Foi no Dia da Terra e, precisamente, frente a Inês Sousa Real (PAN), a despedida de Rui Tavares (Livre) da maratona de debates nas televisões. E se a adversária tentou puxar dos galões da ecologia, o líder do Livre foi a jogo na busca da “pequena diferença”, apesar de reconhecer que “é muito mais o que nos une do que nos separa”. Mas se a ecologia e o combate às alterações climáticas marcaram o ameno debate, habitação, saúde, violência doméstica e até uma notícia de última hora, não faltaram.

Coube a Inês Sousa Real dar o pontapé de saída e fê-lo defendendo, desde logo, que o PAN tem sido "uma voz isolada na proteção animal". A título de exemplo referiu o processo de revisão constitucional de 2023/2024, vincando que o Livre não incluiu na sua proposta a proteção animal ou o fim da extração de minerais em mar profundo.

Evitando a resposta direta, Rui Tavares defendeu que “todos os partidos da ecologia e do progresso devem crescer”, lembrando que “temos 800 mil votos que se perderam para o campo conservador e que devem ser recuperados”.

“O Livre tem uma ecologia que alarga e que não nos afunila, pela mera afirmação da minha convicação ecológica, sinto-me bem mas nem sempre persuado aqueles que não partilham das mesmas convicções. Se inserir a ecologia numa visão para o desenvolvimento futuro do país e explicar às pessoas que Portugal é um país rico no seu potencial de energias renováveis, de transição ecológica tecnológica, (…) na biodervisaiddade, na diversidade paisagística, (…), apesar de dominado pelo dinheiro fácil e no turismo de massas. (…) Se conseguir [fazê-lo essa riqueza converte-se em prosperidade para todos"

Mas Inês Sousa Real contrapôs, afirmando que “em 11 meses e com quatro deputados, o Livre não agendou uma única iniciativa sobre ambiente ou ecologia, foi uma oportunidade perdida”. Ora, Rui Tavares refutou, tirando da cartola o programa 3C - Casa, Conforto e Clima e a criação de uma rede de transportes ecológicos em zonas de baixa densidade, que considerou serem simultaneamente “sociais e ecológicos”.

“A questão está precisamente na visão que nós temos da ecologia. (...) A ecologia não é, nem nunca poderá ser, uma causa de nicho. A ecologia tem de ser uma visão integrada para o país como um todo”

Francisco Romão Pereira/RTP

SNH para habitação e SNS Animal

Se a ecologia não os uniu, no tema habitação a aposta centrou-se (também) nos diferentes caminhos que defendem. Para o Livre é preciso “regulamentar” através da criação de um Serviço Nacional de Habitação (SNH), que teria como objetivo garantir o direito universal à habitação, que, adiantou Rui Tavares, teria um custo anual de mil milhões de euros que seria financiado por “uma taxação sobre os lucros extraordinários das áreas económicas que têm lucrado com a crise no imobiliário”, referindo as imobiliárias e a banca.

Já para a líder do PAN, a solução para as políticas de habitação - “um dos maiores falhanços de sucessivos governos” - é acabar com o regime de residentes não habituais para implementar medidas como reduzir o IVA para a reabilitação de prédios e garantir o financiamento para cooperativas de habitação.

“O dinheiro existe, acabemos com o regime dos residentes não habituais, que vem contribuir para a especulação, baixemos o IVA para reabilitar porque a curto prazo não vamos conseguir com a construção resolver a crise na habitação, e [defendemos] que sejam reabilitados e colocadas no mercado habitações do Estado”

Mudando o tema para a Saúde, o líder do Livre alertou para “a concorrência desleal” que o SNS enfrenta, apesar de a pandemia, por exemplo, ter provado que “quando tem recursos está entre os melhores do mundo".

“Agora [o SNS] não pode estar numa situação de concorrência desleal a lutar com uma veda nos olhos e os braços atados atrás das costas. Concorrência leal é o público saber do privado”

Apesar concordar, a líder do PAN lembrou (novamente) a saúde que a própria Organização Mundial da Saúde (OMS) defende - humana, animal e do planeta -, dizendo ser “fundamental” mais contratação, mas também uma “aposta na saúde de proximidade, na saúde mental - defendendo o rácio de um médico para cada 500 jovens -, e estratégias de combate à solidão, à ansiedade nos jovens, e a baixa remunerada a 100% para doentes oncológicos”. Mas não só.

“50% dos lares têm animais de companhia, queremos um SNS animal cuja verba seja canalizada dos fim dos apoios públicos dados às touradas. 18 milhões de euros/ano (…) que seriam canalizados para a uma rede de serviços públicos veterinários e à baixa do IVA da saúde animal”

Francisco Romão Pereira/RTP

Unidos contra a violência

Nos últimos minutos do debate, houve espaço para vários temas, entre os quais o da violência doméstica. Inês Sousa Real optou por apresentar números reais, defendendo que “não podemos ter uma guerra silenciosa de sexos”. Todos os anos, há “34 mil denúncias de violência doméstica", os crimes de violação aumentaram 10%", e são ”vidas que ficam completamente destruídas".

“Temos de ter um compromisso, de Governo e lideres partidários, para que este combate seja uma efetiva prioridade de todos, (…) só assim poderemos ter um combate mais eficaz", apelou a líder do PAN, sugerindo que a violação seja “um crime público” e que “órfãos de violência doméstica tenham direito a uma pensão do Estado”.

Concordando com a preocupação e com a necessidade de um "combate de unidade", Rui Tavares sugeriu ainda a atribuição de um subsídio de desemprego a vítimas de violência doméstica, sustentando que este crime é muitas vezes acompanhado de ”vulnerabilidade financeira".

Os dois líderes foram ainda questionados sobre a decisão de última hora do Tribunal Constitucional, que decidiu esta terça-feira declarar inconstitucionais algumas normas da lei que regula a morte medicamente assistida. O líder do Livre prometeu “ler com atenção” o acórdão, mais crítica, Inês Sousa Real lamentou “profundamente a decisão”, considerando que o país "já tem levado muito tempo" em regulamentar a eutanásia.