O Tribunal Central Administrativo decidiu, esta quinta-feira, anular o castigo, validado pelo almirante Gouveia e Melo, a 11 marinheiros que recusaram embarcar no Navio Mondego. A Justiça considerou que os direitos dos militares castigados não foram respeitados, durante o processo. A Marinha vai recorrer da decisão.

Os marinheiros foram suspensos (entre 10 e 45 dias, dependendo dos casos), como pena disciplinar, depois de, em março de 2023, terem rejeitado ocupar os respetivos postos numa missão do navio NRP Mondego.

Em causa estão sargentos e praças que alegavam que o navio não tinha condições de segurança para sair para o mar e acompanhar um navio russo que passava ao largo da ilha de Porto Santo (Madeira).

A decisão de suspender os marinheiros foi tomada pelo vice-almirante comandante naval, mas validada pelo chefe do Estado-Maior da Armada, o almirante Henrique Gouveia e Melo. Agora, a Justiça vem considerar as suspensões nulas.

As três razões para a anulação dos castigos

A decisão do tribunal, a que a SIC teve acesso, enumera três grandes motivos para a anulação dos castigos. Em primeiro lugar, a Justiça conclui que os marinheiros foram inquiridos sem que lhes tivessem sido comunicados os seus direitos. Na altura, não terão sido informados de que podiam permanecer em silêncio ou recorrer a um advogado.

O tribunal entendeu também que quem esteve envolvido na cadeia de comando e participou ativamente nos acontecimentos no navio - nomeadamente, o comandante da Zona Marítima da Madeira, Rui Rodrigues Teixeira - estava impedido de ser instrutor do processo, o que aconteceu. A Justiça considera, por isso, que os atos que praticou têm de ser considerados nulos.

Finalmente, Tribunal Central Administrativo declara que foram recolhidas e valoradas provas sem que os marinheiros tenham sido notificados disso, já após estes terem inicialmente apresentado a sua defesa – e que, desse modo, o direito de defesa foi violado.

Marinha não baixa os braços

Em reação à decisão do Tribunal Central Administrativo, a Marinha ressalva que o acórdão em causa ainda não transitou em julgado e adianta que irá recorrer da decisão.

"A maioria dos processos relacionados com este caso tem tido desfechos favoráveis à Marinha, com decisões proferidas tanto por este tribunal como por outras instâncias", acrescenta, confiante de que esta decisão da Justiça poderá ser revertida.

A polémica do NRP Mondego

A controvérsia em torno do NRP Mondego remonta a 11 de março de 2023, quando o grupo de marinheiros decidiu recusar uma missão, apresentando como argumento a falta de condições da embarcação.

Uma inspeção feita pelo Tribunal Marítimo, dias após a recusa dos militares, concluiu que o navio podia navegar em segurança, mas admitia a existência de fissuras na estrutura que não permitiam ao navio ser estante, dificuldades de esgoto na casa das máquinas e incapacidade de separação de águas e óleos.

A decisão de castigar os militares e o alegado ralhete público dado aos mesmos pelo chefe do Estado-Maior da Armada, o almirante Henrique Gouveia e Melo, geraram polémica.

Gouveia e Melo é apontado como um forte potencial candidato à Presidência da República e, sabe a SIC, deverá avançar para a corrida a Belém já em março do próximo ano. O chefe do Estado-Maior da Armada decidiu mesmo deixar o cargo e a Marinha no final deste mês, passando diretamente à reserva (e ficando com o caminho livre para a candidatura à Presidência).

[Notícia atualizada às 22h50]