No local onde decorreu a noite eleitoral de 1975, ao longo de 25 horas de emissão televisiva, a Fundação Gulbenkian (Lisboa), estão expostos a partir de terça-feira vídeos, cartazes, capas de jornais e outros documentos que contam a história das eleições para a Assembleia Constituinte e do período antecedente.

"Foi aqui o centro de imprensa e o centro de escrutínio", explicou Pedro Magalhães, curador da exposição "Haverá Eleições. 1975", durante uma visita guiada.

O percurso começa com uma instalação de 10 ecrãs em estruturas metálicas usadas para os locais de voto, onde podem ser visionadas imagens da época, declarações de Salgueiro Maia e de Mário Soares, entre outros protagonistas.

A exposição divide-se em seis núcleos e percorre o trilho político que vai das restrições ao voto das mulheres, antes do 25 de Abril de 1974, até à propaganda do regime e às convulsões políticas que se seguiram após o golpe militar que derrubou a ditadura e que chegaram a pôr em risco a realização das eleições prometidas pelo Movimento das Forças Armadas (MFA).

Pedro Magalhães explicou aos jornalistas a complexidade do processo, desde logo por não haver em Portugal estrutura ou organização com capacidade para fazer as eleições acontecer, "se não fossem as Forças Armadas".

As câmaras de voto tiveram de ser encomendadas. "Não havia, porque as pessoas levavam o boletim já preenchido", exemplificou, fazendo uma pausa para recordar a repressão e a forma viciada como decorriam as eleições num país onde elementos da Legião Portuguesa votavam em nome de pessoas mortas.

Orçamento para o recenseamento também não havia. Acabou por se realizar com fundos da PIDE/DGS, sublinhou o curador, acrescentando que as características básicas do sistema eleitoral vigoram até hoje.

"Isto foi uma coisa épica, conseguir organizar isto tudo", apontou, ao passar pelos documentos que testemunham os passos para a democracia.

O papel para os boletins de voto veio da Suécia. "Foi a Força Aérea e o Exército que distribuíram os boletins de voto pelo país", recordou Pedro Magalhães.

Fotografias, cartazes, vídeos, capas de jornais com terceiras edições esgotadas, contam a história da revolução e do caminho para eleger os deputados à Assembleia Constituinte, com a missão de elaborarem a Constituição da República Portuguesa, aprovada em 1976.

Vários materiais informativos foram elaborados na altura para explicar à população, grandemente analfabeta, como votar, mas com "uma enorme preocupação de imparcialidade", apesar da agitação política, segundo Pedro Magalhães.

Também às crianças o MFA quis explicar as eleições, através de uma banda desenhada inserida na exposição, de entrada livre e patente até 31 de outubro.

No último módulo, em que pode ser visionada parte da noite eleitoral, estão instaladas mesas de voto e vídeos que revelam a simplicidade e a ignorância do povo chamado a votos, em vários pontos do país.

É nesta câmara que o público é convidado a deixar escrito num boletim o que quer para os próximos 50 anos.