Conrad Harder, quem és tu? Talvez nem Conrad Harder, 19 anos cheios de ímpeto e vontade, saiba responder à pergunta. Um ponta-de-lança em formação a jogar na elite do futebol europeu, um atacante a descobrir-se enquanto os outros o descobrem.
Conrad Harder olha mais para a baliza adversária do que para o jogo. À meia-hora do Sporting-Bologna, o ainda adolescente tinha realizado tantos remates (dois) quantos passes acertara para os companheiros. A certa altura do primeiro tempo, Debast tentou dar-lhe a bola, mas Harder não a recebeu porque, em vez de a ir buscar, já estava a explodir em direção às redes do opositor. Conrad Harder olha mais para a baliza adversária do que para o jogo.
Mas, se calhar, tinha de ser um homem assim a resolver uma noite em que se olhou mais para as aplicações de resultados do que para o jogo. A dada altura desta exibição cheia de nuvens, cinzenta como o tempo, o Sporting mirava mais para outros campos do que para Alvalade. O City ainda está a perder? O Milan aguenta em Zagreb? Como está o Estugarda?
Aos 77’, era esse o cenário dos leões. Olhar para outros estádios. Tudo estava a correr mal. O Dinamo estava a ganhar, o PSG também, o City igual. Quando se olhavam mais para resultados do que para o jogo, apareceu o rapaz que olha mais para a baliza adversária do que para o jogo.
Tinha de ser Conrad Harder e tinha de ser meio aos trambolhões. Aos solavancos, como aqueles carros que andam em estradas na tempestade.
Veio um cruzamento da esquerda e Harder, o atacante indefinido, não saberá definir como é que marcou. Pareceu rematar com uma perna contra a outra, ao mesmo tempo que se envolvia numa estranha confusão com o defesa e o guarda-redes, tudo enquanto a bola lá ia. Entrou mesmo, Alvalade celebrou. Durante uns 15 minutos, o Sporting esteve fora da Liga dos Campeões. Mesmo no limite, regressou ao play-off.
O jogo foi precedido por minutos de tormenta, por uma mistura de chuva torrencial, vento fortíssimo, enfim, todo o tipo de manifestações vindas de lá de cima, como se o céu estivesse chateado com o mundo. Em linha com este clima, o ambiente em Alvalade apresentou-se frio, desconfortável, como uma pessoa que sai à rua sem um casaco apto para estas andanças.
Sem Gyökeres, que se juntou a uma lista de lesionados onde também há Nuno Santos, Pote, Morita ou Quaresma, o Sporting foi quase sempre uma entidade coletiva indefinida, incapaz, inferior a um adversário que entrou em campo já eliminado. Logo aos 3’, Beukema, perigo constante nas alturas, atirou à barra, no primeiro aviso das dificuldades que os rossoblù colocariam nesta despedida de uma rara aventura europeia.
O Sporting, incomodado com a pressão e vigor físicos dos visitantes, sofria horrores para sair para o ataque. Parecia um peão que tinha de avançar contra o vento que, por momentos, se fez sentir no dia lisboeta. Harder ameaçou por duas vezes nos primeiros 20’, sempre com finalizações pouco conseguidas e indefinidas, mas foi o melhor arranque dos oitavos classificados da Serie A que valeu o 1-0.
Tal como no aviso inicial, um canto da direita encontrou, aos 21’, a cabeça de Beukema. O defesa desviou na direção de Pobega que, meio sem querer, abriu o marcador. Foi o primeiro golo fora de casa do Bologna nesta edição da Liga dos Campeões.
O Sporting, com quatro canhotos nas posições mais avançadas do terreno (Bragança, Harder, Trincão e Geny), atuava sem um fio nítido, aos avanços e recuos, com pouca fluidez. Enquanto lances de ataque com escassa clarividência iam morrendo nos pés de Harder, vinham más notícias dos outros campos. A meio do primeiro tempo, os leões estavam pendurados pelo que sucedesse em Manchester. Um golo do City significaria a eliminação.
Em cima do descanso, Maxi e Morten estiveram perto do 1-1. O City sofreu mesmo antes do intervalo, mas rapidamente deu a volta.
Com o Milan de Sérgio Conceição a empatar contra o Dinamo Zagreb para, pouco depois, sofrer o 2-1, o pânico chegou a Alvalade a meio do segundo tempo: pela primeira vez na noite, pela primeira vez na Liga dos Campeões, o Sporting estava fora.
Como é que chegámos aqui? Como é que os leões, após um começo em que chegaram a ser segundos da tabela, se afundaram tanto?
Terá havido erros, roturas, problemas. O que é evidente é que jogadores que há pouco eram suplentes, por não parecerem possuir qualidade para o onze, são agora titulares; o banco é um conjunto de miúdos de uma equipa B que sofreu para estar na fase de subida da Liga 3. Alguém disse miúdos? É que foram eles quem chegou para o resgate.
Sem grandes opções para colocar no desafio, Rui Borges deu entrada a João Simões e Quenda. Aos 77' desta noite de vento e chuva, uma jogada adolescente decidiu o jogo. Numa fase em que se olhava tanto para as aplicações de resultados como para o campo, foram os adolescentes que já nasceram com smartphones na mão quem recolocou o Sporting na Liga dos Campeões.
Simões, 18 anos, lançou-se com otimismo e energia para a frente. Combinou com Quenda, de 17 anos, e foi buscar mais à frente, cruzando para Harder, de 19 anos. Aos solavancos, a bola entrou.
O Sporting acabou a sofrer. Sofreu durante toda a partida, na verdade, como é normal nas receções a italianos, que só foram derrotados por cinco vezes em 20 visitas a Alvalade. Num serão de tempestade e carambolas de resultados, Harder evitou a eliminação. Haverá, pelo menos, mais dois duelos europeus na época dos leões.