Nuno Fox

Tatuou na mão direita “Saint”, identidade construída a partir de uma relação amorosa. “Namorava com uma pessoa que disse que eu tenho essa coisa de achar que sou um santo, que estou sempre certo. Então virou uma piada para mim”, introduz Saint, antes de completar a apresentação: “Caboclo é como a minha mãe me chamava quando eu era mais novo”.

O tratamento materno, explica Saint Caboclo, neste episódio d’ O Tal Podcast, tem raízes ancestrais e culturais. “A minha família tem mistura com índios, e de onde nós somos, de Marabá, no Pará, tem essa coisa de chamar as crianças que têm mistura com índios de caboclo. Então foi assim que eu cresci”.

Desde a adolescência a viver em Portugal, o paranaense conta que foi por cá que se despediu completamente do Eudes, nome de batismo que repete a identidade paterna. “Foi como um ultimato: coloquei que o meu nome ia ser Saint e pronto – é Saint”.

A determinação reflete-se nessa tatuagem: “Está na mão com que eu cumprimento as pessoas, escrevo, seguro o microfone, com que eu faço tudo. É a minha identidade, a minha pessoa”.

Nuno Fox

Além de marca pessoal, Saint Caboclo tornou-se também sinónimo de revolução nas noites lisboetas. Criador das festas Dengo, o DJ, constrói, há quatro anos, uma comunidade que agrega, juntando pessoas de contextos, identidades e pertenças distintas.

A proposta cultural inclui as chamadas “listas trans”, que também está a tentar introduzir em Espanha. O conceito é simples: quebrar barreiras no acesso.

“As pessoas que participam nas festas Dengo sabem que o bilhete está a ser convertido para ajudar aquela amiga ou amigo trans”, aponta Saint, atento às resistências: “Claro que há pessoas que vão falar: mas por que eu tenho de pagar bilhete e essa pessoa não?”.

Sem hesitar na resposta, o DJ atira: “Talvez não entendam o conceito de comunidade, e esse evento não seja para elas”.

Nuno Fox

Firme na visão de que “a música não é suposto ser elitista”, mas sim “para todos”, o brasileiro lembra que “as pistas de dança foram criadas de uma certa forma de rebelião”.

Hoje, porém, sofrem de uma certa ‘contaminação’, alerta o artista: “As pessoas não se divertem tanto na discoteca, porque todo o mundo está com medo de ser gravado a fazer algo que não devia”.

O receio, nota Saint, vem da quantidade de câmaras que se posicionam nas pistas de danças em busca de um momento viral na internet.

Apesar de garantir que não se opõe à presença de telemóveis nas festas, o DJ vê neles uma barreira à liberdade.

“Faço parte dessa geração que publica tudo [nas redes sociais], então eu sei que sou parte do problema”, diz, revelando, contudo, que também usa o telemóvel como uma espécie de escudo. “Se estou a andar na rua, em volta de estranhos, estar com o meu telefone na cara vai-me deixar menos ansioso”.

Nuno Fox

A aprender a viver com o diagnóstico de ansiedade, Saint Caboclo assinala, nesta conversa com Georgina Angélica e Paula Cardoso, que a terapia tem sido um apoio importante. Acompanhe aqui 'O Tal Podcast'.

Nuno Fox

O Tal Podcast é um podcast semanal dedicado às relações interpessoais e aos afectos humanos. Através de conversas profundas com convidados notáveis, o podcast revela uma narrativa original e abre as portas a uma comunidade internacional de reflexão e de interesse.

Pioneiro na cultura negra e afro-descendente em Portugal, é um espaço onde cabem todas as vidas, emocionalmente ligadas por experiências de provação e histórias de humanização.

Em longas conversas sem guião, Georgina Angélica e Paula Cardoso apresentam convidados especiais, em novos episódios, todas as quintas-feiras nos sites do Expresso, SIC e SIC Notícias ou qualquer plataforma de podcasts.

Tiago Pereira Santos com Nuno Fox

Georgina Angélica é especialista em Educação e Intervenção Social. Atua como educadora, formadora e palestrante, com mais de 20 anos de experiência em Portugal, Inglaterra e Angola.

Paula Cardoso é fundadora da rede Afrolink e autora da série de livros infantis ‘Força Africana’. É ainda apresentadora do programa de TV "Rumos" , transmitido na RTP África.

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