O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) condenou esta quinta-feira a França, pela primeira vez, por verificação de identidade discriminatória, também conhecida como “perfil racial ou étnico”, que a polícia francesa é acusada de usar sistematicamente.

O tribunal considerou que a França violou a Convenção Europeia dos Direitos do Homem, no que concerne à proibição de discriminação, e determinou que o Estado terá de pagar 3.000 euros a título de danos morais ao queixoso Karim Touil.

Touil foi submetido a três verificações de identidade no espaço de 10 dias, tendo o TEDH observado que não foi apresentada qualquer “justificação objetiva e razoável” para isso, pelo que há a “presunção de tratamento discriminatório, que o Governo não conseguiu refutar”.

Embora Karim Touil tenha afirmado estar “bem ciente das dificuldades que os polícias enfrentam para decidir, muito rapidamente e sem terem necessariamente instruções internas claras, se estão perante uma ameaça à ordem ou à segurança pública”, o tribunal concluiu que, no seu caso, houve discriminação.

O tribunal, sedeado em Estrasburgo, França, rejeitou, no entanto, as queixas de outros cinco cidadãos franceses que denunciaram verificações de identidade baseadas no “perfil racial”.

Para o TEDH, as verificações efetuadas aos outros cinco requerentes não foram realizadas por motivos discriminatórios e não foi encontrada nenhuma “deficiência estrutural” a este respeito.

Esta é a primeira vez que a França é condenada por este motivo.

A decisão concluiu uma longa batalha judicial dos seis cidadãos franceses de origem africana ou norte-africana que vivem em Roubaix, Marselha, Vaulx-en-Velin, Saint-Ouen e Besançon.

Todos denunciaram “discriminação racial” em 2011 e 2012 e, depois de perderem os respetivos processos nos tribunais franceses, recorreram ao tribunal europeu em 2017.

A ação interposta apelava ao tribunal para que condenasse a França por discriminação, violação da privacidade e liberdade de circulação e para que as autoridades francesas fossem obrigadas a implementar medidas para impedir verificações discriminatórias e garantir a rastreabilidade dessas verificações.

Estes seis requerentes fazem parte de um grupo de 13 homens que iniciaram uma batalha judicial de denúncia de verificações injustificadas, por vezes associadas a revistas, insultos ou tratamento informal.

Depois de terem perdido em primeira instância, em 2013, os autores recorreram e, em 2015, o Tribunal de Recurso de Paris decidiu a favor de cinco deles, condenando o Estado a pagar 1.500 euros a cada um.

No ano seguinte, em 2016, um tribunal de recurso superior proferiu uma sentença final contra o Estado em três casos, tendo seis resolvido seguir para o TEDH.

A proporção de pessoas submetidas a verificação de identidade aumentou drasticamente entre 2016 e 2024, de acordo com um inquérito da Defensoria dos Direitos Humanos (órgão semelhante à Provedoria de Justiça) divulgado na terça-feira, para o qual foram entrevistadas 5.030 pessoas.

No ano passado, um em cada quatro inquiridos (26%) disse ter sido interpelado pela polícia pelo menos uma vez por mês nos últimos cinco anos, o que representa um aumento grande em relação aos 16% em 2016.

Os jovens árabes, negros ou norte-africanos têm quatro vezes mais probabilidades de serem sujeitos a pelo menos uma verificação de identidade do que a restante população e 12 vezes mais probabilidades de serem objeto de uma verificação mais completa (revista ou ordem de saída), revelou a investigação.