O consórcio LusoLav, responsável pela linha de alta velocidade entre Porto e Oiã, quer mudar em dois quilómetros a localização da estação de Gaia, de Santo Ovídeo para Vilar do Paraíso e propõe construir duas pontes sobre o Douro em vez de uma ponte rodoferroviária como está previsto no projeto. A Câmara de Gaia vota já esta quinta-feira à tarde as alterações, mas a IP e a Câmara do Porto dizem desconhecer tudo isto. O Governo está a acompanhar.

A Infraestruturas de Portugal (IP) desconhece as alterações propostas pela LusoLav à estação de alta velocidade de Gaia e à ponte sobre o Rio Douro, lembrando que ainda não assinou o contrato de concessão com o consórcio constituído pela Mota-Engil, Teixeira Duarte, Alves Ribeiro, Casais, Conduril e Gabriel Couto.

“A Infraestruturas de Portugal (IP) não foi informada pelo Consórcio Adjudicatário da intenção de introduzir quaisquer alterações à proposta que apresentou ao concurso", refere a IP, citada pela Lusa, lembrando que o contrato de concessão da Linha Ferroviária de Alta Velocidade entre Porto (Campanhã) e Oiã, adjudicado ao Consórcio Lusolav a 10 de outubro de 2024, “ainda não foi outorgado, pelo que o mesmo ainda não começou a produzir efeitos".

“Desconhecemos em absoluto”

Do lado do Governo, há apenas indicação de diálogo entre o Ministério das Infraestruturas e Habitação e a IP sobre este tema. “O Ministério das Infraestruturas e Habitação está em diálogo com a IP sobre esta matéria. A resposta que a Lusa recebeu ontem [quarta-feira] da IP é o único ponto de situação para já", diz fonte oficial do ministério à Lusa.

Ao Expresso, fonte oficial da Câmara do Porto indicou, também, desconhecer as mudanças no projeto. “Formalmente desconhecemos estas mudanças. Na sequência das notícias que começaram a ser publicadas dando conta de alterações no projeto, contactamos a IP que disse desconhecer mudanças em Gaia. E desconhecemos em absoluto a possibilidade de ser construída uma segunda ponte”, diz a autarquia recordando que houve um projeto de construção de uma ponte rodoviária a ligar os dois concelhos, paga pelas duas câmaras, mas com o projeto da Alta Velocidade a ideia foi posta de lado.

Em causa, nestas alterações, estão questões como a redução da extensão dos túneis previstos, a ideia de que será mais simples, rápido e barato construir duas pontes do que uma grande ponte, a ligação intermodal do TGV à rede de metro e, também o facto de assim estarem em causa menos demolições de casa. E porque é que a questão até ao momento foi tratada apenas com Gaia? “É o concelho mais afetado por todas estas mudanças”, explica fonte conhecedora do processo.

Menos risco, mais rapidez

“Só faz sentido uma estação de TGV em Gaia se houver ligação à rede de metro, numa base de transportes intermodais”, afirma o presidente da Câmara de Gaia, Eduardo Vítor Rodrigues, em declarações à SIC, sobre o desvio do traçado em cerca de 2 km, adiantando que este ponto fica resolvido com a extensão da linha rubi até à nova estação, prevista pela concessão”. Duas pontes podem implicar mais expropriação de terrenos não construídos, mas o resultado final trará “menos demolições”, acrescenta o autarca.

De acordo com documentos a que a Lusa teve acesso e que irão a votação numa reunião extraordinária da Câmara de Gaia que se realiza na quinta-feira às 16 horas, bem como numa Assembleia Municipal no mesmo dia às 21 horas, "o consórcio sustenta essa opção na necessidade de redução do risco de financiamento, redução do risco de incumprimento do prazo e na clara separação das futuras responsabilidades de manutenção de cada uma das pontes".

Na fase de estudo prévio, a IP propôs e pôs a concurso uma travessia rodoferroviária entre o Porto e Gaia, uma solução consensualizada entre os autarcas do Porto, Rui Moreira, e de Vila Nova de Gaia, Eduardo Vítor Rodrigues, mas. Agora, o consórcio propõe voltar a separar a travessia em duas pontes distintas na vizinhança da ponte ferroviária de S. João, uma à cota alta, para o comboio, e outra à cota baixa, com ligação entre Oliveira do Douro e a marginal do Porto, para o transporte rodoviário.

De Santo Ovídio para Vilar do Paraíso

Quanto à estação, é proposta uma alteração da localização anteriormente prevista - Santo Ovídio -, que constava dos estudos elaborados pela IP e que serviram de base ao concurso, deslocando-a cerca de 2 km para sul". "A nova localização proposta para a Estação de Vila Nova de Gaia fica compreendida entre a Rua da Junqueira de Cima (a norte e poente), a Rua e Travessa do Guardal de Cima (a sul) e a Travessa de Belo Horizonte (a nascente)", na zona de São Caetano, em Vilar do Paraíso, referem estes documentos.

Além de um conjunto de acessibilidades rodoviárias, a proposta inclui "o prolongamento da linha Rubi, desde Santo Ovídio até à Estação de Alta Velocidade (lado poente)", com custos repartidos entre o consórcio (obra pesada) e a Metro do Porto (instalação da linha e dos respectivos equipamentos).s

A proposta do consórcio implica ainda menos construção em túnel, pois "no projeto que consta do Estudo Prévio, a maior parte da extensão da linha no concelho de Vila Nova de Gaia encontra-se prevista em túnel, feito em escavação subterrânea, com menor impacto à superfície", com 9,2 quilómetros em túnel do total de 12 quilómetros percorridos no concelho.

Reuniões em Gaia sobre o tema

Apesar da Câmara do Porto e da IP garantirem desconhecer todas estas mudanças, a Lusa informa que a Câmara de Gaia fez "diversas reuniões" com o consórcio LusoLav antes de votar as alterações do projeto esta quinta-feira, citando documentos do processo com menções a "diversas reuniões" entre as partes,

"No âmbito do acompanhamento dos projetos da LAV [linha de alta velocidade], realizaram-se diversas reuniões de trabalho com o Consórcio [LusoLav] para análise das propostas de alteração do projeto da Linha de Alta Velocidade", cita a Lusa referindo vários dos documentos municipais. E há ainda uma carta remetida pela administração do consórcio à autarquia gaiense em que apresenta a sua proposta, "no seguimento de diversas reuniões técnicas realizadas com a Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia".

Já uma carta do Departamento de Urbanismo e Planeamento refere que, "no âmbito do desenvolvimento dos projetos da LAV, realizaram-se quatro reuniões de trabalho para análise do efeito da subida da rasante na linha, designadamente a análise da geometria dos restabelecimentos viários propostos pelo consórcio", mas sem detalhar se as reuniões deste departamento foram internas ou com o LusoLav, indicando apenas que se realizaram em 25 de fevereiro e 11, 20 e 25 de março.