
Num ano tão convulso para os lados do Dragão, o jovem dragão Rodrigo Mora (de apenas 18 anos) foi provavelmente o único ponto positivo de uma época desastrosa do FC Porto, pelo que surpreende que nos primeiros jogos de pré-época, o menino-prodígio tenha perdido a titularidade.
Durante este ano, a nação portista perdeu igualmente duas traves-mestras da sua história: o antigo presidente Jorge Nuno Pinto da Costa (dirigente desportivo mais titulado de sempre e com mais de 40 anos de presidência) e uma daquelas absolutamente inesperadas e que dilacerou o coração dos adeptos portistas: o mítico capitão Jorge Costa (“O Bicho” como assim era carinhosamente tratado).
O braço-direito de André Villas-Boas (que tem tido um turbulento início de presidência nos dragões) e o seu diretor para o futebol não resistiu a duas paragens cardiorrespiratórias, e faleceu aos 53 anos de idade, algo que certamente irá impactar toda a estrutura portista, nomeadamente um plantel tão jovem e inexperiente.
Mas antes da sua súbita partida, Jorge Costa já deixou bem cimentados os alicerces para uma época (oito reforços até ao momento), que se espera que seja a do regresso à senda dos triunfos por parte da equipa portista, ou que pelo menos, voltemos a ver aquela mística que sempre caracterizou a equipa azul e branca, no qual um dos seus expoentes máximos foi o seu eterno capitão.
Neste artigo, tentarei explicar os pontos no quais pode assentar esta decisão um pouco inexplicável (ou talvez não tanto assim) do novo técnico dos dragões: o italiano Francesco Farioli (que foi apresentado no início de Julho para substituir o argentino Martin Anselmi, que não sobreviveu a uma prestação paupérrima no Mundial de Clubes).
Não terá sido apenas pelo fato do FC Porto não ter conseguido ganhar num grupo aparentemente acessível frente aos brasileiros do Palmeiras, os americanos do Inter Miami e os egípcios do Al Ahly (no qual a equipa portuguesa poderia ter sofrido mais de oito golos, tal foi a sua fragilidade defensiva). As sensações da equipa dentro de campo eram bastante más, e o FC Porto realizou exibições confrangedoras, onde não se percebia uma clara ideia de jogo, sendo que também era evidente que os jogadores se encontravam confusos e perdidos em campo.
É verdade que o plantel do FC Porto da época transacta é provavelmente um dos piores da história do clube, mas precisamente por causa disso, exigia-se um técnico que soubesse entender o momento do clube, e que fosse mais pragmático do que alguém fiel à sua ideia, independentemente de ter ou não jogadores que pudessem seguir a sua filosofia de jogo. Um grande treinador é aquele que se adapta aos jogadores e que tenta esconder ao máximo as lacunas da sua equipa, o que foi totalmente o oposto daquilo que Anselmi fez.
Contudo, se há mérito que temos obrigatoriamente de lhe atribuir é o de ter sido o técnico que deu continuidade (uma vez que havia sido lançado por Vítor Bruno mas não com este protagonismo) a um jovem talento que sobressaiu no meio de tanta mediocridade.
Rodrigo Mora (com apenas 17 anos na altura), literalmente chamou a si mesmo a responsabilidade de tentar que o FC Porto tivesse a melhor classificação possível no campeonato, onde acabou num honroso terceiro lugar, garantido a qualificação direta para a fase de grupos da Liga Europa, e evitando dessa forma começar a competir em meados de Julho, o que poderia representar mais um descalabro desportivo nas hostes portistas.
A sua primeira metade deste ano de Mor foi absolutamente fulgurante e meteórica foi a sua ascensão. Os seus 10 (!) golos e quatro assistências na Liga Portuguesa foram registos históricos, que inclusive justificaram a sua primeira convocatória para a seleção nacional, tendo integrado o plantel que se sagrou vencedor da Liga das Nações (apesar de não ter sido utilizado).
A sua personalidade e infindável talento ficou logo demonstrada, quando na sua titularidade em fins de Dezembro do ano passado (ainda sob o comando de Vítor Bruno), marcou um golo e deu uma assistência num jogo a contar para a Liga Portugal contra o Moreirense. E também ficou bem patente no tal Mundial de Clubes mencionado anteriormente, que culminou com a queda de Anselmi do comando técnico dos dragões, mas onde Rodrigo Mora voltou a demonstrar toda a sua qualidade e potencial.
Numa equipa sem rumo e descoordenada, Rodrigo Mora foi o único raio de luz. As suas movimentações e aparência física, fazem-me lembrar muito o lendário João Vieira Pinto, ex-internacional português, cujo faro pelo golo e grande qualidade técnica sempre o diferenciaram dos demais.
Rodrigo Mora alia também a tudo isso uma excelente visão de jogo e um já considerável entendimento do mesmo, apesar da sua tenra idade. Se continuar com esta evolução, o FC Porto estará na presença de um craque mundial que irá certamente render um encaixe milionário no cofre dos dragões (bem necessitados, devido a uma gestão financeira caótica sob a direção de Pinto da Costa nos últimos anos da sua presidência).
As exibições de Rodrigo Mora despertaram obviamente o interesse dos tubarões europeus, já correndo rumores (embora sem que tenha havido uma proposta concreta ou uma declaração pública) de que os franceses do PSG (atuais campeões europeus), possam estar interessados na sua contratação, sendo que muitos adeptos portistas imploram que o jovem prodígio possa ficar pelo menos mais seis meses ao serviço dos dragões.
O seu nome consta do restrito lote de dez nomeados para o Troféu Kopa (que premiará o melhor jovem do ano na gala da Bola de Ouro organizada pela revista France Football), pelo que estará ainda mais no foco dos clubes europeus com maior capacidade económica até ao fim deste mercado de transferências, e não será de estranhar que a qualquer momento possam mesmo avançar para o investimento num talento tão único e promissor como o de Rodrigo Mora.
Será essa a razão pela qual Farioli ainda não encontrou um espaço para Rodrigo Mora no seu onze? Sinceramente, considero que é um pensamento bastante retorcido e rebuscado. O técnico italiano joga preferencialmente em 4-3-3, sendo que a melhor posição para o jovem dragão, é atrás do avançado, onde pode explanar todas as qualidades já mencionadas anteriormente.
Preso a uma ala, o seu jogo perde eficácia e preponderância, pois Mora necessita de espaço para criar, para tabelar com os seus colegas, ou para fazer aquelas suas já famosas jogadas “maradonianas” onde serpenteia os adversários, e que encantam os adeptos portistas e que devem ter sido os únicos momentos que ultimamente lhes fizeram sorrir.
No meio-campo, Farioli tem optado por um meio-campo robusto mas igualmente versátil, aliando o excelente posicionamento do argentino Alan Varela, à explosão e enorme disponibilidade para pisar terrenos avançados da nova coqueluche dos dragões (o dinamarquês Victor Frodholt, que senhor jogador!), e a qualidade de passe e capacidade de gerir a bola e controlar os ritmos do jogo do espanhol Gabri Veiga.
É Rodrigo Mora melhor do que Gabri Veiga? Na minha modesta opinião, não considero que seja por uma questão de capacidade individual que Rodrigo Mora não tem sido titular nestes primeiros jogos de Farioli. A contratação inesperada (que inclusive escapou a Fabrizio Romano, famoso agente de transferências) do neerlandês Luuk de Jong, faz-nos crer que não haverá mudança de modelo tático.
Como disse anteriormente, independentemente de Rodrigo Mora poder ter mais talento individual do que muitos dos seus colegas (onde também incluo o novo reforço espanhol Borja Saínz e o brasileiro Pepê), quero acreditar que o que Francesco Farioli procura é um onze que dê estabilidade e equilíbrio à equipa em todos os momentos do jogo.
Como não existe a figura de um 10 neste esquema de Farioli, e devido à sua estatura e frágil compleição física, Rodrigo Mora não pode ser utilizado numa zona do terreno onde a componente física é fundamental, o que quer dizer que não é uma opção idónea para o meio-campo.
Estou totalmente convencido de que Rodrigo Mora vai acabar por se impor e que a titularidade lhe voltará a ser concedida. Vou até mais longe, e apesar de considerar que no futebol deve sempre prevalecer o coletivo em detrimento de qualquer jogador, há casos nos quais o talento é tão diferenciador e descomunal, que “obriga” o treinador a mudar as suas ideias e a criar um esquema no qual o seu melhor jogador possa demonstrar todo o seu potencial.
Quem sabe, Farioli não começa a jogar num 4-2-3-1, com Mora a jogar atrás do experiente Luuk de Jong, que independentemente de uma hipotéica saída de Samu Omorodion, acredito que acabará por ser o dono do lugar.
A amostra é curta (apenas seis meses ao serviço da equipa profissional do FC Porto), e não se deve colocar a pressão que um dia se colocou sobre João Félix, quando este se evidenciou sensivelmente com a mesma idade de Mora. Nestas idades, os jogadores necessitam de jogar, de falhar (é fundamental para o seu crescimento), e de um treinador que realmente lhes dê confiança, mas que também os saiba disciplinar e fazer “descer à terra” se assim for necessário.
Não sou um profundo conhecedor da capacidade de Farioli em trabalhar com jovens talentos, mas o treinador transalpino vem de treinar uma das melhores escolas de formação do mundo: a dos neerlandeses do Ajax, pelo que me parece ser o técnico indicado para ajudar Mora a focar-se apenas no futebol e para que este trabalhe ainda mais para mudar as ideias do seu treinador, voltando a ter o protagonismo, que por momentos, agora poderá estar mais centrado na “máquina” Frodholt.
Não é prejudicial que todo o foco tenha deixado de estar concentrado em Rodrigo Mora. Considero até que será benéfico para o seu natural processo de crescimento. Sim, na época passada era ele e mais 10 (como se costuma dizer na gíria futebolística), mas o treinador já não é o mesmo, o plantel reforçou-se bastante e o esquema tático já não é o ideal para as suas qualidades.
Apesar de um evidente rosto mais fechado no banco de suplentes do jogo de apresentação contra o Atlético Madrid e acreditando que Mora terá o seu ego e não estará naturalmente satisfeito por ter perdido o lugar no onze inicial, estou em crer de que o menino-prodígio estará bem assessorado e com a mentalidade certa para poder inverter este cenário.
De momento e antes da bola rolar oficialmente nesta época desportiva, o menino-prodígio muito provavelmente partirá do banco de suplentes, como o primeiro jogador a ser lançado para decidir os jogos quando a equipa assim o necessitar.
A verdade é que na última meia-hora desse jogo contra o clube madrileno, Rodrigo Mora fez um excelente uso desse tempo para expor todas as qualidades, causando um impacto imediato num jogo globalmente muito bem conseguido pela equipa portista, onde já é evidente o dedo de Farioli, quer na pressão altíssima ao portador da bola, uma equipa mais compacta defensivamente, e um futebol ofensivo mais objetivo e vertical do que o de de Martin Anselmi.
Caberá a Rodrigo Mora ser paciente e entender que o contexto atual é diferente, e que este é apenas um momento que o fará amadurecer, acrescentando a toda a sua qualidade futebolística, uma força mental absolutamente fulcral para se ter sucesso no futebol de elite.
Seguramente que o menino-prodígio acabará por deixar de estar no banco e ganhará este jogo de paciência.