
A polémica está instalada. Madalena Sá Fernandes, reconhecida escritora e cronista do jornal Público, acusou João Pedro George de "misoginia e machismo", nas redes sociais. Em causa estão os mais recentes comentários que o sociólogo e crítico literário português fez.
Tudo aconteceu durante o mais recente episódio do podcast Quinteto Literário: Conversas na Livraria Martins, disponível no YouTube desde fevereiro deste ano, 2025.
Em conversa com o condutor do formato, Miguel Szymanski, e com a escritora Ana Bárbara, João Pedro George fez uma análise sobre o livro que catapultou Madalena Sá Fernandes no mundo literário, Leme, que conta a história de uma relação tóxica. E foi a partir daqui que alegadamente as coisas não correram tão bem.
É que mais adiante, foi também analisada a forma como a autora deu a conhecer o seu novo trabalho, Deriva, e aos olhos de Madalena Sá Fernandes, o também escritor foi, nesse momento, um "homem triste". A denúncia foi feita na sua conta de Instagram, através da partilha de um trecho do vídeo, esta segunda-feira, 24 de março.
"Ouçam porque vão aprender que há um rosto para a violência doméstica. É só mais um homem triste incomodado porque eu sorrio. Porque tenho fotografias de calções ou de macacão com flores (?). Um homem triste", começou por escrever na legenda do registo.
"Nunca rebateria uma crítica literária. Mas aqui inaugura-se a crítica às fotografias de Instagram, à vida pessoal, e a extraordinária crítica ao sorriso de quem sofreu. A analisar o meu corpo e a pedir pareceres. E depois perguntam porque é que as mulheres insistem em escrever sobre o que vivem. É porque ainda há muito caminho. É porque ainda há pessoas como vocês.A objetificação costuma ser menos gritante. Aqui temos misoginia e machismo sem a menor vergonha. Homens tristes e mulheres que compactuam. Ganhem vergonha", continuou Madalena Sá Fernandes, deixando não só uma confissão como uma promessa.
"Pensar que disse ao meu amigo para lhe fazer companhia, por ter pena de o ver sozinho na Feira do Livro. Continuarei a escrever sobre o que eu quiser. E não abdico do meu sorriso. Não abdiquei por todas as violências que sofri; não vou abdicar por homens tristes, solitários, invejosos.Empenho-me muito no meu trabalho, mas sou mulher", concluiu, como se pode verificar imediatamente abaixo.
A verdade é que a partilha da escritora ganhou destaque e levou a que várias vozes bem conhecidas do público português - de inúmeras áreas - se erguessem do seu lado, nos comentários.
"Coitado… Enganou-se, achava que estava na tasca com os amigos… Ah! E achou que estávamos em 1950", disse Júlia Palha.
"Fez bingo no cartão do macho ultrapassado. Duvidar do mérito sempre, dizer que deve ser cunha, pedir o recato e a cabeça baixa das vítimas, tudo para não ter de lidar com o talento de uma mulher bem sucedida. Um clichê que diz muito de si mesmo e nada de quem critica", referiu Capicua.
"Ia dizer que isto é a versão crítico literário do clássico dos taxistas 'andam vestidas daquela maneira e depois admiram-se', só que não há aqui versões. Na sua essência, o taxista e este senhor são rigorosamente a mesma coisa, porque não interessa para nada qual deles leu mais livros que o outro", criticou Nuno Markl.
"Isto não será IA [inteligência artificial]? É mau demais para ser verdade", "Que vergonha. Inacreditável" e "Que tristes, ressabiados, invejosos e misoginos", proferiram Inês Aires Pereira, Rita Patrocínio e Iva Domingues, respetivamente.
Mas as críticas à postura de João Pedro George não se ficaram por aqui. Também através dos próprios stories - ou publicações - das suas contas de Instagram, nomes como Ana Markl, Bruno Nogueira, Martim Sousa Tavares, Albano Jerónimo e Jessica Athayde se mostraram incrédulos com o que ouviram o crítico literário comentar.
"Não era essa a minha intenção" - João Pedro George já se pronunciou
Dada a polémica, João Pedro George viu-se 'obrigado' a pronunciar-se. Na partilha de Madalena Sá Fernandes, o sociólogo deixou um comentário e falou num "mal-entendido".
"Tendo em conta o mal-entendido gerado por algumas afirmações minhas na sequência de um comentário sobre o marketing do livro 'Deriva', da escritora Madalena Sá Fernandes, queria esclarecer o seguinte: estou ciente de que referir a aparência de uma mulher tem um longo historial na cultura patriarcal e machista e que convocar esse elemento numa conversa pública é errado e infeliz", começou por escrever.
"Peço assim desculpa por tal associação de ideias, porém, não era essa a minha intenção. Em nenhum momento pretendi estabelecer uma correlação entre a qualidade da obra e a sua promoção nas redes sociais. A minha abordagem tem visado quase sempre a literatura como fenómeno social e como fonte de análises sociológicas. Nesse sentido, avaliar a semiótica de autores e autoras – sem distinção de género –, no âmbito do meio editorial, é um exercício que venho praticando, de forma descontraída e caricatural. Admito que a minha liberdade crítica, por vezes sarcástica, possa criar desconforto e volto a lamentar a referência adjectivada à forma como a autora divulgou o livro debatido no programa 'Quinteto Literário'", concluiu.