
O diretor científico do Observatório das Migrações, Pedro Góis, defendeu hoje, no Porto, a integração de mais migrantes em profissões consideradas menos prováveis, nomeadamente na educação, nas forças de segurança ou mesmo em funções militares.
"Eu costumo dar um exemplo que choca algumas pessoas: e nas nossas forças de segurança? Porque não? Faz para mim sentido que as forças de segurança possam, pouco a pouco integrar também esta diversidade que está a chegar", disse Pedro Góis no seminário internacional Migrações e Cidadania: Políticas e Práticas organizado pela Rede Europeia Anti-Pobreza (EAPN, na sigla em inglês).
Pedro Góis falava dos novos perfis de migrantes que chegam a Portugal, acrescentando a profissões e áreas habitualmente associadas a estas populações, como o turismo, a construção civil e a agricultura, outras, nomeadamente algumas menos óbvias.
Para o diretor científico do Observatório das Migrações, o desafio atual está em deixar que os migrantes acedam a todas as profissões, incluindo, disse, "algumas em que nós, nesta altura, ainda temos algumas resistências".
"Imagino que na docência do Ensino Secundário, do primeiro, segundo e terceiro ciclo, faz todo o sentido começarmos a integrar cada vez mais professores estrangeiros (...). Sou ambicioso neste ponto, vejo a médio prazo a necessidade de o nosso serviço militar também incorporar esta população, porque não faz sentido que excluamos estas pessoas de algumas funções de soberania do Estado só porque são estrangeiros. A nossa lei constitucional não permite, a nossa prática tem resistido a essa integração, mas parece-me que no médio prazo poder-se-ia abrir esta porta", acrescentou.
Lembrando que a população migrante vai aumentar um pouco mais nos próximos anos com o reagrupamento familiar, Pedro Góis apontou que "esta é uma reserva que tem de ser disseminada por toda a sociedade, por todos os setores económicos, por todas as áreas sociais".
Olhando para o auditório, cuja assistência incluía imigrantes mas sobretudo responsáveis de instituições públicas e associações, bem como autarcas locais, o diretor científico do Observatório das Migrações considerou que "ainda há muita falta de migrantes a trabalhar no terceiro setor".
Pedro Góis falou ainda da adaptação também da cultura e rotina portuguesas, dando o exemplo da comunidade muçulmana que tem a sexta-feira como dia dedicado à oração.
"É necessário adaptarmos as nossas ofertas a esta nova ocupação. Estamos habituados a funcionar a 100%, à sexta-feira (...). Não faz sentido impor a uma população que está a chegar que prescinda do seu dia, que é tradicionalmente dedicado à religião, só porque aqui é assim. Temos que fazer essa adaptação. Mas, por outro lado, se calhar o domingo vai ser um dia de trabalho para esta população. Algumas das ofertas, designadamente para a guarda de crianças, têm que ser prestadas", considerou.
Admitindo que algumas das suas ideias podem ser pouco consensuais, Pedro Góis também sugeriu que se reflita na redistribuição dos médicos de família de forma a atender os mais vulneráveis, nomeadamente a população migrante.
"Se a educação é um primeiro momento em que as crianças e os seus pais migrantes contactam com o Estado, a saúde é o segundo. Recorrem muito pouco à saúde, à saúde familiar, porque não têm direito muitas vezes a médico de família. Recorrem aos serviços de urgência porque é a única porta de entrada à qual podem recorrer. Os mais vulneráveis são aqueles aos quais temos de providenciar um médico de família com maior eficiência. Se calhar, por muito que isto possa parecer chocante, alguns portugueses como eu, como muitos de vocês que estão inscritos no Centro de Saúde e têm um médico de família, podem prescindir desse médico de família e ceder esse médico a quem, primeiramente, está a precisar", apontou.
Pedro Góis concluiu a intervenção com uma tomada de posição sobre as próximas eleições Legislativas.
"O Chega não cabe, mas temos de ser nós a dizer no dia certo que não cabe. Temos todas as outras alternativas que são possíveis. Temos que mostrar que o 25 de abril ainda nos faz pensar que não queremos outra ditadura", afirmou.