
As tensões mantêm-se elevadas na baixa de Los Angeles com manifestantes a persistirem nos protestos contra as rusgas de imigração, mesmo após a chegada de mais militares da Guarda Nacional e de 700 fuzileiros.
Nas últimas 24 horas, quase 200 pessoas foram detidas nos protestos contra as operações da Casa Branca de combate à imigração ilegal.
"Já ficou bem claro que, enquanto houver rusgas do ICE a acontecer, os protestos vão continuar", disse à Lusa Tommy Marcus, que tem participado nas manifestações desde sexta-feira. "A forma como isto está a ser feito é inconstitucional", acusou o ativista. “Eles têm agentes à paisana, sem distintivos, a fazer isto da forma mais antiética. É repugnante.”
Lançadas múltiplas operações desde sexta-feira
O Serviço de Imigração e Controle de Aduanas dos Estados Unidos - ICE, na sigla em inglês, (Immigration and Customs Enforcement) - lançou múltiplas operações desde sexta-feira em locais onde muitos imigrantes trabalham, incluindo o distrito da moda na baixa de Los Angeles e várias localizações das lojas Home Depot, onde imigrantes procuram biscates diários.
Houve também relatos de agentes a tentar entrar em escolas, o que levou o superintendente do distrito, o português Alberto Carvalho, a tomar medidas para impedir que as cerimónias de encerramento do ano escolar fossem interrompidas.
Administração promete continuar rusgas apesar dos protestos
A chegada da Guarda Nacional e dos Fuzileiros, ordenada pelo presidente Donald Trump, tem feito escalar as tensões com os manifestantes.
O chefe de estado norte-americano voltou a avisar que as autoridades estão de prontidão para o caso de haver protestos, sobretudo no próximo fim de semana, durante as celebrações dos 250 anos do exército.
“Ganhámos a guerra e somos o único país que não a celebrou. E vamos festejar em grande no sábado. Vamos ter muitas… e se houver algum manifestante que queria sair, será recebido com muita força, já agora. Se as pessoas quiserem protestar vão ser recebidas com muita força. E eu nem sequer ouvi falar de um protesto. Mas, sabem, são pessoas que odeiam o nosso país, mas vão ser recebidos com muita força”, disse Donald Trump.
"É isto que é a democracia!”
Esta terça-feira, as forças de segurança usaram gás lacrimogéneo para dispersar os manifestantes que protestavam à porta de um centro de detenção enquanto cantavam: "É isto que é a democracia!”
A noite tinha trazido vandalismo e saques em várias lojas da baixa, incluindo joalharias e uma Apple Store, que foram atribuídos a pequenos grupos de agitadores pouco interessados na causa dos manifestantes.
"Deixem-me ser clara: qualquer pessoa que vandalizou a baixa ou saqueou lojas não quer saber das nossas comunidades imigrantes", afirmou a autarca Karen Bass em comunicado. "Vocês serão responsabilizados".
Devido ao perigo de aproveitamento da situação por parte de vândalos, a 'mayor' está a considerar impor um recolher obrigatório à noite nos bairros afetados, já que as manifestações durante o dia têm sido pacíficas.
“Quero informar a cidade de que declarei um estado de emergência local e decretei o recolher obrigatório na baixa de Los Angeles para pôr termo ao vandalismo e às pilhagens. A mensagem que vos deixo é: se não vivem ou trabalham na baixa de Los Angeles, evitem a zona. As forças da ordem prenderam as pessoas que violar o recolher obrigatório e serão alvo de um processo judicial”, disse Karen Bass, presidente da câmara de Los Angeles.
Acrescentou ainda que “centenas de agentes dos departamentos da polícia e do xerife de toda a região e do estado estão a trabalhar em conjunto com a polícia de Los Angeles através de uma estrutura de comando unificada. O recolher obrigatório estará em vigor esta noite das 20:00 às 6:00”.
"É incrivelmente desproporcional"
Tommy Marcus, que tem transmitido os acontecimentos em direto para a sua conta de Instagram(onde acumula mais de um milhão de seguidores) considera que a presença dos militares está a acicatar o problema e não a resolvê-lo.
"É incrivelmente desproporcional", apontou, indicando que a única altura em que sentiu que tinha de se afastar foi quando a polícia começou a disparar balas de borracha, porque não tinha qualquer proteção para os olhos.
"Ver isto dos Fuzileiros é alucinante para mim, como alguém que já esteve em situações muito mais fora do controlo", continuou, referenciando os protestos maciços contra a morte de George Floyd, em 2020.
"Parece-me que os agentes e o governo estão a tentar instigar e tornar a situação pior, porque é bom se puderem dizer que os democratas estão a amotinar-se e a queimar tudo", opinou. "Parece uma campanha de relações públicas a favor do ICE".
“Este descarado abuso de poder (...) inflamou uma situação inflamável”
O governador Gavin Newsom também rejeitou a necessidade de militares e entrou com uma providência cautelar junto de um tribunal federal em São Francisco, pedindo que suspenda a mobilização da Guarda Nacional e dos Fuzileiros.
"Donald Trump, sem consultar os líderes das forças de segurança da Califórnia, requisitou 2.000 membros da Guarda Nacional do nosso estado para serem enviados para as nossas ruas ilegalmente e sem motivo. Este descarado abuso de poder por parte de um presidente em exercício inflamou uma situação inflamável, colocando em risco o nosso povo, os nossos agentes e até a nossa Guarda Nacional”, afirmou o governador Gavin Newson.
Disse, ainda, que “os seus agentes estão a prender lavadores de loiça, jardineiros, jornaleiros e costureiras. Isso é apenas fraqueza. Fraqueza disfarçada de força. A Califórnia pode ser a primeira, mas é evidente que não vai acabar aqui. Outros estados são os próximos. A democracia é a próxima. A democracia está a ser atacada diante dos nossos olhos".
Tribunal recusa suspensão de emergência
O tribunal recusou a suspensão de emergência, mas marcou uma audiência para quinta-feira, na qual ouvirá os argumentos dos dois lados. De acordo com o Pentágono, o envio de militares para Los Angeles terá um custo aproximado de 134 milhões de dólares durante 60 dias.
O impacto mediático dos protestos está ainda a ter um efeito de contágio, com pelo menos 25 outros locais, de Boston a Nova Iorque, onde grupos se manifestaram contra o ICE. O próximo sábado, 14 de junho, será um teste importante devido aos eventos planeados sob o mote "No Kings" a nível nacional, incluindo quase duas dezenas no condado de Los Angeles.
"Isto não é liderança”
Os democratas do congresso norte-americano temem que Donald Trump queira impor a lei marcial, por isso, exigem que o presidente dos Estados Unidos retira as tropas da guarda nacional e acusam-no de incitar os protestos e de aumentar a tensão nas ruas.
"Isto não é liderança. É uma tentativa deliberada de Trump de incitar a agitação, testar os limites do poder executivo e distrair-se da ilegalidade da sua administração. Quando se trata de atacar os tribunais, de tentar destituir juízes, de ignorar ordens judiciais, de enviar militares, de nacionalizar ou federalizar a Guarda Nacional, é desse caminho sombrio que estamos a falar. É esse o caminho que estamos a seguir. Ele acabará por chegar a um ponto em que acabará por decretar a lei marcial, a não ser que o povo americano veja que o que se está a passar na Califórnia é uma desculpa para testar os limites da sua autoridade ou para os quebrar completamente", diz Jimmy Gomez, democrata.
O Presidente norte-americano promete manter a presença militar em Los Angeles até que haja paz nas ruas.
"Há algo de errado com estas pessoas. Tudo o que quero em termos de compromisso é ver a paz. Se houver paz, vamos embora. Se houver uma hipótese de não haver paz, ficamos lá até que haja paz. E muitas pessoas estão a ser presas. Os desordeiros ou o que quer que lhes queiram chamar, é bom que saibam que muitas pessoas estão a ser presas. Vão ficar na cadeia durante muito tempo. Precisamos manter a nossa cidade... Eu quero salvar Los Angeles. E (o governador Gavin) Newsom é totalmente incompetente. Vejam os incêndios que ele teve".
- Com Lusa