O Hyrox é uma modalidade que emerge atualmente no panorama desportivo internacional e existem legítimas possibilidades que a bandeira de Portugal seja hasteada nos grandes palcos. E tudo por culpa de Inês Moreira, uma verdadeira porta-estandarte nesta vertente que, entre muitas outras coisas, exige uma tremenda capacidade física. Esta jovem atleta lisboeta, de 26 anos, não só tem essa aptidão, como ainda acrescenta duas palavras importantíssimas ao seu léxico: resiliência e determinação. O Campeonato do Mundo está aí à porta e na bagagem já estão alguns sonhos... mas vamos por partes.

Antes de tudo, convém explicar aos mais distraídos o que é isto do Hyrox. De uma forma simplista e objetiva, trata-se de uma modalidade de fitness indoor que alterna oito quilómetros de corrida com oito tipos de exercício. Ganha, naturalmente, quem fizer o circuito em menos tempo. Nasceu há praticamente oito anos no centro da Europa, concretamente na Alemanha, com o cunho dos fundadores Moritz Fürste, campeão Olímpico de hóquei em campo, e ChristianToetzke, um entusiasta do fitness. Desde então tem vindo a conquistar cada vez mais mediatismo, a acumular praticantes e também a convencer investidores.

Inês Moreira, engenheira informática de profissão, foi uma das atletas que se deixou apanhar pela febre e em pouquíssimo tempo - como já vai perceber - teve uma ascensão meteórica, estando agora a escassos três meses de representar as cores nacionais na prova mais alta da modalidade. A competição disputa-se entre 12 e 15 de junho, em Chicago, a mais de 6 mil quilómetros de Lisboa, mas Inês não vai atravessar o Atlântico apenas para participar. É a própria quem o garante.

"Vou dar o meu melhor. Tenho um tempo em mente, aproximadamente uma hora e dez. Quero também ver o que é o meu melhor com 7 meses de treino", diz, em declarações a Record, com uma convicção inabalável.

Esta aventura, como já percebeu, começou há relativamente pouco tempo. É certo que o bichinho do desporto sempre morou no seu ADN, algo impulsionado pelo facto de ter crescido no seio de uma família ativa, mas foi num ginásio que, após evidenciar as suas capacidades físicas, foi-lhe dado a conhecer o Hyrox. "Analisei e senti que precisava de um desafio novo. Inscrevi-me em março do ano passado e a primeira competição aconteceu em outubro. Fiquei em sétimo lugar no meu grupo. Um mês antes da prova o meu ginásio tinha fechado. Estive um mês a treinar duas/três vezes por semana, a correr na rua. Tive uma lesão. Mas não desisti da prova. Fui para Madrid a pensar 'esta não vai contar'. Vou aproveitar para conhecer as pessoas, perceber os exercícios. Acabei em sétimo lugar e fiquei muito feliz."

Passados quatro meses, em fevereiro último, já com as rotinas de treino mais estabilizadas, nova ida a Espanha para o Hyrox Bilbau. "Fiquei em terceiro lugar, a um minuto do primeiro e a 3 segundos do segundo classificado, o que me permitiu garantir a qualificação para o Campeonato do Mundo. Fiquei muito feliz claro, mas depois pensei 'isto não é brincar, agora tenho mesmo que ir'", afirmou, entre risos, destacando, mais seriamente, o papel de André Silva, seu treinador.

A trajetória de Inês tem sido sempre ascendente. É por isso natural que na sua cabeça more o sonho de conquistar um grande resultado na modalidade, ainda que com os pés bem assentes na terra. "Entrei há pouco e sinto que tudo está a escalar rápido. Óbvio que gostava de ganhar um Campeonato do Mundo, visto que em 7 meses consegui isto... talvez para o ano venha um pódio. Tento não meter muita pressão. Primeiro dizia ao meu treinador 'quero ver o que é o meu melhor'. Agora digo-lhe 'quero tentar ganhar' e ele ri-se e diz para ter calma", conta.

Uma luta que é de todos

Apesar do sucesso e da ambição, Inês enfrenta um problema comum a diversos atletas: a ausência de apoios para fazer face aos custos que este tipo de desafios acarretam. Tudo o que tem conseguido sai literalmente do corpo... e do bolso.

"Fica difícil encontrar equilíbrio no desporto e evoluir. Mais apoio significa mais tempo de treino, melhor nutrição, suplementação... Nem falo só nas deslocações, mas principalmente na preparação. Para alcançar melhores resultados, é preciso mais investimento. A modalidade tem crescido imenso em Portugal, e, nos últimos meses, surgiram vários ginásios especializados em Hyrox em Lisboa. Um exemplo é o Hybrid, onde treino, que tem vindo a impulsionar a modalidade. Mas, mesmo com esse crescimento, sem apoios, torna-se muito complicado competir ao mais alto nível. Como eu existem outros altetas que sentem muitas dificuldades em representar o seu país. É um ponto a refletir", desabafa Inês, acrescentando.

"Sinto que os apoios ajudam bastante a trazer bons resultados. E os portugueses até estão sempre bem posicionados tendo em conta a falta de apoio que existe. Um atleta não ter que se preocupar em pagar a viagem ou a preparação é uma ajuda gigante. Apoio pode ser reduzir custos em diversas coisas na preparação, como na recuperação, suplementação, certos pormenores essenciais."

A azáfama do dia-a-dia e muitos... ovos e chá verde

Como é fácil de imaginar, a rotina de um atleta de Hyrox exige muito do físico e da mente. Entre a azáfama diária, na qual se cruzam os afazeres da atividade profissional com outros fatores naturais do quotidiano, existe toda uma preparação a nível de treino e alimentação que nunca é deixada ao acaso.

"Trabalho das 8h às 17h, mais de forma remota. No fundo sinto que tenho duas vidas. A partir das 17h30 aparece a atleta. Tenho fisioterapia com o David Benrós uma ou duas vezes por semana. Também tenho massagem desportiva uma vez por semana ou de duas em duas semanas. O treino começa por volta das 20h. Costumo lanchar cinco ovos mexidos e uma peça de fruta. Antes do treino tomo um shot energético de beterraba e no fim proteína. Também tomo glutamina antes de dormir. O pequeno almoço são dois ovos mexidos e uma fatia de pão de cereais e uma peça de fruta... ou dois queijos frescos. Antes do pequeno almoço tomo creatina e no fim uma suplementação à base de cúrcuma e gengibre. E muito chá verde ao longo do dia", diz-nos Inês, sublinhando que ao sábado faz treinos bidiários e que domingo é o único dia de descanso.

O êxito exige, de facto, muito trabalho, foco e determinação, palavras que servem na 'mouche' para definir Inês Moreira. Provavelmente voltaremos a ouvir falar dela num futuro próximo.