
Numa comunicação anterior (aqui) considerou-se que o desempenho da agricultura portuguesa não se pode considerar suficientemente satisfatório para o país.
Justificou-se essa afirmação por Portugal não conseguir produzir tantos alimentos como os que consome. Ou seja, Portugal precisa de produção agrícola e alimentar exterior para satisfazer as suas necessidades.
Mesmo partindo já desta assunção, sugere-se que cada um faça o exercício de pensar numa resposta mesmo que aproximada à seguinte pergunta:
“A produção nacional corresponde a que percentagem do total de bens agroalimentares adquiridos e consumidos anualmente em Portugal?”
De forma mais erudita, o que realmente se está a perguntar é qual é o grau de autoaprovisionamento nacional.
Logicamente que este valor varia, embora numa amplitude não muito larga, de ano para ano, consoante o nível de consumo mas sobretudo consoante o ano seja produtivo ou não.
Na mesma linha, também logicamente, há produtos em que Portugal é superavitário (produz mais do que consome e que tem/pode exportar) e outros em que, até pelas condições edafoclimáticas, é deficitário e, por isso, um importador crónico.
Em 2024, Portugal, por exemplo, foi superavitário em azeite (214,9%), vinho (117,4%) e leite (108,9%). E foi deficitário em carne (75,2%), fruta (68,8%) e cereais (17,9%).
Mas voltemos à pergunta:
“Qual é o grau de autoaprovisionamento nacional?”
A resposta é que ronda os 80% (fonte). Ou seja, Portugal tem uma produção agroalimentar que corresponde sensivelmente a 80% (4/5) das suas necessidades.
Pela amiúde experiência em fazer a pergunta creio que a larga maioria tem a perceção (errada) de que o grau de autoaprovisionamento é menor e que por isso a capacidade de a produção nacional compensar as necessidades alimentares da população é inferior à realidade.
Por este motivo, quando é comunicado o valor real, as pessoas ficam agradavelmente surpreendidas com o desempenho.
Mas não devem!
Os aproximadamente 20% de produção agroalimentar que Portugal tem de importar para satisfazer as suas necessidades pesam com expressão nas contas nacionais.
Numa próxima oportunidade desenvolver-se-á exatamente as consequências deste défice da balança comercial agroalimentar nacional.
Contudo, como alerta, deixam-se, desde já, alguns dados. Portugal, em 2024, teve um défice da balança agroalimentar de 5,2 mil milhões (fonte) o que, para ser mais palpável, por exemplo, equivale sensivelmente ao dobro do investimento realizado até ao momento no Empreendimento de Alqueva.
Repete-se: O défice da balança agroalimentar em 2024 foi equivalente à construção de dois empreendimentos de Alqueva!
Parece-me portanto que a resposta à segunda pergunta do título é óbvia.
As Crónicas Rurais incidem sobre temas relacionados com o mundo rural, com uma periodicidade semanal. São asseguradas por um grupo de autores relacionados com o setor, que incluem Afonso Bulhão Martins, Cristina Nobre Soares, Filipe Corrêa Figueira, João Madeira, Marisa Costa, Pedro Miguel Santos e Susana Brígido.