
O anúncio de alterações à Lei dos Estrangeiros provocou uma corrida de imigrantes aos cursos de formação profissional em Portugal, vistos como uma oportunidade para obtenção de visto e regularização da situação no país. A tendência tem vindo a intensificar-se, com várias entidades a registarem aumentos significativos nas matrículas.
Nas redes sociais, multiplicam-se conselhos e tutoriais sobre como contornar as novas regras, incentivando potenciais imigrantes a inscreverem-se em cursos com duração superior a 13 meses — um dos requisitos legais para solicitar autorização de residência como estudante.
A legislação portuguesa prevê que cidadãos estrangeiros possam pedir autorização de residência com base em estudos, seja no momento da chegada ao país, seja para regularizar situações de permanência irregular. Esta possibilidade tem sido cada vez mais explorada, segundo indicou à Lusa uma fonte do sector.
O centro de formação Prepara Portugal, em Lisboa, é um dos exemplos do impacto desta procura. Nos últimos três meses, as novas matrículas dispararam de 58 para 195 por mês — um aumento superior a 100%. O responsável pela instituição, Higor Cerqueira, confirma que o tema da nova lei teve um efeito imediato: “Desde que começaram as discussões, temos recebido dezenas de contactos diários através do telefone, WhatsApp e redes sociais, de pessoas a querer saber como se matricular”.
Fundado por imigrantes e com foco na formação da comunidade estrangeira em Portugal, o centro oferece cursos de 18 meses, com um custo médio de mil euros. A instituição está certificada pela Direção-Geral do Emprego e das Relações de Trabalho (DGERT), o que valida as formações como elegíveis para efeitos de autorização de residência.
Atualmente, os alunos do Prepara Portugal representam 28 nacionalidades diferentes, sendo a maioria de nacionalidade brasileira (75%), seguida de marroquinos e angolanos. Embora os cursos sejam leccionados em português, existem opções em inglês e francês, permitindo uma maior abrangência.
Os cursos mais procurados são nas áreas de análise de dados, tecnologia de informação aplicada à gestão, marketing digital e planeamento estratégico — sectores vistos pelos imigrantes como alternativas menos exigentes fisicamente em relação aos empregos tradicionais em restauração ou construção civil.
“Sabemos que muitos dos nossos formandos procuram estas formações como uma porta de entrada para obter o visto, mas também acreditamos que esta qualificação lhes trará melhores oportunidades no mercado de trabalho”, sublinha Higor Cerqueira.
As inscrições podem ser feitas presencialmente ou à distância, com muitos alunos a inscreverem-se ainda a partir do Brasil. “Como os nossos cursos cumprem os requisitos legais, eles conseguem iniciar o processo de pedido de visto ainda antes de chegarem a Portugal”, explica.
Questionado sobre eventuais abusos ou utilização indevida deste mecanismo, Higor Cerqueira assegura que as presenças dos alunos nas formações são controladas. “A Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA) pode solicitar provas de frequência, e nós fornecemos essa informação sempre que solicitado”.
A agência Lusa contactou a AIMA para obter esclarecimentos sobre a utilização de cursos de formação profissional como via de regularização e os mecanismos de fiscalização associados, mas até ao momento não recebeu resposta.