
O Presidente da República avisa o primeiro-ministro de que o país mudou. Marcelo Rebelo de Sousa considera que os portugueses deram uma vitória “personalizada” a Luís Montenegro, mas que não lhe passaram um “cheque em branco”. E retira seis lições dos resultados destas eleições legislativas.
No discurso feito, esta tarde, no Palácio da Ajuda, aquando da cerimónia de posse dos ministros do novo Governo, o Chefe de Estado assumiu como “lições” das últimas eleições que os portugueses não responderam a novas eleições com um aumento da abstenção e que o “juízo coletivo” reforçou a “confiança política” em Luís Montenegro.
Montenegro não tem "cheque em branco"
Para o Presidente da República, a “personalização” foi um “elemento decisivo” na escolha de Luís Montenegro para primeiro-ministro, mostrando que os portugueses não acharam “que se justificasse” puni-lo, após a queda do governo, na sequência da polémica com a empresa familiar do chefe do Executivo.
No entanto, notou, apesar da vitória, não foi concedida a Luís Montenegro uma “maioria absoluta”. Isto significa, defendeu Marcelo Rebelo de Sousa, que não lhe passaram “um cheque em branco".
"Os portugueses premiaram o que consideram melhor ou mais seguro ou menos arriscado, mas sem quererem converter crédito adicional em crédito ilimitado", alerta.
"O fim de um ciclo"
A penalização do PS – que caiu, pela primeira vez na História, para terceira força política no Parlamento, ficando atrás do Chega - é, para o Chefe de Estado, outra “lição”. Marca "um fim de ciclo” e um “virar de página mais pronunciado".
"As fórmulas não são eternas", declarou.
Marcelo Rebelo de Sousa insere a nova configuração política do país numa evolução europeia que "chegou mais tarde a Portugal". Sublinhou o enfraquecimento de "partidos clássicos" em favor de "novas formas políticas". Além da vaga europeia, deu também o exemplo da eleição de Trump nos EUA.
Olhando de fora para dentro, o Presidente da República fez uma viagem pela história política recente do país, lembrando a "geringonça", o aparecimento de movimentos inorgânicos - que apontou como sintomas da crise no sistema - e a fragmentação da direita. Falou do “disparo” dos preços na Habitação e de como a Administração Pública e a Justiça ficaram “descompensadas”. Tudo isto, afirmou, enquanto havia um “salto” na imigração e crescia o "medo, incompreensão e rejeição" em relação aos que entravam no país, ao mesmo tempo que os fundos europeus demoravam "teimosamente" a chegar às pessoas.
"Tudo tão depressa, tão inesperadamente, que mudara o Portugal dos anos 80, 90 e do século XXI. E mudava agora os seus hábitos de vida".
"Um Portugal muito diferente do de 1974"
No final do discurso, Marcelo Rebelo de Sousa fez questão de falar diretamente para Luís Montenegro e avisá-lo de que "Portugal mudou". Agora, alertou-o, a meta "é bem mais ambiciosa".
Segundo Marcelo Rebelo de Sousa, passa por aplicar apoios europeus, fomentar investimento e exportações, aumentar o poder de compra, não esquecendo os mais pobres e excluídos, mudar orgânicas encravadas (na Saúde, Habitação e Educação), enfrentar a guerra (com mais despesas em Defesa e o dever de manter apoio constante à Ucrânia, além do sobressalto humanitário e político quanto ao Médio Oriente).
Classificando o primeiro-ministro como "determinado" e "persistente", Marcelo Rebelo de Sousa garantiu-lhe que conta com a "solidariedade" do Presidente da República "até ao fim do mandato". Assim como de "abertura parlamentar para o diálogo" e de um Presidente da Assembleia da República "amplamente legitimado". Mas, sobretudo, com "a expectativa do povo".
"Não há tempo nem espaço para não ter esse êxito", avisou. "É chamado a comprovar que o essencial de Abril" permanece e que esse Abril "é capaz de dar futuro a um Portugal muito diferente do de 1974", concluiu.