É um mercado cada vez mais abrangente na Europa. São muitos os jovens do futebol escandinavo a ter impacto em alguns gigantes europeus. O trabalho de base, traduzido também nas seleções jovens, e a pouca experiência para o trabalho das linhas defensivas, algumas sem antídoto para travar o poder físico deste tipo de jogadores estão na base do sucesso. Em Portugal não faltam exemplos. Em Alvalade chegam os melhores sinais com Gyokeres, acima de todos, mas também de Hjulmand e Harder. Mas também há quem não consiga (ainda) vingar como Schjelderup. Nesse sentido A BOLA falou com Bruno Romão, treinador português de 40 anos, que além de passagens pelo Egito e Coreia, trabalhou nos últimos anos na Finlândia, ao serviço do IFK Mariehamn.

– Porque estão os jogadores nórdicos a dar-se tão bem na Liga Portuguesa?

– Os jogadores nórdicos são jogadores disponíveis para a equipa e têm sido sujeitos a bons processos de formação desportiva, nomeadamente na Dinamarca e na Suécia (Brommapojkarna, Malmo, Hammarby, Nordsjaelland, Midtjylland, Copenhaga, entre outros), o que os torna cada vez mais preparados para a nossa liga, sobretudo no potencial de evolução das decisões. Os mais aptos chegam ao futebol profissional cedo e começam a ser sujeitos a contextos de bom nível, numa cultura desportiva em que o adepto não pressiona como em Portugal, sendo que este fator poderá criar desafios quando o stress da competição aperta. Por fim, são jogadores disciplinados, que gostam de organização/informação e que cumprem a instrução. Socialmente são pessoas positivas, que se integram bem nos grupos e acredito que facilmente se apaixonam pelo estilo de vida e clima do sul da Europa. Se aliarmos tudo isto à dimensão física que acrescentam às equipas, estamos a falar de um perfil de jogador que nós não temos tão disponível na formação dos clubes portugueses.

– Impressionado com Harder ou já esperava que ele tivesse este desempenho tão positivo em tão pouco tempo?

– É cedo para dizer que está a impressionar. Esteve muito bem contra o Portimonense e quando tem sido chamado tem dado bons indicadores. O Harder está a cumprir esta fase de adaptação em linha com o plano da equipa técnica e Rúben Amorim tem feito uma boa gestão de expectativas à volta do jogador. Até porque Viktor Gyokeres só há um. Temos um caso em que as expectativas à volta do jogador poderão não estar a facilitar o seu percurso, que é o do Andreas Schjelderup, e penso que a estabilidade que o Sporting proporciona a estes jovens jogadores é muito positiva.

– O que destaca nele? E o que podemos esperar de Harder?

– Destaco a fome de baliza (versátil a finalizar de diferentes formas) e a capacidade que tem de verticalizar o jogo (estar em condições de jogar para a baliza) porque é rápido e tecnicamente evoluído. Neste último jogo as dinâmicas de movimento com e sem combinação foram muito interessantes (com pouco espaço e tempo para decidir). Sente-se que é um jogador disponível para a equipa, no entanto, mais do que criar expectativas à volta dele, tenho curiosidade de ver a sua evolução em termos da decisão (de frente e de costas), bem como a colaborar, dentro da sua posição específica, nas tarefas defensivas.

– Por que devem os clubes portugueses continuar a apostar no filão nórdico?

– A qualidade e o potencial dos jogadores existe. Se fizermos o exercício de analisar os resultados das seleções jovens portuguesas contra as nórdicas vemos cada vez mais equilíbrio. São jogadores focados e muito orientados para o coletivo. Será importante aos clubes portugueses recrutar o mais cedo possível, explorando os diferentes países nórdicos (Suécia, Dinamarca, Noruega, Finlândia e incluo aqui a Islândia). Se aliarmos estes fatores com o facto de serem pessoas afáveis, que socialmente se integram bem, temos aqui um mercado de recrutamento muito interessante e até financeiramente mais acessível aos nossos clubes.

– Ruben Amorim disse, no final do jogo em Braga, que Harder iria ocupar o lugar de Gyokeres? Onde é que o jovem dinamarquês pode levar a melhor sobre o sueco?

– Estes dois golos confirmam o potencial, nada mais, apesar de acreditar que o Harder pode ficar com o lugar de Gyokeres e também que esse foi o plano do Sporting aquando da sua contratação. Há dois aspetos em que o Conrad me parece ligeiramente mais competente que o Viktor, que é a capacidade de baixar em apoio ou de jogar entre linhas a encarar os últimos defesas, e a procura da baliza de meia distância. No restante, penso que está longe da qualidade de um dos melhores pontas que passaram no futebol português e que ainda teremos de perceber como responde a jogos consecutivos e às responsabilidades coletivas. O Harder procura a profundidade, mas em movimentos mais curtos, o que é diferente na procura do espaço a esticar os blocos adversários que o Gyokeres faz. A natural saída do Gyokeres transformará a forma de atacar e de pressionar do Sporting, nomeadamente pelas características únicas do jogador sueco. Aquilo que vou sentindo no futebol atual é que os blocos e linhas defensivas estão cada vez menos preparados para defender avançados com perfis semelhantes ao do Gyokeres, algo que também tem naturais reflexos no seu valor de mercado