Cada vez que visito um mercado tradicional, lembro-me que deve haver pessoas que acham que a rúcula nasce dentro de pacotes de celofane, que os limões saem da terra envernizados e que se esfregam nas maçãs para com elas partilhar esse verniz.

Essas pessoas nunca provaram uma folha de rúcula fresca na banca de legumes de um mercado e não fazem ideia do que estão a perder. Não fazem ideia do aroma que se desprende de um molho de beldroegas, das autênticas e não de estufa. Não sabem o que é a lascívia deixada na boca pelas maçãs riscadinhas de Palmela, acabadas de colher nesta altura do ano.

Há uma geração que olha para o que consome no dia-a-dia como tudo sendo naturalmente empacotado e acondicionado. Olhem a fruta — cansada de viagens transatlânticas que baralham as estações, exausta de tanto tempo em câmaras frigoríficas, arrancada às árvores ainda longe de estar boa para consumo, esse ponto ideal de amadurecimento que exalta o sabor e que raramente se consegue na banca de um supermercado.

Uma visita a um mercado tradicional é uma lufada de ar fresco que nos faz lembrar aromas e sabores entretanto esquecidos. É uma aprendizagem com talhantes experientes que sabem como cortar a carne de forma a enaltecer o seu paladar, é uma descoberta de conselhos  para melhor confecionar o  que sai do mar com peixeiras que sabem amanhar o peixe. E pode ser também a descoberta de um tesouro, como estes alhos bem portugueses, hoje em dia cada vez mais raros, ausentes dos supermercados mas bem presentes nos mercados, viçosos, de cor esplêndida, em vez dos raquíticos exemplares, importados de tão longe como a China, e que cá arribam sem sabor, incapazes de desempenhar o seu papel de dar aroma e sabor ao que se cozinha.

Estratégias de comunicação// Manuel Falcão escreve sempre à sexta-feira, no SAPO