Os azulejos que revestiam as salas mais requintadas e os aposentos de D. Teodósio I (1510-1563), 5.º Duque de Bragança, no Paço Ducal de Vila Viçosa têm quase 500 anos de vida. Saíram das oficinas de Antuérpia, onde foram encomendados pelo Duque por volta de 1558 e estão identificados como o "primeiro programa azulejar renascentista do país", sendo por isso considerados um tesouro nacional. E que pode ser visto, porque temos a felicidade de ter hoje este tipo de obras-primas no espólio de casas que os mostram a todos, em lugar de os reservar para alguns afortunados, no Museu Berardo Estremoz (MBE).

A coleção faz parte das novidades que, após cinco anos aberto ao público, o MBE apresenta para celebrar este percurso, e que passa também pela remodelação de "diversas salas expositivas com as novas aquisições, engrandecendo grande parte dos núcleos históricos e alargando o espetro geográfico e cronológico da coleção de azulejaria", explicam os responsáveis do museu, apontando que a coleção se expande com azulejos vindos desde a Europa Central (França, Itália, Países Baixos e Bélgica) até ao Médio Oriente (Egito e Tunísia).

Coleção de azulejos Museu Berardo Estremoz
Coleção de azulejos Museu Berardo Estremoz créditos: MBE

Se já acha que tudo isto é apenas história, para comemorar os cinco anos o Museu Berardo Estremoz, que se assinalam já nesta sexta-feira, e enaltecer os 800 anos de História do Azulejo que ali se contam, quis pôr a azulejaria a falar com a produção nacional contemporânea. Desta vontade nascem cinco obras extraordinárias em que Alexandre Farto aka VHILS é o protagonista em diálogo com os azulejos in situ da escadaria do Palácio Tocha: uma prova de que o século XVIII e a arte contemporânea podem ter muito que dizer-nos em conjunto.

Vencedor do Prémio SOS Azulejo 2019-2020 o Museu Berardo Estremoz nasceu de uma vontade conjunta da Coleção Berardo e da Câmara de Estremoz, assumindo a missão de apresentar a maior e mais importante coleção privada de azulejos do país. Instalado no histórico Palácio Tocha, onde as obras expostas se fundem com o património edificado, o museu exibe ainda, no pátio e jardim, um conjunto de esculturas de mármore assinadas por Paulo Neves. A cumprir os primeiros cinco anos de vida, o Museu Berardo Estremoz quis dar um sabor especial a quem o visita com esta renovação, em cuja conceção participaram os comissários da exposição inaugural — o professor doutor Alfonso Pleguezuelo, da Universidade de Sevilha e o historiador José Meco, da Academia Nacional de Belas-Artes, bem como, Ángel Sánchez-Cabezudo e Susana Varela Flor — e que pode ver a partir de sexta, dia 4, a partir das 12.00.

Coleção de azulejos Museu Berardo Estremoz
Coleção de azulejos Museu Berardo Estremoz créditos: MBE

E os grandes nomes estão lá todos. Sejam os associados à revolução renascentista dos inícios da azulejaria de majólica, como Masséot Abaquesne, "com um painel de azulejos de pavimento com o monograma do Condestável Anne de Montmorency (1493-1567), executados em Rouen (c.1549-1551), provenientes do Castelo d’Écouen (hoje Museu Nacional do Renascimento), França", ao azulejo de pavimento com o brasão de armas da família Piccolomini, datado de cerca de 1492, proveniente da Biblioteca a que a família deu o nome, na Sacristia da Catedral de Siena, passando pelo painel pintado em majólica que imita padrões mudéjares inspirados nos azulejos de aresta sevilhanos, da primeira metade do século XVI, do Palazzo Pavese, em Génova. Os responsáveis destacam ainda o azulejo de pavimento das oficinas de Guido Andríes (Guido di Savino), "vindo do pavimento do grande coro da Abadia de Herkenrode, atualmente Musées Royaux d’Art et d´Histoire, em Bruxelas", que se demarca na exposição pela sua forma pouco usual.

Coleção de azulejos Museu Berardo Estremoz
Coleção de azulejos Museu Berardo Estremoz Azulejo de pavimento com brasão de armas da família Piccolomini (esq.) e Azulejos da Flandres, do Paço Ducal de Vila Viçosa; Majólica créditos: MBE

Entre uma coleção generosa e com peças colhidas nos quatro cantos da terra, a Coleção Berardo, "com reputação internacional no espetro da Azulejaria Portuguesa e Espanhola, comprou algumas dezenas de painéis, com vista a reforçar o discurso dos principais movimentos artísticos que percorreram a produção nacional", explicam ainda. E apontam novo exemplo na presença no Museu Berardo Estremoz de um dos grandes nomes do Ciclo dos Mestres: Manuel dos Santos (que produziu de 1690 a 1725) está ali representado com os painéis Cena Campestre e Cena Fluvial. Há ainda obras colhidas em diversas regiões do país, como os painéis recuperados da Quinta dos Chavões, no Cartaxo, e restaurados na Fundação Ricardo Espírito Santo Silva, "que retratam cenas com macacarias, do quotidiano e cenas inspiradas na mitologia" e que são apresentados como "um dos melhores exemplares da azulejaria do século XVII em contexto museológico".

O MBE funciona todos os dias, das 10.00 às 19.00 no verão e das 9.00 às 17.30 no horário de inverno. E vale bem uma visita para conhecer quase mil anos de História, contada aos quadradinhos.