O líder da maior contestação aos resultados eleitorais em Moçambique é um pastor evangélico que passou pelos principais partidos de oposição, mas se rebelou para abrir uma "frente independente" contra a "máquina" que governa Moçambique há meio século.


Venâncio Mondlane, escolhido personalidade do ano da lusofonia pelos jornalistas da agência Lusa, nasceu em 17 de janeiro de 1974, em Lichinga, na província de Niassa, Norte de Moçambique, é conhecido como "VM7 da política moçambicana", numa alusão a Cristiano Ronaldo, e é hoje um fenómeno entre a juventude, liderando a maior contestação eleitoral, na rua, que o país conheceu desde as primeiras eleições, em 1994.

O percurso público deste engenheiro florestal começa em 2013, quando se destacou como comentador em alguns programas de debate nos principais meios de comunicação social moçambicanos.

No mesmo ano, começa a sua carreira política no Movimento Democrático de Moçambique (MDM), a terceira força parlamentar e que acabava de ser criada em 2009, assumindo-se como uma "alternativa jovem" às duas forças políticas no parlamento: a Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), no poder, e a Resistência Nacional Moçambicana (Renamo), oposição.

No MDM, Mondlane concorreu, pela primeira vez, à presidência do Conselho Municipal da Cidade de Maputo, nas autárquicas, e, embora derrotado, conseguiu para o seu partido quase 40% dos assentos, resultado histórico que o levou a liderar a bancada do partido na assembleia municipal.

Alguns anos depois, Mondlane abandonou o MDM e, a convite do falecido líder histórico da Renamo, Afonso Dhlakama, junta-se ao principal partido de oposição. Como primeira missão, tentou "resgatar Maputo" nas autárquicas de 2018, mas volta a ser derrotado.

Um ano depois, em 2019, é eleito deputado pelo maior partido de oposição e a sua passagem no parlamento é marcada por discursos incisivos que se tornaram virais, sobretudo contra a resposta à violência em Cabo Delgado e a corrupção, principalmente em sessões de perguntas ao Governo, que classificava como "mafioso".

Em outubro de 2023, pela Renamo, Mondlane volta a concorrer às eleições autárquicas em Maputo e é derrotado por Razaque Manhique, da Frelimo, não aceita o resultado e, depois de interpor diversos recursos, lidera, em Maputo, cerca de 50 manifestações com milhares de pessoas contra aquilo que chamou de "mega fraude", algumas dela com confrontos entre manifestantes e a polícia.

O seu laço com a Renamo viria a terminar oficialmente em 2024, ano em que a sua popularidade estava em alta, ultrapassando até artistas e personalidades famosas nas redes sociais.

Como candidato independente às presidenciais de outubro, Mondlane tentou ainda uma aliança com a Coligação Aliança Democrática, mas a formação foi reprovada pelo Conselho Constitucional por alegadas irregularidades, tendo, posteriormente, recebido o apoio do Podemos, partido extraparlamentar.

Foi neste escrutínio que o nome de Mondlane ganhou espaço entre a juventude moçambicana e apostou no contacto em direto nas redes sociais, com transmissões que acumularam milhares de visualizações e comentários.


A proposta do seu manifesto durante a campanha foi, essencialmente, uma "reforma total do Estado", alertando, quase sempre, que o país viveria um "tsunami" caso houvesse fraude eleitoral.

"Pelo que tenho ouvido, esta juventude está disponível para revirar este Estado e começar uma revolução séria. E eu estarei com eles", avisava à Lusa em Chimoio, na província de Manica, no final da campanha eleitoral.

Hoje, Mondlane lidera a maior contestação às eleições no país a partir do estrangeiro, protestos com mais de 100 mortos e mais de 300 feridos em resultado dos confrontos com a polícia, com o Ministério Público moçambicano a exigir uma indemnização de 1,5 milhões de euros pelos prejuízos, num processo contra Mondlane e o partido que o apoia.

"Vamos até às últimas consequências", disse num dos seus últimos diretos nas redes sociais.