Há quase duas décadas que Vera Guimarães, de 44 anos, vive diariamente com dores intensas e permanentes nas articulações, provocadas por uma doença rara do tecido conjuntivo. Mas mesmo que esteja a "ganir como um cão", é raro falar sobre isso com outras pessoas, incluindo com médicos, porque "normalmente a resposta é um encolher de ombros".

Nuno Fox

"Não merece muito a pena eu despender a minha energia [a falar sobre a dor] para receber um encolher de ombros [dos outros], mesmo dos profissionais de saúde (...)", conta, no mais recente episódio do podcast "Que Voz é Esta?". A dificuldade em abordar a dor crónica e a ideia errada mas ainda muito disseminada de que há pouco a fazer levam frequentemente a uma desvalorização do problema, nomeadamente por parte dos médicos. "Dizem-me "Não lhe vou dar mais do que já está a tomar. Tem de gerir a dor”, relata.

Nuno Fox

Também convidada do podcast, Rute Sampaio, especializada em Psicologia da Saúde, investigadora na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto e membro da direção da Associação Portuguesa para o Estudo da Dor, concorda que ainda "há uma tendência dos profissionais de saúde para desvalorizar a dor crónica" e para a tratar apenas com medicação, quando esta é manifestamente insuficiente para abordar o problema.

"A dor vai muito para além da questão física. Todos os fatores emocionais, sociais e psicológicos implícitos fazem dela uma experiência única, muito subjetiva e complexa. Por isso, não pode ser abordada só pelo especialista daquela área; tem de envolver também o psicólogo, o terapeuta ocupacional e todo um conjunto de profissionais para ajudar o doente a gerir a dor”, salienta.

Nuno Fox

Viver com uma dor intensa, recorrente ou constante, afeta profundamente o dia a dia e as relações sociais e pode levar ao desespero e a sentimentos de inutilidade, desencadeando ou agravando problemas de saúde mental. É sabido que a maioria das pessoas com dor crónica sofre de ansiedade e 30 a 50 % têm depressão. Mas a relação entre a dor crónica e a saúde mental é bidireccional, já que o estado psicológico dos doentes também pode contribuir para exacerbar a própria percepção da dor.

O impacto da dor crónica na saúde mental é o tema do novo episódio do podcast "Que Voz é Esta?", onde se abordam questões como o papel do apoio familiar e a importância do acompanhamento psicológico ou as melhores estratégias para manter a identidade e a autonomia na dor crónica.

Tiago Pereira Santos e João Carlos Santos

Nesta temporada do podcast "Que Voz É Esta?", as jornalistas Joana Pereira Bastos e Helena Bento exploram emoções como culpa, vergonha ou raiva com mais casos reais e com a participação de especialistas na área da saúde. Ouça aqui mais episódios: