem uma relação muito forte com o mar, e onde essa relação é também marcada por desafios sérios, como os tsunamis, é o Japão. Não é uma relação lúdica de praia, é mesmo uma ligação profunda e muito responsável.
A ideia do diálogo, portanto, do azul, está ligada não só ao mar, mas também à economia azul e a todas as inovações que existem nessa área. A ideia de diálogo encaixa também na vocação que Portugal tem de criar, muitas vezes, pontes entre culturas.
Atualmente já não se fala tanto em oceanos, no plural como aprendemos na escola, mas no oceano, no singular, porque é um só e é universal. Eu costumo dizer que com este tema tocamos em três pontos essenciais. A nossa história marítima com o Japão, que tem quase 500 anos e não é brincadeira; a Expo 98, que lançou o tema do oceano na agenda pública de forma visionária; e finalmente a resposta à pergunta que esta Expo nos coloca, que é como se desenham as sociedades do futuro para as nossas vidas.
E que mensagem é que o tema do pavilhão passa para os visitantes?
Com o tema do oceano conseguimos passar várias mensagens, mas sobretudo uma que é universal: não haverá sociedades do futuro sem um oceano saudável. É um tema que ultrapassa fronteiras, países e nações, e até mesmo os países sem mar têm interesse em que o oceano esteja protegido e saudável. Isto tem-nos permitido tocar várias culturas e países, e um sinal muito bom dessa adesão é o interesse que temos sentido aqui no pavilhão. Por exemplo, recentemente, houve um concerto do Júlio Resende onde estiveram presentes comissários de outros países como o Comissário das Nações Unidas para o Oceano, a Comissária de Espanha e o Comissário Norte-Americano. É um pavilhão que tem despertado um interesse real e diário, pois recebemos cerca de 100 visitantes convidados por outras delegações, o que mostra a universalidade e a relevância da nossa mensagem, que felizmente toca muitos países.
Temas como inteligência artificial, alterações climáticas ou mobilidade sustentável são centrais na Expo. Como é que Portugal está a contribuir para essa conversa?
São, sem dúvida. Por exemplo, a Alemanha tem um pavilhão dedicado à economia circular, por isso esses temas estão muito presentes. No outro dia estive no pavilhão do futuro, que é um pavilhão temático japonês, e é interessante porque não se limita apenas à tecnologia. Também visitei um pavilhão da saúde que faz uma espécie de medição individual de cada visitante e projeta como vamos ser em 2050.
Da nossa parte, por exemplo, tivemos a participação da Universidade de Coimbra, que esteve cá recentemente e estreou um produto novo: uma visita à Universidade através de óculos de realidade virtual. É uma experiência que eles desenvolveram e apresentaram cá em Osaka. De igual forma, a Fundação Oceano Azul também está a utilizar óculos de realidade virtual, permitindo uma visita muito realista ao oceano aéreo de Lisboa, lá está, a conexão com a Expo 98.
Portanto, sem dúvida, estamos a apostar nessa visão de futuro, seja através da tecnologia, seja através das ideias e do diálogo. Num debate recente que contou com o embaixador das Nações Unidas para os oceanos, o foco foi precisamente o futuro do planeta. Por isso, quando falamos em desenhar as cidades do futuro, acho que Portugal, com este tema e com a participação de várias entidades que têm vindo e ainda virão, tem dado um contributo muito importante.

E Portugal é muito conhecido pelo fado, bacalhau, pastel de nata ... mas é muito mais do que isso. Que outras narrativas menos óbvias estão a ser contadas no pavilhão?
Isso é muito interessante. Acho que conseguimos um equilíbrio entre aquilo que as pessoas já conhecem e gostam e outras abordagens menos óbvias. O pastel de nata é uma loucura, um sucesso total. Ele esgota às 11 da manhã e depois nunca se sabe a que horas volta a estar disponível. Já há até um “Nata Challenge” nas redes sociais japonesas, juro que é verdade! Às nove e meia da manhã, já temos fila no nosso takeaway.
Por outro lado, tivemos Fado, que é muito apreciado no Japão, com nomes como Ana Moura, Camané, Carminho, e quisemos trazer outras perspetivas culturais também.
Mais géneros para além do Fado?
Sim! Tivemos o Dino D’Santiago, que foi, sem dúvida, o maior sucesso aqui na Expo. Ele é pouco conhecido no Japão, ao contrário de outros músicos portugueses, mas gerou um interesse enorme. Quase me atrevo a dizer que isto mudou um bocadinho a carreira dele. Pelo menos, ele disse-me que agora vai começar a pensar em dedicar-se mais à Ásia, pois foi entrevistado por vários jornalistas e recebeu contactos de produtores. Esse entusiasmo é muito gratificante porque vemos transformações a acontecer, às vezes que idealizámos, outras que nem imaginámos.
Também tivemos o Bruno Pernadas, já conhecido no Japão, que depois seguiu para Tóquio, onde deu outro concerto. Trabalhámos muito bem com a embaixada para criar essas pontes: quem cá vem, geralmente, também vai a Tóquio, e conseguimos fazer esse pleno cultural. Tivemos ainda o Júlio Resende e o António Pinho Vargas, que proporcionaram momentos maravilhosos aqui na Expo. Através do jazz e de outros estilos musicais, estamos a mostrar outras facetas do país que, por vezes, surpreendem o público japonês, que tem respondido com muita recetividade.

E também têm um restaurante…
Sim, e no restaurante temos tudo o que se possa imaginar: desde os peixinhos da horta e o pastel de nata, até outros pratos típicos portugueses. Pela programação e pelas entidades que trazemos, por exemplo, tivemos a região de Viseu de Lafões, que trouxe barro negro de Molelos — algo tão tradicional que deixou os japoneses incrédulos, porque pensavam que só existia o equivalente deles. Não faziam ideia de que outro país, Portugal, tinha essa tradição. Às vezes, através do tradicional, conseguimos mesmo despertar interesse e criar pontes.
Temos uma programação intensa, quase de três em três dias, e às vezes já não me lembro de tudo. Um bom exemplo foi a exposição inédita de Design Gráfico Português desde o 25 de Abril. Houve um museu japonês que gostou tanto que está agora a manter o espólio dessa exposição e pode até ficar com ele.
Portanto, coisas que fogem um pouco ao mais evidente têm funcionado muito bem, talvez também porque o público japonês é muito curioso e generoso. É um público que vem à Expo com muita vontade de descobrir países e de interagir, e é só abrirmos as portas e oferecer algo. A Rosa Pomar, responsável por reviver as lãs e o tricô tradicionais em Portugal, esteve cá e foi uma loucura: deu aulas a muitas pessoas que saíram de cá super entusiasmadas. Vai desde a realidade virtual até ao mais manual e artesanal, e devo dizer que tudo gera o mesmo tipo de entusiasmo, pelo menos pelo que eu tenho visto.
"Não fiquei indiferente à ausência de um arquiteto português. Assim que soube, ainda antes de a decisão ser pública, percebi que seria fundamental apostar também na promoção da nossa arquitetura."
Um dos elementos mais marcantes do pavilhão é a sua arquitetura, assinada por Kengo Kuma. Como é que nasceu este diálogo entre o arquiteto e a identidade que Portugal queria projetar?
É muito curioso porque ele [o pavilhão] parece estar vivo: com a luz do dia as cores vão mudando, há uma grande transparência e isso surpreende sempre as pessoas. Embora não seja assim tão grande — há pavilhões bem maiores —, as cordas dão-lhe um volume impressionante. Chegados a esta parte da Expo, não há dúvida: goste-se ou não, ele destaca-se. E à noite, para mim, fica mágico.
O mais surpreendente é que, ao vivo, ele é ainda mais bonito do que nas imagens virtuais. É leve, parece que respira. E tem sido muito interessante perceber como é intuitivo para os japoneses. Chegámos a pensar em colocar uma placa a explicar, mas não foi preciso: eles aproximam-se, tocam nas cordas e dizem “fune”, que significa barco. Talvez noutro país não funcionasse assim, mas aqui a ligação é imediata.
O arquiteto Kengo Kuma trabalhou com uma equipa que inclui portugueses, como a Rita Topa, senior partner e nosso contacto direto, que já colaborou com instituições como a Gulbenkian. E acho que essa ponte cultural se sente no resultado final.
Temos também um terraço muito bonito, que se abre para uma praça e permite concertos ao ar livre. E tivemos a sorte de encontrar um músico residente: um japonês de Osaka, que passou pelo Museu do Fado em Lisboa, aprendeu guitarra portuguesa e agora, de quarta a domingo, dá três concertos por dia. O contraste entre aquela guitarra tradicional, que em qualquer lugar do mundo remete para Portugal, e a arquitetura contemporânea do pavilhão é belíssimo.

A escolha de um arquiteto japonês para assinar o pavilhão gerou críticas, nomeadamente da Ordem dos Arquitetos, pela ausência de um nome português no projeto. Como é que reage a essas críticas e que leitura faz dessa polémica?
Acho legítimo discutir se deve ou não haver concurso. Mas, a partir do momento em que se opta por um concurso e não por um convite direto, temos de seguir as regras: num concurso público internacional não se pode nem se deve discriminar pela nacionalidade. Há países que preferem convidar diretamente e essa é uma discussão válida. Nesse caso, convida-se quem se entender e deixo a nota de que seria interessante que, um dia, esse convite recaísse sobre uma arquiteta mulher, porque nunca aconteceu.
Posto isto, devo dizer que considero este projeto magnífico. Portugal ganha muito com ele. Houve uma sensibilidade enorme por parte do arquiteto e da sua equipa, e o resultado dificilmente poderia ser melhor. Mas não fiquei indiferente à ausência de um arquiteto português. Assim que soube, ainda antes de a decisão ser pública, percebi que seria fundamental apostar também na promoção da nossa arquitetura.
Posso até arriscar dizer que esta é a Expo onde mais se tem feito por divulgá-la. No Dia Nacional, abrimos com uma exposição dedicada a Siza Vieira. Já passaram por aqui nomes como Manuel Aires Mateus, Ricardo Bak Gordon, Inês Lobo e Ricardo Carvalho. Em breve, vamos apresentar, com curadoria de Andreia Garcia que já representou Portugal na Bienal de Arquitetura de Veneza, uma exposição com 23 ateliers de jovens arquitetos portugueses.
Este esforço não é uma resposta às críticas, que considero legítimas, mas sim uma forma de aproveitar o contexto. Ter Kengo Kuma pode até abrir portas para que arquitetos portugueses entrem no Japão por esta via. Temos procurado trabalhar com isso, e não contra isso. Vários dos nossos arquitetos fizeram conferências em universidades, tanto em Osaka como em Tóquio. Vejo, ironicamente até, esta situação como uma oportunidade para apresentar a arquitetura portuguesa no Japão.
Este é um projeto que junta mais de 150 entidades públicas e privadas. Como é que se articula tanta gente, tantos interesses, sem perder o foco ou diluir a visão?
Outra boa pergunta. Eu diria que o foco não se perde, porque quando uma entidade está cá, nós estamos inteiramente dedicados a ela. Por exemplo, em breve teremos cá a Universidade Nova com todo o seu programa, e já vêm com contactos estabelecidos com universidades japonesas. Trazem estudantes e professores, e nós acompanhamos de perto.
Claro que há experiências mais bem-sucedidas do que outras. Honestamente, não creio que nenhuma tenha corrido mal, mas há imprevistos. Por exemplo, a Universidade de Coimbra — salvo erro — teve parte do material retido na alfândega e só o conseguiu receber no último dia. Isso acontece: o Japão é longe, tudo é caro, as distâncias são enormes e, por vezes, a logística complica-se. Penso muitas vezes que a Expo de Sevilha deve ter sido mais fácil porque estava ali ao lado, não havia este tipo de constrangimentos. Aqui, tudo é um desafio.
É por isso que digo que é muito intenso. Mas quando as entidades estão presentes, estamos totalmente focados nelas. Fizemos, desde o início, um esforço para incentivá-las a criar ligações prévias, porque o público típico da Expo quer, naturalmente, ver pavilhões e não, por exemplo, assistir a um seminário sobre o mar. Ainda assim, conseguimos atrair pessoas muito interessantes, como já aconteceu, por exemplo, com a Fundação Oceano Azul que, em parceria com uma instituição japonesa, reuniu especialistas de referência para um debate.
Este tipo de programação mais académica ou empresarial exige sempre trabalho de bastidores e algum esforço extra. Mas é isso que garante resultados reais e evita que estejamos apenas a “cumprir calendário”.
"No fundo, o pavilhão é uma plataforma. Isto não é nosso, é dos portugueses, é pago pelos contribuintes."
A Expo é uma montra, mas também uma plataforma de contactos, investimentos e colaborações futuras. Portugal investiu cerca de 21 milhões de euros nesta participação. Qual é a estratégia para garantir retorno, não só em notoriedade, mas também em parcerias económicas, científicas ou culturais?
O nosso investimento é significativo, claro, mas se olharmos para outros países… Espanha gastou 55 milhões, França 85 milhões e a Arábia Saudita chegou aos 444 milhões. Portanto, sim, é expressivo, mas está longe de ser dos orçamentos mais altos. E, apesar disso, acho que estamos a conseguir fazer muito com um valor que, para este tipo de evento, não é dos mais elevados.
A nossa preocupação é que a Expo não acabe no dia 13 de outubro. Queremos que deixe vida, que crie parcerias duradouras. E aí tem sido fundamental o trabalho que a AICEP faz em Tóquio. Muitas vezes, quando trazemos empresas portuguesas, organizamos também, ou a AICEP organiza, seminários económicos em Tóquio, que nos permitem chegar a outro tipo de público.
Entre essas ações complementares e a articulação com a Embaixada, já temos resultados concretos. Há empresas que fecharam negócios aqui, outras que disseram que andavam há cinco anos a tentar falar com parceiros japoneses e que só conseguiram desbloquear contactos depois de estarem na Expo. Fazemos sempre questão de receber muito bem quem vem, porque isso impressiona os parceiros locais e cria oportunidades.
No fundo, o pavilhão é uma plataforma. Isto não é nosso, é dos portugueses, é pago pelos contribuintes. Por isso, trabalhamos com cada entidade com mais de um ano de antecedência, perguntando: “O que precisam? O que querem? Quem gostariam de convidar?”. Muitas ficam surpreendidas ao perceber que podem trazer os seus próprios convidados. Mas a ideia é essa: não virem falar para nós, mas para o público japonês e internacional.
É claro que estes resultados não são imediatos, levam tempo. Mas é muito gratificante ver coisas a acontecerem. A Universidade Nova, por exemplo, vai assinar agora dois protocolos. Isso dá-me esperança e otimismo de que esta participação não se esgote nestes seis meses.
A Joana falou publicamente da intenção de avaliar o impacto com base em indicadores económicos, culturais e educacionais. Pode dar exemplos concretos? Esses dados serão públicos?
Sim, esses indicadores já existiam. Foram levantados pela AICEP antes de eu chegar e incluem vários dados como o número de estudantes, de visitantes, entre outros. Não fui eu que fiz esse levantamento, portanto não sou a melhor pessoa para explicar em detalhe, mas a ideia é que, logo após a Expo e talvez um ou dois anos depois, possamos olhar para eles e perceber se houve evolução. E queremos que isso seja público. Temos essa obrigação de transparência e de explicar, de forma honesta, o que andamos aqui a fazer. Não vamos dizer que tudo correu bem, porque não é verdade, há áreas mais difíceis do que outras.
Por exemplo, ficaria muito satisfeita se conseguíssemos captar mais estudantes japoneses para Portugal. Hoje são muito poucos. Há várias razões para isso: o público japonês não é necessariamente aventureiro e, de facto, uma percentagem reduzida tem passaporte. Isso também explica o interesse e a curiosidade com que nos visitam na Expo: chegam muito recetivos e com vontade de descobrir o país.
Às vezes vemos esse impacto no imediato, mesmo que seja simbólico. Recentemente, por exemplo, veio uma escola com miúdos de uns 11 anos, que se levantaram às quatro da manhã para estarem aqui. No fim perguntei: “Então, quantos de vocês querem ir a Portugal?”. Todos levantaram o braço. Sei que não irão todos, mas acredito que experiências como esta deixam pequenas sementes. Pode ser que, no futuro, alguns desses jovens venham a estudar, viajar ou trabalhar connosco. Pelo que vejo diariamente na interação com o público, acredito mesmo que estamos a gerar interesse e recetividade e, se me enganar, cá estarei para assumir.
Portugal é conhecido por fazer muito com pouco e já referiu aqui as diferenças orçamentais entre países para a construção dos seus pavilhões. Nesta Expo, que reúne mais de 160 países, como é que Portugal se posiciona neste palco global tão competitivo?
Ainda antes de se conhecer o projeto, a organização atribuiu-nos um lugar de destaque, mesmo à frente de uma das praças principais e mesmo junto a uma das quatro escadas rolantes que dão acesso ao “Grande Anel”, a obra central da Expo. É uma localização que nem a Arábia Saudita ou outros países têm, e que acredito resultar da nossa relação histórica com o Japão, de muitos anos de respeito e proximidade.
Depois, o facto de termos um pavilhão desenhado por Kengo Kuma é, por si só, prestigiante. Tive oportunidade de interagir com ele aqui no pavilhão e fiquei impressionada com a adoração que desperta. Pedem-lhe autógrafos e selfies, algo que nunca tinha visto com arquitetos em Portugal. No nosso Dia Nacional, quando o convidámos a integrar a delegação, as autoridades japonesas ficaram surpreendidas e encantadas.
Claro que também há o fator humano. Os portugueses têm essa capacidade de criar ligações rápidas e de ajudar. Um exemplo: a Colômbia, que é nossa vizinha, teve a impressora avariada no Dia Nacional deles. Vieram para o nosso gabinete, fizeram tudo a partir daqui, e no dia seguinte enviaram-nos flores para agradecer.
Há também o grupo dos países da União Europeia, criado para trabalharmos juntos em questões logísticas e estratégicas. Pedir algo em bloco dá-nos muito mais força do que agir isoladamente. E, claro, há momentos de reconhecimento que ficam na memória: nomeadamente quando o comissário espanhol me disse que o concerto do Júlio Resende no nosso pavilhão foi talvez o melhor que viu até hoje na Expo. Isso vale muito.
"O que mais me satisfaz é sentir que despertámos uma descoberta em alguém, que uma pessoa conheceu algo novo graças à nossa presença aqui. Isso deixa-me profundamente feliz e, para mim, é a essência da nossa missão."
No fim, o que fica é a experiência humana e a forma como cada visitante sente Portugal naquele espaço. O que vê, o que sente, o que leva consigo alguém que visita o pavilhão?
Temos filas logo de manhã, mas o nosso pavilhão é de “free flow”: o visitante pode entrar, percorrer o espaço ao seu ritmo e ficar o tempo que quiser. Isso ajuda a reduzir muito o tempo de espera, enquanto noutros pavilhões a fila pode durar mais de uma hora, no nosso varia entre 20 e 40 minutos. E cumprimos o que prometemos: muitas pessoas regressam no fim a dizer “afinal era mesmo aquele tempo”.
Enquanto esperam, os visitantes são recebidos por uma instalação sonora do compositor Diogo Alvim, dedicada à água e à guitarra portuguesa, que cria um ambiente mais calmo e prepara para a visita.
A primeira sala simula um mergulho no fundo do mar, com cinco “ilhas” interativas. Duas delas exploram a nossa história marítima com o Japão, a cartografia e os biombos Namban, e uma outra, muito popular, mostra as palavras portuguesas que se tornaram correntes no japonês, como “pão”, “botão” ou “copo”. É um momento de surpresa tanto para japoneses como para portugueses, que muitas vezes desconhecem esta herança linguística ainda viva.
As outras ilhas apresentam informação atual sobre a proteção marítima portuguesa: a nossa Zona Económica Exclusiva, as áreas protegidas na Madeira, Açores e Algarve, e também projetos de monitorização oceânica, cabos submarinos ou energia eólica.
Depois, na segunda sala, totalmente imersiva, passam dois vídeos. O primeiro, da Fundação Oceano Azul, é narrado pelo próprio mar, com imagens e banda sonora tão impactantes que, quase todos os dias, alguém sai com lágrimas nos olhos, agradecendo por transmitirmos esta mensagem. O segundo vídeo, feito em parceria com várias entidades, é mais abrangente: apresenta as paisagens e características de Portugal para dar uma visão global do país.
A visita continua pelo restaurante e pela loja, que neste momento está meio vazia porque as vendas têm sido tão boas que ainda não conseguimos repor todo o stock, e termina num terraço muito bonito, onde realizamos desde concertos intimistas para convidados até atuações abertas para a rua.
O que a comove mais: o orgulho dos portugueses que visitam o pavilhão ou o espanto dos estrangeiros que descobrem o país pela primeira vez?
É um pouco dos dois. O que mais me satisfaz é sentir que despertámos uma descoberta em alguém, que uma pessoa conheceu algo novo graças à nossa presença aqui. Isso deixa-me profundamente feliz e, para mim, é a essência da nossa missão.
Também é especial receber público português, que é, sem dúvida, o mais exigente. Já tivemos até comentários sobre a qualidade do café! É normal — em qualquer país, o público local tende a ser mais crítico. Muitas vezes, os portugueses começam por apontar algo que acham que poderia ter sido diferente, mas quando pergunto se, no geral, não gostaram, quase sempre respondem: “Não, adorei, senti imenso orgulho.” Essa palavra, "orgulho", é algo que ouvimos muito, e que, naturalmente, também me deixa orgulhosa.
Embora o pavilhão tenha sido pensado sobretudo para um público japonês e internacional, é muito gratificante ver que os portugueses que nos visitam se reconhecem no que apresentamos e ficam satisfeitos. Alguns visitantes habituados a ir a expos disseram mesmo que este é um dos pavilhões portugueses mais bem conseguidos que já viram, e isso, claro, deixa-nos muito contentes.
"Eu não vejo o dia de encerramento como um fim, mas como o início de uma nova etapa."
Houve alguma reação que a tenha marcado particularmente?
Lembro-me, por exemplo, de uma senhora alemã que, ao entrar na sala dedicada ao oceano, desatou a chorar. Agradecia-nos repetidamente, dizia “obrigada, obrigada”. Explicou que muitos pavilhões na Expo são mais generalistas, focados no país em si, enquanto o nosso tem um tema central e forte: o mar. E isso, lá está, é universal. Disse até que tinha pena que a Alemanha não tivesse feito algo semelhante. Fiquei muito comovida.
Também me marcam muito os miúdos que aparecem por cá. Vejo-os entusiasmados, fazem perguntas curiosas e, sobretudo, percebo que deixamos de ser, para eles, apenas “o país do século XVI” que aprenderam na escola. Passamos a ser um lugar que conseguem imaginar visitar, seja para férias ou para estudar.
Houve também episódios muito especiais. Um senhor de 87 anos, por exemplo, trouxe um pin de Portugal da Expo Osaka de 1970, que tinha guardado durante décadas, e ofereceu-mo. Arrepiei-me. Outro caso foi de uma senhora que nos contou, emocionada, que tinha sido bailarina do Ballet Gulbenkian e dançado no pavilhão português dessa mesma Expo, nos anos 70.
E depois, claro, os momentos musicais que geraram grandes emoções: a atuação de Dino D’Santiago, que começou no terraço, mas acabou na rua, a atrair gente de todo o lado, especialmente de países da CPLP. O concerto de Júlio Resende, que foi lindíssimo. E a Carminho, que surpreendeu todos ao terminar o espetáculo cantando, em japonês, uma canção muito conhecida no país. Vi várias pessoas com lágrimas nos olhos. Não é que eu queira pôr toda a gente a chorar, mas gosto de pensar que estamos a mostrar um lado de Portugal capaz de gerar simpatia, curiosidade e, espero, frutos muito positivos para o futuro.

Quando tudo terminar, o que seria, para si, a prova de que esta missão valeu mesmo a pena?
Eu não vejo o dia de encerramento como um fim, mas como o início de uma nova etapa. Nesse momento teremos os indicadores concretos: números de visitantes, parcerias estabelecidas, resultados objetivos que estamos a contabilizar e registar ao longo destes meses.
Mas para mim, além dos números, vão ficar as histórias, as memórias, as experiências vividas aqui. Pessoas que descobrem Portugal de uma forma inesperada e que, acredito, não se vão esquecer. Lembro, por exemplo, da região de Viseu Dão Lafões, que serviu 250 refeições em malgas de barro negro. Tenho a certeza de que cada uma dessas pessoas levará consigo uma recordação marcante de Portugal.
No dia 13 de outubro, ficaremos felizes se continuarmos a sentir este interesse e entusiasmo que temos agora, tanto do público como das entidades que acolhemos. É muito gratificante perceber que, apesar dos desafios logísticos e momentos de tensão — montagens que se prolongam noite dentro, materiais que não chegam a tempo —, o feedback tem sido extremamente positivo.
Queríamos que este fosse um pavilhão de todos os portugueses, aberto à ciência, à economia, à cultura, e sem distinções. E sentimos que as entidades que aqui participam ficam tão entusiasmadas quanto nós. Muitas ficam surpreendidas com a reação do público.
Dou dois exemplos: a Cork Ribas, uma empresa familiar de cortiça, trouxe tanto material que não cabia na sala e decidiu colocá-lo no exterior. A partir daí, as pessoas passaram o dia inteiro a tocar, brincar, tirar fotografias e interagir com a cortiça, algo que os representantes da empresa nunca tinham visto. Outro caso foi o da CIM Douro, que trouxe 10 mil exemplares do seu “Passaporte D’Ouro”, com informação turística e cultural da região. Em Portugal, dizem que levam dois anos a distribuir a mesma quantidade. Aqui, esgotou em apenas um dia e meio. É claro que isso não significa que todos os visitantes vão viajar até lá, mas mostra bem o interesse e a recetividade que temos encontrado — e isso deixa-nos muito felizes.