Tinha sido há apenas 27 dias que o FC Porto se deslocou a casa do Moreirense e disse adeus à Taça de Portugal logo na quarta eliminatória, a segunda em que participou (2-1).

Os dragões caíram com estrondo em Moreira de Cónegos, num jogo em que permitiram a reviravolta depois de terem estado a ganhar e os jogadores e a equipa técnica terminaram a partida à frente dos adeptos, que não se inibiram de mostrar toda a sua frustração, levando Samu, Pepê e Zé Pedro a não conseguirem conter as lágrimas. Essas foram, de resto, as principais imagens que ficaram daquela tarde chuvosa de domingo.

Ora, na noite deste sábado, o guião acabou por ser escrito de outra forma, com a formação de Vítor Bruno a conseguir voltar a triunfar no palco em que havia caído. Esta espécie de redenção aconteceu em jeito de goleada, com golos de Samu, Rodrigo Mora e André Franco. Os dois primeiros foram titulares pela primeira vez lado a lado e deram cartas, somando ainda uma assistência cada.

A verdade é que a época tem sido de altos e baixos para os azuis e brancos, com os altos a surgirem, essencialmente, nos jogos em casa, e os baixos nas partidas fora de portas, onde o FC Porto colecionou recordes negativos que não aconteciam há mais de uma década nas últimas partidas. Ainda assim, os dragões venceram o único troféu disputado até ao momento, a Supertaça, e já chegaram a esta 15.ª jornada à procura da estabilidade, que estava mais perto do que acontecera no passado. Depois de ter somado apenas uma vitória e um empate nos cinco jogos realizados em novembro, os portistas entraram em campo vindo de duas vitórias consecutivas e a apenas dois pontos do líder do Sporting.

Do outro lado, estava um “super Moreirense” que, com César Peixoto no comando técnico, chegava a esta partida invicto em casa em 2024/25 — a última derrota datava de abril — e com cinco vitórias nos sete jogos realizados no Comendador Joaquim de Almeida Freitas. Os números impressionavam, mais ainda se se tivermos em conta que já tinham passado por ali Benfica (1-1), Famalicão (0-0) e Sporting (2-1), juntando-se ainda o duelo com os azuis e brancos na Taça de Portugal. O registo permitia, por isso, e com razão, sonhar.

Os dados estavam lançados e Bruno acabou por surpreender no onze inicial, ao dar a primeira titularidade oficial na equipa principal a Rodrigo Mora, que entrou por troca com Danny Namaso, o que “obrigou” Fábio Vieira a regressar ao corredor direito.

Do outro lado, Peixoto também fez uma mexida, com Gabrielzinho a entrar para o flanco direito do ataque, por troca com Madson Monteiro. O técnico cónego procurou, assim, surpreender os dragões na profundidade, tentando tirar proveito de Galeno jogar naquele lado como lateral esquerdo.

Assim sendo, os primeiros minutos revelaram um FC Porto à sua imagem, a dispor de mais posse de bola e em ataque posicional. Por outro lado, o Moreirense apresentou um futebol mais direto, virado para o contra-ataque e organizado, mas a estratégia acabou por se desmoronar na primeira tentativa de golo dos azuis e brancos.

Nico González encontrou Rodrigo Mora solto de marcação na esquerda e colocou-lhe a bola na profundidade, o jovem recebeu, simulou e passou por Maracás e cruzou para Samu que, com um movimento à verdadeiro ponta de lança, cabeceou para o fundo da baliza, à passagem do minuto 16.

Esta foi, aliás, uma das melhores jogadas do FC Porto em toda a temporada. Pepê atraiu Dinis Pinto e tirou a bola da pressão para o lançamento de Nico González. Rodrigo Mora, que oferece criatividade, imprevisibilidade, capacidade passe curto (associação) e longo (variação), percebeu onde está o espaço e a calma/visão com que executou é uma marca de talento. Samu pede estes cruzamentos mais vezes, até porque já se percebeu que, quando as bolas lhe chegam em condições, ele coloca-as dentro da baliza contrária de maneira relativamente simples.

A partir daí, manteve-se a tendência, com a formação portista a continuar com mais bola e a jogar com precaução, procurando não se expor às transições de um Moreirense que prosseguiu confortável com o rumo do desafio.

Já na reta final do primeiro tempo, os cónegos subiram as linhas e, a espaços, conseguiram encostar o FC Porto à sua área, mas a partida acabou por chegar ao intervalo equilibrada, sem ocasiões de perigo e com apenas três remates enquadrados, sendo que um deu golo.

O reatar da partida aconteceu com atraso. O FC Porto chegou tarde ao relvado e sem grande vontade de resolver o jogo com rapidez. A segunda parte começou fria, com circulação lenta e muitas faltas, tal qual acabou a primeira.

Assim, nesta etapa complementar, a reação dos cónegos, com mais bola no meio-campo contrário, obrigou o FC Porto a atenção redobrada, a passar mais tempo em processo defensivo, embora sem muitos calafrios.

Depois, para praticamente sentenciar a partida, lá apareceu o novato das parras loiras a desmistificar o problema. O próprio Rodrigo Mora conduziu o lance e num remate com vários tragos encontrou a baliza, sem nunca no meio da carambola perder o objeto que lhe é inerente. Por esta ocasião, Samu ergueu-o como se de um troféu se tratasse e lá que, ao longo da noite, foi um “menino de ouro”, isso foi.

Aliás, na minha opinião, não existe outro jogador no plantel de Vítor Bruno que possa mudar tão claramente as possibilidades da equipa – na candidatura ao título, desde logo. A bola chega pouco aos criativos, então há que melhorar as que chegam e a forma como chegam. Mas, para isso, tem de jogar, claro, e, visto de fora, não se percebe o porquê da aposta em Mora ter demorado tanto.

Notava-se que o FC Porto precisava de jogadores não convencionais, com capacidade para incidir e resolver em cada contexto de jogo, ainda mais quanto há bastante instabilidade nos hábitos coletivos. O distinto, neste sentido, chama-se Rodrigo. Rodrigo Mora.

Claro que não vai acertar sempre, não vai resolver sempre, nem vai jogar bem sempre, mas, tendo em conta que é um predestinado, é preciso dar outro tipo de confiança ao miúdo.

Por outro lado, Fábio Vieira continua a ser muito inconstante nas suas exibições. Pode ser capaz de resolver numa jogada, mas está muitas vezes “desligado” do jogo e acaba por não oferecer nem metade do que é o seu melhor e do que é, nas melhores condições, capaz. Qualidade não falta, mas o futebol é muito mais que isso.

De resto, continuo a gostar mais desta versão do FC Porto, apenas com Moura ou Galeno no corredor e com mais gente por dentro, mais parecido com o que Vitor Bruno ensaiou na pré-época. Veremos o tipo de continuidade que esta fórmula terá.

Ora, com o 0-2 no marcador, Vítor Bruno mexeu na equipa – lançou Ivan Jaime, Alan Varela, Gonçalo Borges e André Franco – e este último ainda foi a tempo de picar o ponto. Depois de uma excelente tabela com Samu, Franco colocou a bola longe do alcance de Kewin e acabou com as hipóteses do Moreirense.

Foi, por isso, um Moreirense apagado e longe da sua melhor versão, ainda que, a espaços, tenha obrigado o FC Porto recorrer a algumas demoras, essa arte das trevas, para se defender do fluxo de jogo imposto pelos anfitriões, que chegaram a dominar por completo o corredor central.

Isto porque uma coisa é lei no Moreirense: quanto mais Alanzinho estiver envolvido nas artimanhas, mais vistosa e produtiva é a produção dos cónegos. Contudo, não foi, de todo, a noite mais inspirada do brasileiro, tal como, por exemplo, também não foi de Maracás, que acumulou vários disparates no segundo tempo, embora nenhum deles, por sorte, tenha resultado em golo.

O FC Porto venceu, assim, um Moreirense que, para quem ainda não tinha perdido em casa, se pedia mais acerto, o que, ainda assim, não retira todo o mérito ao triunfo dos dragões, que permitiram poucos remates à baliza de Diogo Costa. Este foi, além disso, o terceiro jogo consecutivo sem sofrer golos dos azuis e brancos, um sinal de recuperação da equipa de Vítor Bruno, que dormiu, pelo menos uma noite, na liderança do campeonato.

Ora, e se da última vez que esteve em Moreira de Cónegos, há menos de um mês, o FC Porto saiu apupado, desta feita, foi diferente: recebeu aplausos, tornou-se na primeira equipa a vencer no Estádio Comendador Joaquim de Almeida Freitas e alcançou a liderança à condição do campeonato. O futebol é mesmo o momento.