A polémica em torno da divulgação de uma lista de nomes de crianças, muitos deles de origem estrangeira, durante um debate parlamentar voltou a ganhar força esta segunda-feira, depois de Rita Matias, deputada e dirigente do Chega, ter admitido publicamente que o partido não confirmou a veracidade da informação que apresentou no Parlamento.

Em declarações à Rádio Observador, Rita Matias reconheceu que a lista de nomes lida pelo líder do partido, André Ventura, durante a discussão sobre a lei da nacionalidade e imigração, não foi verificada. “O Chega recebeu a lista. Não fez uma confirmação de maior, não fomos ver qual era a escola”, afirmou, gerando ainda mais controvérsia num caso que já incendiara o debate político nacional.

O episódio em causa ocorreu na semana passada, quando André Ventura levou ao hemiciclo uma folha com nomes de crianças, a maioria de origem estrangeira, que afirmou pertencerem a uma escola portuguesa. O objetivo, segundo o próprio, era ilustrar o que considera ser uma “mudança cultural e civilizacional” em curso no país. A intervenção provocou de imediato um clima de tensão entre os deputados, com vários partidos da esquerda a denunciarem o que consideraram ser uma instrumentalização de menores para fins políticos.

A deputada Rita Matias replicou o gesto num vídeo publicado no seu Instagram, onde lê a mesma lista e escreve: “Não, não me enganei. É mesmo uma lista de uma escola portuguesa.” A publicação gerou múltiplas críticas, sobretudo após se verificar que nenhuma escola foi identificada nem confirmada como origem da referida lista.

“Fiquei surpreendida por perceber que a extrema-esquerda é que se deu ao trabalho de ir ver a escola”, atirou Rita Matias no mesmo programa, criticando o destaque dado ao caso. “Se não tivessem feito tanto alarido, o vídeo passava absolutamente normal”, acrescentou.

A legalidade da divulgação de nomes de menores no Parlamento foi, entretanto, questionada por vários constitucionalistas e políticos. Embora Ventura tenha optado por não referir apelidos, para evitar identificações completas, a ação foi considerada, por muitos, como uma violação ética grave.

Isabel Moreira, deputada do PS, recordou que a Constituição protege os direitos das crianças e classificou o episódio como uma utilização abusiva de menores em contexto político. A mesma deputada fez ainda questão de frisar que o nome “Cid”, apelido de Rita Matias, tem origem islâmica — o que a deputada rejeitou categoricamente, pedindo “respeito” pela sua família e garantindo que “Cid é um nome português e não tem qualquer alusão à comunidade muçulmana.”

Do lado do Livre, o deputado Paulo Muacho afirmou que o partido estuda apresentar queixa contra André Ventura e Rita Matias. “Estamos a avaliar essa questão. Há muitas pessoas indignadas com esta instrumentalização de crianças para fins políticos”, disse no mesmo programa.

A controvérsia agravou-se com acusações cruzadas: de um lado, o Chega acusa à esquerda de querer silenciar o partido e atacar o seu crescimento eleitoral; do outro, partidos como o Bloco de Esquerda e o Livre acusam o Chega de alimentar o ódio e a xenofobia através da manipulação de dados e da exposição indevida de menores.

No Parlamento, a líder bloquista Mariana Mortágua reagiu apontando o paradoxo de um partido que tem um deputado com o nome Marcus Vinicius criticar nomes estrangeiros, e classificou o ato como “vergonhoso”.

Com este novo desenvolvimento, a polémica não dá sinais de abrandar e poderá ainda resultar em implicações legais ou disciplinares. A divulgação de dados sensíveis sem verificação, num ambiente de debate político, levanta questões de fundo sobre a ética e os limites da retórica parlamentar.