A pé são uns 30 e muitos ou 40 minutos, o suficiente para os 2,7 quilómetros que os meios tecnológicos dizem ser a distância a percorrer. De metro o caminho não é muito prático, implica mudança de linhas, mas também não se demora nenhuma eternidade. De carro o tempo varia muito, consoante os humores do trânsito da Segunda Circular. Tanto podem ser uns sete ou oito minutos como dois ou três quartos de hora.

Seja como for, os estádios de Sporting e Benfica distam pouco um do outro. Um na Rua Professor Fernando da Fonseca, o outro na Avenida Eusébio da Silva Ferreira. Um no Lumiar, outro em São Domingos de Benfica.

Ambos em Lisboa. Ambos as casas de clubes que discutirão os quatro títulos maiores do futebol português em 2025.

As passagens de Sporting e Benfica à final da Taça de Portugal vieram confirmar o que já se vinha desenhando. Leões e águias discutirão a prova vencida pelo FC Porto nas últimas três temporadas, tal como já se defrontaram na final da Taça da Liga. Um deles será, também, o campeão nacional, num sprint que leva verde e brancos e encarnados com os mesmos pontos quando restam quatro jornadas. E, aconteça o que acontecer, a Supertaça, a arrancar a próxima época, também será o dérbi eterno.

Pois bem, isto é inédito na história da centenária rivalidade. Nunca Benfica e Sporting haviam discutido, a dois, a Liga e a Taça numa temporada e, a abrir a seguinte, a Supertaça. Se juntarmos a isto a Taça da Liga de janeiro, o inédito torna-se ainda mais especial, num ano de 2025 de alta tensão na Segunda Circular.

Os precedentes

O futebol português é, em comparação com outros países europeus, anormalmente dominado por três clubes. Em 90 edições da I Liga, 88 foram vencidas por Benfica, FC Porto ou Sporting, que também concentram 63 das 84 Taças.

No entanto, não tem sido comum que Sporting e Benfica discutam a I Liga a dois até ao fim e, na mesma temporada, protagonizem a final da Taça.

Trubin defendeu o penálti de Trincão e deu a Taça da Liga ao Benfica. Foi a primeira de quatro decisões em 2025 entre leões e águias
Trubin defendeu o penálti de Trincão e deu a Taça da Liga ao Benfica. Foi a primeira de quatro decisões em 2025 entre leões e águias Eurasia Sport Images

O confronto do próximo dia 25 de maio será a primeira decisão da Taça entre leões e águias desde 1995/96. Essa final, marcada pela morte de Rui Mendes após ser atingido por um very light, constituiu um dos momentos mais tristes da história do Jamor. O triunfador da tarde de luto foi o Benfica de Mário Wilson, num 3-1 — João Vieira Pinto (bis) e Mauro Airez para as águias, Carlos Xavier para os leões diante do Sporting de Otávio Machado.

No entanto, essa final não coincidiu com uma disputa entre rivais da capital pelo título da regularidade. Naquela época, o FC Porto ganhou com algum conforto o segundo dos títulos do penta, impondo-se com mais 11 pontos do que o Benfica e 17 face ao Sporting. A 10 rondas do fim, os encarnados já estavam a 14 pontos da frente e os leões a 16. A seis encontros da conclusão, o Sporting caíra matematicamente fora da disputa, o que sucederia com o Benfica a quatro partidas da meta.

Passemos, então, ao anterior Benfica-Sporting no Jamor.

O penúltimo dérbi eterno na final da Taça foi em 1986/87. A final voltou a ter as águias do lado sorridente, com um triunfo por 2-1 da equipa de John Mortimore diante do conjunto de Keith Burkinshaw, num confronto britânico. Diamantino bisou, Marlon Brandão reduziu.

Só que, tal como em 1995/96, não houve uma disputa direta na I Liga. O Benfica foi campeão, mas o Sporting terminou em quarto. Numa altura em que a vitória ainda valia só dois pontos, o clube de Alvalade acabou a 10 dos homens da Luz, mais perto do quinto lugar, do Desportivo de Chaves, do que do segundo, do FC Porto. O Sporting entrou nas cinco derradeiras jornadas já sem hipóteses de ser campeão.

E chegamos à última temporada com paralelo com esta. Foi a época 1973/74, que começou em ditadura e terminou em liberdade.

Naquela campanha, quando o Sporting teve Héctor Yazalde a brilhar — 46 golos em 30 rondas —, os rivais de Lisboa chegaram à derradeira dezena de encontros com os leões um ponto à frente. Na jornada 23, o FC Porto, com Béla Guttmann no comando, derrotou um Benfica que ainda tinha Eusébio, mas onde já se destacavam protagonistas de uma nova geração, como Nené ou Humberto Coelho.

A vantagem dos leões engordou, tal como cresceria duas rondas depois, devido ao empate do Benfica diante do Beira-Mar. A cinco jornadas do fim, o Sporting tinha quatro pontos de margem, valendo a pena voltar a recordar que a vitória só valia dois pontos.

O conforto pontual do coletivo de Mário Lino diminuiu a 31 de março de 1974. Com abril ao virar da esquina, o Benfica foi ganhar a Alvalade por 5-3. A emoção aumentou na partida seguinte, novamente com o Beira-Mar, o último classificado, a intrometer-se nas contas do título, igualando a um com o Sporting. Aquela jornada foi a última que decorreu durante o Estado Novo e deixou os dois lados da Segunda Circular separados por um ponto.

A margem mínima foi levada para as três últimas rondas, já disputadas em maio e, portanto, em liberdade. O Sporting não tremeu, vencendo a Académica por 3-1, o Olhanense por 5-0 e o Barreirense por 3-0, sempre com Yazalde, autor de quatro golos naquele trio final de compromissos, em destaque.

A I Liga terminou a 19 de maio, data vizinha daquela em que terminará a presente edição. A final da Taça foi mais tarde, a 9 de junho. No Jamor, Nené deu vantagem ao Benfica, Chico Faria empatou aos 89' e Marinho, aos 107', deu a dobradinha ao Sporting.

Terminava assim a última campanha em que leões e águias discutiram, até ao final, campeonato e Taça. Até agora.

Carlos Rodrigues

Ambos os rivais tentarão fazer história nas próximas semanas. O Sporting não vence a Taça desde 2019 e a dobradinha foge-lhe desde 2001/02; o Benfica é estranho à Taça desde 2016/17 e também não faz a dobradinha desde essa campanha.

A presente situação ganha contornos inéditos pela já referida inclusão da Supertaça nestas contas. A prova, que em 2025/26 terá os dois vizinhos na disputa, só arrancou em 1979, portanto não se realizou na tal 1973/4.

Outro aliciante para estes meses a ferver na Segunda Circular é a circunstância de, no campeonato, a disputa ser um verdadeiro mano a mano. Não só os homens de Rui Borges e os de Bruno Lage estão igualados no cume da tabela, mas também há um Benfica-Sporting agendado para a penúltima jornada, dérbi que pode ter contornos de mais uma final entre os rivais.

Se assim for, teremos quatro decisões diretas entre águias e leões em poucos meses. O nunca visto numa rivalidade que principiou em 1907. Os 2,7 quilómetros concentram todas as disputas do futebol nacional em 2025.