
A história da informática obrigou os utilizadores a adaptar-se progressivamente, primeiro aos cartões perfurados, depois aos teclados e ratos e, posteriormente, aos ecrãs táteis para comunicar com os seus dispositivos. E agora, a Reality Labs (uma divisão de investigação da Meta) propõe uma nova forma de os utilizadores interagirem com os computadores, tentando também inverter a equação e fazer com que seja a máquina que se adapte a nós: após anos de trabalho, os seus engenheiros desenvolveram uma espécie de pulseira/braçadeira chamada surface electromyography (sEMG) que permite a quem a usa controlar um computador.
O novo periférico, ainda em fase de desenvolvimento, foi apresentado ao público através da conhecida revista Nature e apoiado por uma revisão por pares que valida a tecnologia como um método de entrada intuitivo e aplicável à maioria das pessoas.
O artigo oferece regras de design, melhorias práticas e um conjunto de dados abertos que somam mais de cem horas de gravações sEMG de 300 participantes, com o objetivo de acelerar a investigação académica.
A divisão Meta já integrou a tecnologia num protótipo de pulseira conectada ao Orion, seu primeiro modelo de óculos de realidade aumentada, com o qual converte sinais musculares em comandos para óculos de realidade aumentada, eliminando assim a necessidade de usar periféricos tradicionais.
Graças a este novo tipo de controlador, o utilizador pode redigir mensagens sem precisar de um teclado físico, navegar pelos menus sem precisar do rato e manter os olhos no ambiente físico enquanto interage com conteúdo digital.
Graças aos modelos de aprendizagem automática treinados com milhares de voluntários, o sistema reconhece gestos subtis como toques, deslizes e pinças e permite até escrever à mão sobre uma mesa ou na própria perna. Testes internos mostram que uma ligeira personalização dos modelos aumenta em até 16% a precisão do reconhecimento da escrita.
Além da sua precisão, a tecnologia é não invasiva, portátil e funciona mesmo quando não é possível falar em voz alta, o que a torna adequada para ambientes profissionais onde a discrição é essencial. Os investigadores também destacam o seu caráter inclusivo: por se basear em sinais musculares, adapta-se a utilizadores com diferentes capacidades físicas.
Com a publicação de mais de cem horas de dados sEMG para a comunidade científica, a Reality Labs oferece um ponto de partida para que outros laboratórios desenvolvam as suas próprias interfaces neuromotoras baseadas nesta tecnologia. Com isso, a empresa espera acelerar aplicações que vão desde a assistência a pessoas com deficiências motoras até novas formas de controlar dispositivos no local de trabalho.
Olhando para o futuro, a eletromiografia de superfície poderá redefinir a forma como interagimos com qualquer dispositivo, desde um computador de secretária até óculos inteligentes. O caminho agora passa por amadurecer o hardware, aperfeiçoar os algoritmos e demonstrar a sua fiabilidade em cenários reais, mas o passo dado com a publicação na Nature aproxima essas possibilidades da prática profissional.