
Sejamos claros, Portugal – e o seu sistema de Ensino Superior – não está capacitado para um aumento das propinas.
Os problemas do Superior português são múltiplos. Desde a crise do alojamento, passando pelo custo de vida e a insuficiência do nosso sistema de ação social, vivemos, hoje, uma verdadeira crise sistémica. Ora, dito isto, a manifestação da intenção, do Sr. Ministro da Educação, Fernando Alexandre, de descongelar as propinas já no ano letivo 2026/2027 é, para dizer o mínimo, injustificada.
Sob o pretexto de que “Diminuir as propinas favorece mais os alunos com rendimentos mais elevados”, o Ministro aparenta esquecer-se da realidade da grande maioria dos estudantes portugueses. Portugal é o 2º país da União Europeia em que as contribuições familiares mais peso têm no orçamento do estudante. Além disso, segundo o próprio estudo apresentado pelo governo, uma restrição dos critérios académicos para atribuição de bolsa levaria a um aumento de 15% no número de estudantes que não conseguem concluir o curso.
Temos, isso sim, estudantes que se veem, do início ao fim do seu percurso académico, colocados perante situações de tremenda fragilidade financeira devido ao baixíssimo rendimento que têm disponível. Se é verdade que muito tem sido feito para aumentar o número de residências públicas disponíveis, também é verdade que só 13% das camas previstas no PNAES estão prontas. Se é verdade que o valor nominal das bolsas tem aumentado, também é verdade que o seu valor real tem diminuído, face à progressiva inflação. Se é verdade que o Ensino Superior está hoje mais democratizado, também é verdade que apenas 20% dos alunos do Ensino Superior têm pais licenciados.
Como podemos, então, justificar que num país onde um estudante deslocado, num grande centro urbano, gasta em média 500 euros por mês, se adicione mais um encargo sobre este mesmo estudante? Que análise interpretativa de um estudo que diz que as bolsas ainda são um decisor de sucesso académico pode sustentar esta opção? A que destino estamos a condenar o elevador social do Ensino Superior, quando numa altura em que sabemos que de um ano para o outro, houve menos 6% de alunos carenciados a candidatarem-se ao Ensino Superior? Caminhamos, perigosamente, para uma elitização do ensino, onde quem pode pagar, no imediato, avança; e quem não pode, estagna.
O Financiamento do Ensino Superior é já, ele próprio, resultado de um sistema progressivo – o fiscal. Fosse intenção do governo reformular o sistema de ensino superior, essa reforma nunca teria de passar pela imposição de novos encargos aos seus estudantes. Aliás, hoje importa, mais do que nunca, perceber quais são as prioridades e intenções do governo. Resolverão os problemas estruturais que se colocam perante nós, aumentando a disponibilidade de residências publicas, ajustando o valor das bolsas ao custo real do Ensino Superior e criando mecanismos que apoiem todos aqueles que o precisarem, ou encetarão uma fuga para a frente que não serve nem os estudantes, nem o país?
A resolução destas questões seria um serviço ao país. Teríamos, finalmente, um Ensino Superior que se afirmaria enquanto investimento e, ao mesmo tempo, instrumento económico ao serviço da nação.
Os estudantes nunca foram, não são e nunca serão apenas números. Somos quem escreve o amanhã, quem constrói as fundações deste país. Não permitiremos que Portugal ignore o seu futuro nem que desperdice o talento de quem dele depende.