
O primeiro-ministro do Japão, Shigeru Ishiba, rejeitou esta quarta-feira a possibilidade de o país partilhar armas nucleares dos Estados Unidos e reafirmou a vontade do Executivo japonês de respeitar os "três princípios não nucleares ".
Ishiba pronunciou-se assim quando questionado sobre essa opção numa conferência de imprensa realizada no final da cerimónia do 80.º aniversário do bombardeamento atómico de Hiroshima, que decorreu esta quarta-feira nessa cidade do oeste do Japão, a primeira da história a ser atacada numa ação de guerra com uma arma nuclear.
"Houve alguma confusão sobre se partilhar armas nucleares significa possuí-las, mas não considero nenhuma dessas opções com base nos três princípios não nucleares", disse Ishiba.
O primeiro-ministro japonês defendeu, no entanto, a necessidade do Japão "estudar" um "fortalecimento da credibilidade da dissuasão nuclear", numa referência ao escudo nuclear norte-americano que protege o país asiático.
Ishiba afirmou que Tóquio deve "liderar os esforços globais" para a humanidade alcançar um mundo sem armas nucleares, durante o seu discurso na cerimónia realizada no Parque Memorial da Paz de Hiroshima, local onde, em 6 de agosto de 1945, os Estados Unidos lançaram a primeira de duas bombas atómicas sobre o Japão, causando a morte de cerca de 70.000 pessoas.
O governante nipónico destacou ainda o "aprofundamento das divisões da comunidade internacional" em relação ao desarmamento nuclear e o "agravamento do ambiente de segurança", um contexto em que é mais necessário "alcançar um mundo sem armas nucleares" através das iniciativas de Não Proliferação Nuclear (NPT), afirmou.
"Apelaremos a todos os países para que aproveitem ao máximo esse espírito de diálogo durante a reunião da iniciativa NPT do próximo ano", disse o primeiro-ministro japonês, que também apelou à "busca de medidas concretas" para a desnuclearização , incluindo tanto os países que não possuem armas deste tipo como as potências atómicas.
"A base para alcançar um mundo sem armas nucleares é a compreensão correta do facto da bomba atómica", indicou Ishiba na cerimónia, na qual participaram sobreviventes do bombardeamento, e perante representantes diplomáticos de 120 países e territórios, uma assistência recorde.
Japão segue "três princípios não nucleares" há quase 60 anos
Desde 1967, o Japão segue os "três princípios não nucleares", que consistem em não produzir, não possuir e não permitir armas nucleares em seu território.
Mas o ambiente de segurança mais hostil que envolve o arquipélago devido à guerra na Ucrânia, ao crescimento militar da China e aos avanços nucleares de Pyongyang fez com que, nos últimos anos, se abrisse o debate político sobre a possibilidade de o Japão acolher no seu solo bombas nucleares norte-americanas ou manter a capacidade técnica para desenvolver este tipo de armamento.
Pouco antes de se tornar primeiro-ministro, em outubro passado, o próprio Ishiba defendeu a criação de uma "NATO asiática", com a qual os Estados Unidos pudessem partilhar as suas armas nucleares, ou mesmo capaz de desenvolver o seu próprio armamento atómico, em resposta à ameaça que representa o estreitamento dos laços militares entre a Rússia, a China e a Coreia do Norte.
Ishiba parece, porém, ter descartado essa ideia desde que chegou ao poder, o que é agora confirmado pelas suas declarações no âmbito do 80º aniversário do bombardeamento de Hiroshima.
Há quem defenda mudança na postura antinuclear
Outras figuras importantes do Partido Liberal Democrático (PLD), atualmente no poder, defenderam uma mudança na postura antinuclear mantida por Tóquio desde o fim da Segunda Guerra Mundial.
Entre elas destaca-se o ex-primeiro-ministro Shinzo Abe (2012-2020), a figura mais influente do partido governante japonês nas últimas décadas, que também afirmou em 2022 - no ano em que foi assassinado - que Tóquio deveria considerar a opção de partilhar armas nucleares com os Estados Unidos, como Washington faz com os seus aliados da NATO, e deixar de considerar essa possibilidade como "um tabu".