O projeto «Maria d’Alegria», incubado no Centro de Inovação Social da Fundação Eugénio de Almeida desde 2021, foi recentemente um dos três selecionados no âmbito do instrumento «Parcerias para o Impacto», promovido pela Portugal Inovação Social. Com este apoio, a iniciativa irá ampliar a sua intervenção junto de idosos isolados no Alto Alentejo, levando-lhes alegria, bem-estar e atividades artísticas.

Uma ideia que nasceu da pandemia

Maria Simões, atriz e palhaça social, conta que a génese do projeto remonta ao período da pandemia, quando participou num curso de empreendedorismo social promovido pela Fundação Eugénio de Almeida.
Nessa altura, as visitas que realizava a lares de idosos foram suspensas devido às restrições sanitárias. Para manter o contacto, começou a cumprimentar, à janela, residentes de instituições próximas da sua casa, em Castelo de Vide. «Era uma alegria muito grande para elas e para mim», recorda.
A experiência despertou a atenção para uma realidade menos visível: a dos idosos que vivem sozinhos, fora de instituições, sobretudo em zonas rurais. «No distrito de Portalegre existem cerca de três mil idosos isolados. É um número gigante e não encontrei nenhum projeto que respondesse de forma específica a estas pessoas», sublinha.

De piloto local a intervenção regional

A primeira fase do «Maria d’Alegria» começou como um projeto-piloto, com visitas ao domicílio nos concelhos de Castelo de Vide e Marvão. Com o tempo, foi desenhada uma metodologia própria, sem paralelo identificado no país, que combina a palhaçaria com outras formas de expressão artística.
Com a aprovação da candidatura ao instrumento «Parcerias para o Impacto», o projeto passa a abranger 11 concelhos do Alto Alentejo: Elvas, Gavião, Crato, Ponte de Sor, Castelo de Vide, Nisa, Monforte, Avis, Arronches, Campo Maior e Marvão.
O financiamento assegura 80% dos custos através de fundos europeus e da Segurança Social, ficando os restantes 20% a cargo de investidores sociais.

Equipa multidisciplinar e novas áreas artísticas

A intervenção deixa de estar centrada apenas na figura da palhaça social, passando a integrar cinco artistas no terreno, em duplas, com competências em artes plásticas, arte têxtil, fotografia, escrita criativa e cerâmica.
Cada dupla realiza, em média, seis visitas por semana. As deslocações são regulares, inicialmente com periodicidade semanal, podendo ser espaçadas à medida que os beneficiários ganham maior autonomia e integração social.

Mais do que visitas: capacitar e criar rede

O projeto inclui ainda ações de capacitação para técnicos de municípios e de Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS), transmitindo a metodologia e a abordagem desenvolvida. A intenção é que, após a intervenção direta da equipa, os técnicos locais deem continuidade ao acompanhamento.
Maria Simões sublinha que o objetivo é «reduzir o isolamento social, aumentar a autoestima e a participação comunitária dos idosos» e, ao mesmo tempo, «sensibilizar a sociedade para a importância de criar redes de apoio locais».

Obstáculos e realidade social

Apesar do trabalho em expansão, Maria Simões reconhece que o número de beneficiários abrangidos é reduzido face ao universo de idosos isolados na região. «Vamos chegar a muito poucos, comparando com a realidade, mas é um princípio», afirma.
Para a fundadora, o combate ao isolamento não significa tirar as pessoas das suas casas, mas sim garantir que mantêm relações sociais frequentes e acesso a atividades culturais. Muitas vezes, refere, «o problema não é falta de vontade, mas sim a ausência de transporte ou de redes de proximidade».

Uma questão de comunidade

A sensibilização da população é apontada como uma das chaves para enfrentar o problema. «Cada um de nós pode fazer parte da rede social de outra pessoa. Eu faço parte da rede social de pessoas que não são minhas familiares diretas, e espero que alguém faça o mesmo pelos meus pais», partilha.
O projeto quer, assim, não só intervir junto dos idosos, mas também fomentar uma consciência comunitária que permita diminuir o isolamento a longo prazo.