Historicamente, um conjunto de normas sociais e restrições legais afastaram as mulheres da gestão e dos negócios. De facto, mesmo em países tidos como civilizacionalmente mais avançados, estas eram remetidas para papéis domésticos ou empregos de menor prestígio social. Por esses dias, corria a ideia de que as mulheres não tinham um perfil adequado para assumir posições de liderança já que, genericamente, padeciam de questionáveis capacidades de decisão e fraca resiliência emocional. Assim, até ao início do século XX, o mundo das empresas foi totalmente dominado por homens.

O advento das guerras mundiais mudou, para sempre, este statu quo nos países ocidentais. De facto, tais flagelos mobilizaram milhões de homens para os campos de batalha, o que permitiu que as mulheres acedessem a novos empregos. Os ganhos da causa feminina aceleraram nos anos 60 e 70 do século passado, período durante o qual se desafiou abertamente as diferenças no mundo laboral e se exigiu oportunidades iguais para homens e mulheres em todos os domínios da economia. Neste capítulo, é de destacar a transformação que ocorreu nos Estados Unidos, país que durante esses anos aprovou legislação federal que passou a proibir a discriminação de género na contratação e nos salários. Tais ideias chegaram rapidamente à Europa e a outras partes do mundo, o que alterou o cenário para as mulheres, abrindo-lhes definitivamente as portas do mundo dos negócios.

A sociedade parece ter ficado a ganhar com esta transformação já que são vários os estudos académicos que sugerem que as mulheres acrescentam valor à gestão das empresas. Em particular, é fácil de encontrar referências que enfatizam o benefício de ter a sua perspetiva no processo de tomada de decisão. São também vários os trabalhos que mostram que as mulheres tendem a adotar estilos de liderança colaborativos, os quais são particularmente adequados para gerir determinados contextos empresariais. Da mesma forma, há uma corrente de investigação que conclui que as mulheres utilizam a sua empatia para construir relacionamentos de longo-prazo com os diferentes stakeholders, o que facilita o planeamento e a execução de estratégias empresariais complexas, algo que pode ser muito útil no actual ambiente que rodeia os negócios. Acresce que as mulheres gestoras são muitas vezes vistas como modelos, inspirando outras a seguir as suas pisadas. Ao mesmo tempo, os programas de mentoria femininos criam redes de apoio que encorajam as mais jovens a sonhar com carreiras de topo em contexto internacional. Tudo isto ajuda a desconstruir antigos estereótipos, facilitando-se assim o acesso das mulheres ao mercado de trabalho, a sua retenção e promoção dentro das organizações.

Infelizmente, em Portugal, o cenário nesta matéria é muito desanimador. Apesar de as mulheres representarem cerca de metade da nossa força de trabalho, a sua presença em posições de liderança é escassa. Este tema é exemplarmente exposto na 14.ª edição do estudo ‘Presença Feminina nas Empresas em Portugal’, assinado pela Informa D&B. Esta publicação revela que apenas 27% dos cargos de liderança disponíveis nas empresas nacionais são ocupados por mulheres, as quais são apenas 17% daqueles que têm funções de direção geral. Tristemente, a sua presença nos conselhos de administração é quase meramente simbólica: 16,4% do total. Estes dados mostram uma realidade perversa: em Portugal, o número de mulheres diminui drasticamente à medida que se sobe na hierarquia corporativa. Este fenómeno  pode ser explicado pelos estereótipos de género que ainda existem (e que, na prática, relegam as mulheres para funções de suporte, coartando-lhes a possibilidade de assumir posições mais centrais) ou pelos efeitos da pressão social, a qual é ainda muito intensa. Independentemente das razões, importa reter que Portugal é um dos piores países da europa em matéria de diversidade de género na liderança, constituindo-se assim como um mau exemplo daquilo que a literatura académica designa por glass ceiling. De forma simples, esta é uma expressão anglo-saxónica que descreve uma barreira invisível, a qual impede as mulheres de subir na hierarquia empresarial, apesar de terem qualificações e capacidades equivalentes às dos seus pares do género masculino.

A alteração do quadro legislativo nacional e internacional que tem vindo a acontecer é, seguramente, um tónico importante para mudar este panorama. Em paralelo, a sociedade tem de incentivar as nossas empresas a agir sobre o problema. Tal implica definir metas mensuráveis e concretas, implementar estruturas de remuneração adequadas e oferecer condições de trabalho que, por desenho, equilibrem as responsabilidades profissionais e pessoais. Estas alterações, que são de carácter estrutural, facilitarão a ascensão de uma nova geração de mulheres portuguesas, a qual, segundo o estudo Women Matter 2023 publicado pela McKinsey & Company, está cada vez mais interessada em assumir posições de liderança. Seremos nós capazes de vencer mais este desafio?

NOTA: Este artigo apenas expressa a opinião do seu autor, não representando a posição das entidades com as quais colaboradora