Cabem em 17 voltas ao astro-rei uma quantidade insuficiente de dias para se saber tudo sobre este anciano jogo. O que Geovany Quenda perde por ter um entretido serão em vez de se estar a poupar para uma qualquer matutina aula de Matemática no dia seguinte, ganha no conhecimento aprofundado em História do Drible e Teorias do Jogo Entre Linhas. Nas áreas que lhe suscitam maior interesse, é um absoluto sobredotado.
Quando a um arcaboiço de qualidades se lhe junta a liberdade de expressão, torna-se impossível sem bola de cristal – e esse não é equipamento que os defesas usem – adivinhar o que vai fazer. João Pereira deu asas a Quenda para integrar o trio atacante e de lá oscilar entre o jogo interior e o jogo à largura.
Nasceu do imaginário de João Pereira uma intenção tática personalizada para tentar retirar o Sporting do ciclo de, até ali, três derrotas consecutivas. A aposta era sobretudo no que o extremo podia render. Com bola, lá se via a sua meninez a aguçar a extremidade mais adiantada de um losango que o Sporting procurou traçar no meio-campo. Como quem deseja chegar à maioridade sem nada de novo para saber sobre a prática desta modalidade, Geovany Quenda recebeu de costas para a baliza, raro local de encontro entre o pé esquerdo e a bola que o embeleza, e deixou o Club Brugge a tatear no desconhecimento que tinha sobre aquela possibilidade.
O lance desenrolou-se e Maxi Araújo aproveitou-se do desequilíbrio para fazer um remate lento ao poste da baliza de Mignolet. Geny Catamo calculou erradamente que seria golo. Levantou inclusive os braços a festejar o hipotético sucesso do colega sul-americano. Do ferro, recebeu o ressalto que lhe disse ter confiado demais na pontaria de Araújo, acabando por ser o moçambicano a rematar para a baliza. A ação de Geovany Quenda ficou perdida no passado, mas, num lance em relação ao qual tanta gente pareceu reclamar os louros (alguns até antes da hora), foi a sua intervenção a mais decisiva.
Era um bom sinal que, aos três minutos da estreia de João Simões como titular, o Sporting se tivesse colocado na frente, mas tudo o que estava a correr bem em 180 segundos e era merecedor de ser multiplicado por 5.400 acabou por se aligeirar e os leões voltaram a sair derrotados (2-1).
Durante longos minutos, mais do que os necessários, o Estádio Jan Breydel foi cenário de um tétrico marasmo futebolístico. Alguém terá assessorado mal os jogadores do Sporting que viram previsões de 40.º para o território belga apenas propícios ao uso da relva como se de areia da praia se tratasse quando contados em graus Celsius e não mensurados à escala de Fahrenheit.
De qualquer modo, as interrupções para assistência de jogadores estendidos no chão foram constantes. Eduardo Quaresma, de regresso à competição, saiu particularmente lesado após um literal tête-à-tête com Tzolis que o impediu de continuar em campo. E este já era o segundo problema de ordem física que João Pereira tinha em mãos, visto que o Sporting esteve quase a começar uma corrida com um pneu furado. Vá lá que Gonçalo Inácio se apercebeu a tempo de que não estava em condições para ir a jogo e foi substituído por Matheus Reis no onze inicial naquele suspiro que separa o final do aquecimento e o início do jogo.
Os frequentes momentos de interrupção beneficiaram o segundo classificado do campeonato belga. Christos Tzolis ia subindo nas sondagens para ser considerado o melhor em campo. Válida ajuda deu o remate que terminou na baliza do também regressado Franco Israel (a UEFA acabaria por considerar autogolo de Eduardo Quaresma, que ainda se encontrava em campo aos 24 minutos).
Era nas ciclónicas perfurações de Tzolis que o Club Brugge cimentava a maior afoiteza. No último dos dez minutos de compensação que teve a primeira parte, o grego foi iluminado pelo lustroso passe de Hans Vanaken e não fez a reviravolta devido à audácia da saída de Franco Israel. O mesmo Tzolis abriu a segunda parte com um remate que passou perto do poste.
O Sporting viu uma grande penalidade a seu favor ser revertida instantes depois de ter sofrido o empate, uma vez que o árbitro considerou que, afinal, Skov Olsen tinha efetivamente abalroado Maxi Araújo, porém fora da grande área. Posteriormente, esgotara-se a agressividade ofensiva, com cruzamentos a atravessarem toda a defesa do Club Brugge sem destinatário aparente dada a ausência de camisolas brancas. O próprio Viktor Gyökeres, sempre patrulhado por defesas aos molhos, se atrasava a atacar zonas de finalização.
A ameaça do Club Brugge concretizar-se-ia a seis minutos do final. Casper Nielsen fugiu à guarda de um recém-entrado Ricardo Esgaio e dilatou para quatro o número de derrotas consecutivas do Sporting, esta por 2-1. Na Liga dos Campeões, as implicações são um mero desperdício da oportunidade de chegar aos lugares de acesso direto aos oitavos de final, mas o problema dos leões começa a ser demasiado persistente para não ser merecedor de um olhar clínico.