Levantando o olhar para a bancada Peter Taylor, o difícil é não o ver: é lá que Evangelos Marinakis se senta numa espécie de pequeno trono instalado na tribuna presidencial do City Ground, o centenário estádio do Nottingham Forest. Desde maio de 2017 que o terceiro homem mais rico da Grécia juntou ao Olympiacos (que comprou em 2010) a equipa que, no final dos anos 70 e início dos 80, deixou o mundo de queixo bamboleante ao sagrar-se bicampeã europeia, com o mais que mítico Brian Clough ao leme. Os anos 90 não foram, no entanto, simpáticos, com a descida ao Championship. Muito menos o início do século XXI, quando o Forest chegou a andar pela terceira divisão do futebol inglês.

O plano de Marinakis de levar o Forest de novo à Europa em cinco anos revelou-se ambicioso. Mas não louco. Foi apenas adiado. Depois de voltar à Premier League em 2022, pela primeira vez desde a época 1998/99, a chegada de Nuno Espírito Santo, em dezembro de 2023, estabilizou a equipa no principal escalão: o técnico português conseguiu, à queima, manter o Forest na primeira divisão em 2023/24. E esta época os tricky trees foram mesmo a surpresa maior da Premier League, namorando os lugares da Champions durante boa parte da temporada, mesmo com um estilo pouco comum, apostando nas transições e com muito pouca posse de bola.

O prometido regresso à Europa, 30 anos depois, foi confirmado na jornada do último fim de semana, no empate com o Leicester. O Forest não será menos do que 7.º na Premier League, que garante um lugar na Liga Conferência. Três jogos consecutivos sem vitórias tornaram, no entanto, a Liga dos Campeões um objetivo mais difícil. Perder pontos com o penúltimo classificado também não estaria nos planos de Marinakis. E, por isso, a descida do armador ao relvado para interpelar Nuno Espírito Santo foi inicialmente vista como uma exagerada e inopinada reação do proprietário a um resultado adverso.

Na Grécia, é possível que tal atitude fosse vista como mais um dia na vida de Marinakis, conhecido tanto pela sua riqueza como pela falta de paciência. A fama precede-o: desde que assumiu o controlo do Olympiacos que o banco da equipa do Pireu já assistiu a 24 trocas de treinadores, entre técnicos permanentes e interinos. Muitos deles não aguentam mais do que um par de meses no cargo. Como Carlos Carvalhal, por exemplo, que saiu do clube em fevereiro de 2024, dois meses depois de chegar, quando a direção decidiu interferir nas suas decisões desportivas.

Mas, na Premier League, nada disto é comum. Mal viu Marinakis irromper campo adentro, Gary Neville foi lesto de dedos a criticar o grego no X, sublinhando que Nuno deveria apresentar a demissão depois de tal “escandaloso” espalhafato. Jamie Carragher, outro futebolista tornado homem de opinião ao microfone, apelidou o comportamento de Marinakis, que é também proprietário do Rio Ave, de “vergonhoso”.

Mas a verdade sobre aquele momento mais quente no relvado do City Ground estará algures a meio.

Uma lesão como gatilho

As notícias vindas de Nottingham na manhã desta quarta-feira são preocupantes. O avançado Taiwo Awoniyi foi colocado em coma induzido após uma cirurgia urgente ao abdómen, resultado da lesão sofrida no jogo de domingo. Diz o “The Guardian” que, no entanto, não há risco de vida para o jogador e que a decisão da equipa médica prende-se com a estabilização do ritmo cardíaco de Awoniyi. O nigeriano embateu com força no poste da baliza do Leicester, ainda tentou continuar em campo, mas rapidamente se perceberam as dificuldades que estava a sentir.

Por já ter esbanjado os três momentos em que podia fazer substituições, a última das quais já depois do embate de Awoniyi com o poste, o Forest foi obrigado a jogar com menos um durante os últimos minutos do jogo - Taiwo continuou em campo, mas praticamente sem se mover. A comunicação do Nottingham Forest garante que, mais do que o resultado em si, foi a forma como se lidou com a lesão e a preocupação com a saúde de Awoniyi que levou Marinakis a descer ao relvado para falar com Nuno Espírito Santo.

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No final do jogo, e já depois das declarações de Gary Neville, o treinador português desculpou as ações de Marinakis, justificando-as com um “mal-entendido entre a equipa técnica e o staff médico”. Inicialmente, o avançado terá dado uma indicação com um gesto que o treinador entendeu como um OK para continuar e por isso decidiu seguir com outra substituição, tirando Elliot Anderson para fazer entrar o português Jota Silva. Mas Awoniyi não conseguiu mesmo continuar, numa altura em que o Forest procurava a vitória.

“Houve desilusão e frustração, claro. Mas é por causa da paixão do dono que estamos a crescer como clube. Ele puxa por nós, quer que sejamos melhores”, sublinhou Nuno Espírito Santo, que preferiu não comentar as palavras de Neville.

A defesa da honra de Marinakis

Já depois da operação de urgência de Taiwo Awoniyi, na terça-feira o Nottingham Forest lançou um duro comunicado, com uma defesa acirrada da honra de Evangelos Marinakis, justificando as suas ações.

“A gravidade da lesão [de Awoniyi] é um alerta forte sobre os riscos físicos deste jogo e o porquê da saúde de um jogador ter de estar sempre em primeiro lugar”, pode ler-se na comunicação. “É por isso que [Marinakis] estava tão emocionalmente investido nos acontecimentos que se viram no City Ground no domingo. A sua reação foi de grande preocupação e responsabilidade por um dos nossos. Em momentos assim, ele mostra a sua liderança, não apenas em palavras, mas também com ação e com a sua presença. Nos 10 minutos finais, quando viu o nosso jogador em claras dificuldades, com dores visíveis, tornou-se cada vez mais difícil para ele ficar do lado de fora do campo. A sua frustração (...) levou-o a entrar no campo.”

Jacob King - PA Images

Se esta tão pública reação foi a melhor forma de mostrar preocupação, ficará por saber. Mas, no comunicado, o clube sublinha que Marinakis “o faria de novo” se tal voltasse a acontecer. O Forest sublinha que “não houve qualquer confrontação” com Nuno Espírito Santo “fosse no relvado” ou mais tarde, e que o dono do clube estava apenas a “partilhar a sua frustração”. E lança-se depois, num claro dardo a Gary Neville e Jamie Carragher, a quem terá julgado a situação de a conhecer na plenitude. “Instamos antigos jogadores e treinadores, e outras figuras ligadas ao futebol, a resistirem a julgamentos precipitados e a notícias falsas online, especialmente quando não têm em mãos todas as informações e factos.”

Após o jogo com o Leicester, numa mensagem deixada no Instagram, Evangelos Marinakis já tinha sublinhado que o clube estava a viver “um dia de celebração” por voltar à Europa 30 anos depois e que se sentia “extremamente orgulhoso e próximo de Nuno e da equipa”, explicando que, ao mesmo tempo, “toda a gente” estava “frustrada” por causa da lesão de Taiwo e com o “julgamento errado que a equipa médica teve” no momento de avaliar a sua continuidade em campo.

O Forest é 7.º na Premier League e, com dois jogos por disputar, ainda pode chegar à Champions. O 5.º lugar do Chelsea, o último a dar acesso à Liga dos Campeões, está apenas a um ponto, mas a equipa de Nuno precisa que tanto os blues como o Aston Villa, 6.º classificado, escorreguem no processo. O futuro do técnico português no City Ground parece, para já, não estar em perigo.