Foram precisos 20 anos de um "processo longo e complexo", que foi preciso adaptar e compatibilizar com os legítimos interesses de diferentes entidades em defesa da região, do ambiente, do desenvolvimento local. Mas finalmente o primeiro projeto turístico da Riberalves parece estar pronto a avançar. O grupo familiar 100% português que todos conhecemos por nos trazer à mesa bacalhau desde 1985, dono da maior fábrica mundial do setor, que produz 30 mil toneladas de bacalhau por ano (8% a 10% do total pescado no mundo) — e que já se expandira ao café (NovoDia, desde 1998), ao vinho (com a AdegaMãe, desde 2010) e à imobiliária —, estreia-se agora no turismo.

Reduzida a área de implantação a cerca de 16,5 mil metros quadrados, que albergarão 936 camas (originalmente estavam previstas perto de mil) no que resta dos edifícios onde se fazia localmente a seca do bacalhau e sem novas edificações, o complexo Praia dos Moinhos, em Alcochete, está em consulta pública até quarta-feira. E se tudo correr conforme se espera, daqui a uma semana o projeto, um investimento que se fixará "entre os 100 e os 120 milhões de euros", estará em condições de avançar.

"A prioridade agora é o licenciamento", conta ao SAPO Bernardo Alves, administrador do grupo que fatura mais de 200 milhões de euros, um terço em exportações, e que confirma que, entre o desenvolvimento de projetos de arquitetura detalhados e outros procedimentos que se seguem à consulta pública, a obra deverá arrancar dentro de um ano. "Depois, serão uns quatro anos para se concluir o projeto, que queremos inaugurar em 2029", antecipa, em entrevista ao SAPO, apontando que os "100 a 120 milhões de investimento deverão cumprir-se com parcerias e recurso a algum capital externo (fundos, banca...), estando vários cenários em negociação".

Para quem esperou 20 anos para avançar, cinco parecem pouco. Mas Bernardo Alves não retira importância ao processo que se prosseguiu nestas duas décadas. "Era importante conciliar todas as vontades e todas as entidades foram muito cooperantes na tentativa de se chegar a uma solução que permitisse conciliar posições e desembocasse num projeto que conjugasse da melhor forma os interesse de todos." Mesmo que isso implicasse reduzir a ambição inicial do complexo turístico e alterá-lo. "O projeto final é substancialmente mais pequeno do que o original e, por exemplo, não prevê estacionamento subterrâneo; além disso, a implantação respeita na íntegra os edifícios que já existem e será adaptada para proteção maior das pessoas e bens através da construção sobre pilotis" (colunas que elevam o edifício, deixando livre o nível térreo), explica ao SAPO.

Pai e filhos Riberalves
Pai e filhos Riberalves Bernardo (à esq.) e Ricardo com o pai, João Alves, gerem o grupo Riberalves créditos: DR

As soluções adaptadas darão prioridade à proteção do ambiente, vinca ainda o responsável do grupo Riberalves (por curiosidade, o nome vem da primeira sílaba do nome de cada um dos dois filhos do fundador, João: Ricardo e Bernardo), apontando como exemplos a +preservação das salinas e o reforço das medidas de compensação e minimização dos impactos ambientais como a construção de barreiras no contorno das salinas de forma a reduzir ao mínimo a perturbação das aves que ali nidificam e vivem, bem como o condicionamento de trânsito e movimento de pessoas nessa área.

Os edifícios existentes são o que resta das antigas secas do bacalhau que a Riberalves Imobiliária comprou ao Estado: a Sociedade Nacional de Armadores de Bacalhau, em 1997, e a Sociedade Europeia de Aquacultura, em 2006. "Nessa altura, havia até a possibilidade de ali instalarmos uma nova unidade da Riberalves, mas até por impulso da autarquia acabámos por mudar de ideias. A câmara, até por causa do que previa o PDM, apoiou-nos na criação de um empreendimento turístico que pode trazer também desenvolvimento à região", conta Bernardo Alves. Esse desenvolvimento não se esgota na dinamização da área e na criação de uma oferta diversificada, nem sequer nos milhões de investimento previsto.

O Conjunto Turístico da Praia dos Moinhos, antecipa o empresário, deverá criar 150 postos de trabalhos diretos. E ainda ajudará a criar soluções para os muitos turistas que o novo aeroporto de Lisboa ali levará quando estiver a funcionar. "É uma mais-valia que funciona nos dois sentidos, porque nos trará clientes mas também nós ajudaremos com a criação de uma oferta turística num local onde existe muito pouca."

Prevista ainda para o local está a requalificação de um dos edifícios como museu dedicado ao local, "homenageando as pessoas que ali passaram e a atividade que se desenvolveu naquela área", conta ainda ao SAPO Bernardo Alves, elencando ainda a recuperação das salinas do Brito e do Vale de Frades e um plano de monitorização no decurso da execução do projeto "para avaliar a evolução das espécies de interesse conservacionista", bem como a "recuperação da vegetação dunar e a erradicação das espécies invasoras".